A estratégia de comunicação de Volodymyr Zelensky durante a sua visita aos Estados Unidos demonstra um profundo entendimento da complexidade do cenário político norte-americano. A sua retórica continua a focar-se nos valores democráticos partilhados, na importância da liderança dos Estados Unidos da América (EUA) e num caminho claro para a vitória. Mas há novidades.
Zelensky desenvolveu, ao longo da guerra, um discurso que combina fervor nacionalista, apelo emocional e pragmatismo diplomático e que atingiu o seu auge no discurso de fim de ano em 2023. Uma das melhores peças de comunicação política que vi nos últimos anos.
O líder ucraniano, sempre evitou o tom violento e agressivo em contraste com Vladimir Putin. As forças armadas ucranianas dependem não apenas do seu país, mas também dos valores democráticos universais. Uma mensagem que ressoa profundamente no discurso político dos EUA. É uma abordagem emocional, que invoca valores partilhados e pensada para recordar aos americanos o papel de liderança global que querem manter.
Ela foi estratificada e pensada para legisladores, decisores e o povo americano, colocando-os perante um desafio: O fim do apoio americano equivale a uma traição aos valores democráticos que são parte da identidade norte-americana.
Por outro lado, faz uma jogada arriscada do ponto de vista comunicacional, porque comunicar não se resume a discursos e entrevistas. As ações são “comunicação” também, pelo que a presença do líder ucraniano na Pensilvânia, rodeado apenas de democratas, mais as críticas feitas a Donald Trump e JD Vance, inauguram uma nova fase da comunicação de Zelensky. Uma, em que um chefe de estado demonstra, por ações, que uma vitória democrata servirá os interesses do seu país e os valores democráticos. A apresentação do "Plano de Vitória", é crucial neste contexto, a começar pela própria designação. Porque uma vitória militar – ainda que indireta – é um ponto muito favorável para a candidatura democrata à Casa Branca.
E como não há acasos nem coincidências na boa comunicação, ao suportar este “Plano de Vitória”, Kamala Harris quer mostrar que tem uma estratégia clara e aliviar os receios de que os EUA estejam a investir numa guerra sem fim. O valor eleitoral desta mensagem é muito importante nestas eleições.
Já a comunicação de Trump sobre a Ucrânia tem sido marcada por uma ambivalência pragmática. Ainda antes da reunião com Zelensky ter lugar - na Trump Tower, imagine-se – afirmou em entrevista que seria ele a liderar futuras negociações diretamente com a Rússia, relegando todos os outros envolvidos (chefes de Estado, NATO, UE) para um plano secundário.
O posicionamento de Trump visa atrair eleitores que se sentem desconfortáveis com o envolvimento prolongado dos EUA na guerra, enquanto a reunião na Trump Tower serviu como um ponto simbólico na sua tentativa de demonstrar que ele poderia lidar com a guerra de forma mais eficiente e "independentemente" das atuais estratégias ocidentais. Dúvidas tivéssemos, o desconforto de Zelensky na conferência de imprensa na Trump Tower confirmou qual o verdadeiro foco de Donald Trump.
Foi uma jogada arriscada a do líder ucraniano. Ao abandonar apoio bipartidário que sempre cultivou, parece abraçar a polarização política que se vive nos EUA e coloca-se à mercê de acontecimentos sobre os quais não tem qualquer controle. Veremos a 5 de novembro se ganha essa aposta.