Como a guerra da Rússia pode derrubar a economia europeia

CNN , Charles Riley
9 mar 2022, 22:00
Uma proibição completa das importações de energia da Rússia empurraria a zona euro para a sua terceira recessão desde o início da pandemia da covid-19. Foto: Ying Tang/NurPhoto/Getty Images

A estagflação, um período de inflação elevada e de fraco crescimento económico, incute medo nos corações dos economistas – e dos decisores políticos – de todo o mundo. A Europa pode estar a caminho de algo ainda pior.

As sanções do Ocidente impostas após a invasão da Ucrânia pela Rússia fizeram com que, na Europa, os preços globais da energia disparassem e a confiança dos consumidores desabasse. A Rússia está a ser excluída dos mercados financeiros ocidentais.

Os economistas esperam que a economia europeia venha a sofrer com isso. Os analistas do Barclays reduziram as suas previsões de crescimento da zona euro para este ano em 1,7 pontos percentuais para 2,4%. Espera-se que o consumo privado, o investimento e as exportações cresçam a um ritmo mais lento em todo o continente.

Ao mesmo tempo, o preço da energia e de outras matérias-primas, como o trigo e os metais, está a aumentar rapidamente. O Barclays aumentou as suas previsões de inflação na zona euro para 2022 em 1,9 pontos percentuais para 5,6%.

Por outras palavras, a guerra está a instigar a estagflação, termo que descreve um período de inflação elevada e de fraco crescimento económico. O melhor exemplo recente é o da década de 1970, quando um choque no abastecimento energético desestabilizou as economias desenvolvidas.

A estagflação é um pesadelo para os decisores políticos, que têm poucas opções viáveis para controlar a subida de preços sem prejudicar a economia. Nos Estados Unidos, na década de 1970, o presidente da Reserva Federal, Paul Volcker, viu-se forçado a elevar as taxas de juros para níveis nunca vistos de modo a controlar a inflação.

De volta ao presente: a Europa pode agora enfrentar algo pior do que a estagflação: uma potencial recessão com uma inflação descontrolada.
O Barclays afirmou que, mesmo depois da revisão em baixa das suas previsões, os resultados da economia poderão vir a ser piores do que o esperado. A situação é bastante incerta, advertiu o banco.

Qual é o pior cenário possível para a economia europeia?

Uma proibição completa das importações de energia da Rússia levaria o preço do petróleo aos 160 dólares por barril de Brent e empurraria a zona euro para a sua terceira recessão desde o início da pandemia da Covid-19, de acordo com a Capital Economics.

“Um colapso na comercialização de energia russa levaria a um racionamento de energia em certas partes da Europa, o que, por sua vez, criaria uma rutura nas cadeias de distribuição, podendo ainda provocar uma pressão inflacionária adicional a nível mundial”, disse a economista Caroline Bain.

“O aumento dos preços da energia também aumentaria os preços dos produtos agrícolas e dos metais industriais”, acrescentou.

A Rússia, que precisa das receitas da energia para financiar a despesa pública e manter a sua economia à tona, alertou o Ocidente sobre a proibição das importações de petróleo.

“É absolutamente claro que uma rejeição do petróleo russo teria consequências catastróficas para o mercado global”, disse o vice-primeiro-ministro russo Alexander Novak na televisão estatal, de acordo com a Reuters.

“O aumento dos preços seria imprevisível. Chegaria aos 300 dólares por barril, se não mais”, acrescentou Novak, que já foi ministro da energia.

As autoridades norte-americanas já estão a discutir a proibição de importações. Os líderes da UE deixaram bem claro esta semana que a união ainda não consegue juntar-se aos Estados Unidos, devido ao impacto que isso teria nas famílias e nas empresas.

Mas nada disto é uma boa notícia para os bancos centrais — especialmente para o BCE, que se reúne na quinta-feira.

“Acreditamos que o conflito irá manter o BCE em suspenso e poderá até exigir uma postura mais adaptável, uma vez que o BCE fará o que for preciso (e o que custar) para evitar que esta guerra se transforme numa crise económica e financeira”, escreveram os analistas do Barclays.

Deste modo, é provável que não existam subidas nas taxas de juro até março de 2023 e que não se faça qualquer compromisso para acabar com a flexibilização quantitativa. O Barclays espera igualmente que o banco central mantenha todas as opções em cima da mesa com vista a manter a estabilidade.

Combustíveis batem recorde nos EUA: 4,17 dólares por galão

Os motoristas dos EUA nunca pagaram tanto pela gasolina. O preço da gasolina normal é agora de 4,17 dólares por galão [3,79 litros], de acordo com a AAA.

Este valor suplanta o anterior recorde de 4,11 dólares por galão que perdurava desde julho de 2008, segundo o meu colega da CNN Business, Chris Isidore.
À medida que a Rússia prossegue a sua ofensiva militar na Ucrânia, os preços dos combustíveis estão a subir mais rapidamente do que aquilo que sucedeu quando o furacão Katrina atingiu as plataformas petrolíferas e refinarias ao longo da Costa do Golfo dos EUA em 2005.

A média de 4,17 dólares significa que o preço subiu 55 cêntimos por galão apenas na última semana, e 63 cêntimos, ou 18%, desde 24 de fevereiro, dia em que as forças russas invadiram a Ucrânia.

Os aumentos no preço dos combustíveis não vão parar tão cedo, disse Tom Kloza, diretor global de análise energética da OPIS.

“Acho que vamos chegar aos 4,50 dólares por galão antes que comece a descer”, disse Kloza. “O risco é o nível a que isto pode chegar, o tempo que isto pode durar. Até mesmo 5 dólares por galão em todo o país é possível. Nunca imaginei que fosse antes de a guerra começar.”

A grande barreira da Rússia?

A internet da Rússia há muito que se estendeu para Oriente e Ocidente.

Os cidadãos russos, ao contrário dos seus homólogos chineses, têm sido capazes de aceder a plataformas tecnológicas dos EUA, como o Facebook, o Twitter e o Google, embora tenham sido sujeitos a censura e restrições — a marca distintiva do modelo de internet da China.

Mas a invasão russa da Ucrânia, que tem isolado cada vez mais o país nos últimos dias, também pode ser a sentença de morte da sua presença na internet mundial, segundo o meu colega da CNN Business, Rishi Iyengar.

O clima: o governo russo disse na sexta-feira que decidiu bloquear o Facebook, invocando as movimentações da rede social nos últimos dias de impor restrições aos meios de comunicação controlados pela Rússia.

Embora o Facebook não seja, de forma alguma, a maior plataforma do país, o seu bloqueio pode ser uma jogada simbólica que sugere que o governo do presidente Vladimir Putin está preparado para ir atrás das grandes empresas globais se estas não alinharem com as diretrizes do Kremlin. (O Instagram e o WhatsApp, que são mais populares na Rússia e que também são propriedade da Meta, a empresa-mãe do Facebook, ainda não foram bloqueados).

O principal regulador de telecomunicações do país, a Rozkomnadzor, está a exercer pressão sobre a Google relativamente àquilo a que chama de informações “falsas”, e aparentemente terá imposto também restrições ao Twitter. Outras plataformas estão a optar por interromper as suas operações por própria iniciativa.

Serem banidos na Rússia poderá não representar uma ameaça existencial às plataformas tecnológicas ocidentais, algumas das quais com utilizadores na ordem dos milhares de milhões. Mas estes movimentos têm fortes implicações na capacidade dos russos terem acesso a informações e a expressarem-se livremente. A um nível mais fundamental, poderia acelerar ainda mais a fragmentação da internet mundial tal como a conhecemos.

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