Porque é que a Turquia mudou de nome: populismo, sondagens e uma ave

CNN , Mohammed Abdelbary
5 jun 2022, 17:28
Turquia: Homenagens às vítimas e apoio a Erdogan

Na Turquia, estavam fartos de ser associados a uma ave, que é famosa por ser um símbolo do feriado de Ação de Graças norte-americano.

Na quinta-feira, as Nações Unidas reconheceram o rebranding do país para Türkiye, numa iniciativa que, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros, Mevlüt Çavuşoğlu, iria "aumentar o valor da marca do nosso país".

"A principal razão pela qual a Turquia está a mudar de nome é para eliminar a associação a essa ave", disse Sinan Ülgen, presidente do think-tank EDAM, sediado em Istambul. "Mas este termo é também usado em linguagem coloquial para denotar fracasso."

Para o Presidente Recep Tayyip Erdogan, que se candidata à reeleição no próximo ano, o novo nome expressa da melhor forma a "cultura, civilização e valores da nação turca".

As organizações internacionais são agora obrigadas a usar o novo nome, mas isso não acontecerá de um dia para o outro para o público em geral, disse Ülgen à CNN. "Provavelmente levará muitos anos até que o público internacional mais amplo passe de Turquia para Türkiye."

Não é a primeira vez que este país tenta mudar de nome. Foi feita uma tentativa semelhante em meados da década de 1980, sob o comando do primeiro-ministro Turgut Özal, que nunca ganhou tanta força.

Poderá haver motivações políticas por detrás da mudança, pois os turcos regressam às urnas em junho do próximo ano, em plena crise económica.

Esta é "mais uma estratégia implementada pelo governo turco para chegar aos eleitores nacionalistas, num ano crucial para a política turca", disse Francesco Siccardi, gestor sénior do programa no think-tank Carnegie Europe.

O timing da mudança de nome é "crucial" para as eleições do próximo ano, disse ele. "A decisão sobre a mudança de nome foi anunciada em dezembro passado, quando o Presidente Erdogan estava a ficar para trás em todas as sondagens, e o país atravessava uma das piores crises económicas dos últimos 20 anos."

Erdogan tem caído significativamente nas sondagens ao longo dos anos. As sondagens do final do ano passado mostram o apoio ao Partido AK no poder, com cerca de 31 a 33%, segundo a Reuters, abaixo dos 42,6% nas eleições legislativas de 2018.

Ülgen disse, no entanto, que a mudança de nome foi mais uma estratégia de rebranding para projetar a posição internacional do país, e não um truque pré-eleitoral.

O défice do comércio externo da Turquia subiu 98,5% em relação ao ano anterior, para 6,11 mil milhões de dólares, em abril, noticiou a Reuters, citando o Instituto Estatístico turco. A inflação anual subiu para 73,5% no mês passado, o valor máximo em 22 anos.

Segundo os analistas, em momentos de crise, o Presidente costuma recorrer a jogadas populistas para desviar a atenção dos problemas internos. A agitação económica, tendo já trazido pessoas para as ruas, tem sido uma dor de cabeça para o Governo.

"O novo nome irá distrair, tanto a população a nível interno dos problemas mais concretos e prementes, como oferece ao Presidente Erdogan outro argumento para a sua defesa de uma Turquia mais forte e tradicional", disse Siccardi.

Noutra jogada populista, em 2020, Erdogan emitiu um decreto para converter o histórico Museu Bizantino de Santa Sofia, em Istambul, numa mesquita.

"Na ausência de políticas concretas para fazer face aos problemas económicos e políticos do país, Erdogan procura a salvação na política de identidade populista", escreveu a analista política Seren Korkmaz. "Ele impulsiona o nacionalismo e o islamismo turcos e ataca figuras da oposição."

O novo nome também tem um valor simbólico, tendo sido adotado em 1923, quando a nova nação emergiu das cinzas da Segunda Guerra Mundial. A sua adoção global "cimentaria o lugar de Erdogan na história turca, ao lado do fundador da República, Mustafa Kemal Atatürk", disse Siccardi.

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