Noite de terça para quarta-feira marcada por uma tempestade que trouxe inclusivamente raios - e há um caso em que se associou um raio à destruição de um restaurante. “Nas formações que dou, dou vários exemplos de raios, de descargas verticais, que atingem a superfície e fazem buracos em torno de cabos elétricos ou de condutas de água, como se fosse uma mina a rebentar o solo, deixando uma cratera”, diz um especialista ouvido pela CNN Portugal
Foi levantada a hipótese de ter sido um raio a estar na origem de um incêndio num restaurante na praia da Cabana do Pescador, na Costa da Caparica - o espaço foi totalmente consumido pelas chamas. O caso está sob investigação mas tem fundamento técnico abstrato: ainda que seja “raro” que um raio provoque algo tão destrutivo, o climatologista Mário Marques explica que é algo que “pode acontecer” nas mais diversas situações e locais, sobretudo em espaços abertos, como campos de golfe e de futebol, mas também em casas e nas estradas.
No caso daquele restaurante em particular, “pode ter sido gerado um curto-circuito, uma sobrecarga de energia, e o quadro elétrico não se ter desligado de forma automática”, teoriza o especialista. “Ou pode ser sido atingido diretamente com uma descarga vertical que possa ter incidido nalguma antena ou num cabo elétrico exterior e também aí induz-se uma sobrecarga e, eventualmente, pode ter ocorrido uma ignição”, explica.
Nestas situações, acrescenta, “pode dar-se origem a fogos que depois se propagam facilmente, uma vez que a cablagem é altamente inflamável”. “Normalmente é mais comum em arcas e frigoríficos ou máquinas de lavar do que propriamente noutros eletrodomésticos, uma vez que têm componentes altamente voláteis em termos de combustão”, diz Mário Marques. O restaurante em causa ficou “completamente consumido pelas chamadas”, como descreveu a repórter da CNN Portugal no local.
O que aconteceu naquele restaurante pode acontecer noutras situações, diz o climatologista. “É raro, mas ocorre”, sobretudo em espaços abertos, como em estradas. “Nas formações que dou, dou vários exemplos de raios, de descargas verticais, que atingem a superfície e fazem buracos em torno de cabos elétricos ou de condutas de água, como se fosse uma mina a rebentar o solo, deixando uma cratera”, exemplifica.
Mesmo nas estradas, um carro em andamento também pode ser atingido por um raio, “mas aí não há perigo”, diz o especialista. “Quando um raio atinge um carro, ele está protegido, não só pela parte da estrutura, mas porque tem os pneus de borracha. E, portanto, pode haver uma condução elétrica direta [do raio] para o chão, mas não para o interior do veículo”. Nos casos de bicicletas elétricas, por exemplo, o climatologista diz que, antes de atingir a bicicleta, “primeiro atinge a pessoa que a conduz”.
Quer isto dizer que os raios também podem atingir pessoas diretamente, diz o especialista, lembrando um caso recente em que um jogador de futebol no Peru morreu em campo depois de ter sido atingido por um raio.
“A maior parte das descargas com vítimas mortais acontece em corpos de água em espaço aberto”, aponta o climatologista, referindo-se a campos de futebol e golfe, por exemplo, desportos onde, diz, “morrem mais pessoas” atingidas por raios. Sobre os campos de golfe em concreto, explica que “os tacos são feitos em ligas metálicas e que são altamente condutivas e, por vezes, quando os atletas fazem o ‘swing’, que atinge o ponto de contacto mais alto, cerca de um metro e meio mais alto”, atraindo o raio. No campo de futebol, deve-se à humidade e aos edifícios altos à volta.
Por exemplo: atenção ao ato de beber água, atenção aos chapéus de chuva (ou guarda-chuvas), atenção ao telemóvel
Voltando ao que aconteceu naquele restaurante da Costa da Caparica, que não provocou vítimas mortais, o climatologista diz que “o facto de estar na praia tem mais suscetibilidade [de ser atingido por um raio], visto que [o raio] que deve ter atingido o topo da cobertura ou eventualmente algum cabo elétrico de energia que venha de um poste e deve ter percorrido toda essa estrutura elétrica e depois deve ter originado, a ignição e a combustão”.
Daí os conselhos para que, em dias de trovoada, não se desloque à praia nem pratique desportos náuticos, como surf. “As pessoas não devem nadar em espaços abertos, nem junto de corpos de água, como lagos, rios e mar. Quem for incauto e for surfar com situações de grandes probabilidades de ocorrência de trovoadas, sobretudo raios verticais, nunca o deve fazer.”
Mesmo beber água em espaços abertos pode ser perigoso, uma vez que "a eletricidade gosta de água, portanto é um excelente condutor, Atrai bastante os raios". "Mesmo que o raio se dê a 10km, se tiver um corpo de água, ele desvia-se da superfície terrestre mas têm uma positividade negativa e a base da nuvem é positiva, portanto os opostos atraem-se", explica, ressalvando que "o problema não está em beber água, mas sim estar em open space" [espaço aberto].
Além disso, deve evitar sair de casa. Se estiver na rua, “nunca se deve abrigar debaixo de árvores”, aconselha o climatologista, explicando que as árvores são os pontos onde “existe uma maior probabilidade de cair um raio”, uma vez que “são os corpos mais altos na superfície e, além disso, também são ricos em água e condutores de água e no subsolo e a condução elétrica do raio procura sempre humidade”.
“Se fomos apanhados numa situação de trovada em montanha ou num campo aberto, devemos colocar-nos em posição fetal, agachados, para termos o mínimo contacto possível em termos de altura com o raio e com outros objetos que estejam presentes. Isso pode acontecer numa caminhada ou o que seja e, nesses casos, devemos deslocar-nos o mais rápido possível para uma área abrigada”, recomenda Mário Marques.
Além disso, diz, deve ter atenção ao guarda-chuva (ou chapéu de chuva, como preferir), que, “além de ser de metal, é uma parábola e pode atrair o raio e ser um ponto de contacto”.
Mesmo estando em casa deve ter em atenção alguns cuidados, como “fechar as janelas” e desligar da tomada eletrodomésticos como máquinas de lavar, frigoríficos e outros. Além disso, acrescenta, deve evitar utilizar o telemóvel, uma vez que este equipamento “tem uma frequência e uma emissão de rede e também é um ponto de bateria que emite um sinal rádio, portanto é como se fosse uma antena” que atrai o raio.
“Mas, de qualquer das formas, nenhuma casa está salvo”, avisa Mário Marques, salientando que “é mais suscetível uma residência de construção horizontal, uma moradia, [ser atingida por um raio] do que propriamente um prédio”, que, geralmente, têm pára-raios.
Se viver numa moradia, também pode optar por instalar um pára-raios, diz Mário Marques: “É simplesmente colocar um mastro com um cabo elétrico com um fio terra, mas tem de ser mais alto, cerca de três ou quatro metros, do que o telhado da casa.”