Os seis trabalhos de Luís Rodrigues à frente da TAP, da relação com a tutela ao verão

ECO - Parceiro CNN Portugal , André Veríssimo
14 abr 2023, 09:51
Luís Rodrigues, presidente da TAP (APAVT)

A CEO cessante, Christine Ourmières-Widener, chegou a dizer que gerir a TAP era "o trabalho mais difícil do país". A tarefa cabe, a partir desta sexta-feira, a Luís Rodrigues

Luís Rodrigues assume esta sexta-feira a liderança da TAP, num momento de forte recuperação financeira da companhia aérea, mas debaixo de um enorme ruído político e mediático e a ameaça de instabilidade laboral. É nestas águas que terá de navegar o cumprimento do plano de restruturação e a venda do capital a privados.

O ECO preparou um sobrevoo dos principais desafios do novo CEO e presidente do conselho de administração da TAP:

1. Negociar novos acordos de empresa com os sindicatos

Gerir a relação com os sindicatos vai ser provavelmente a tarefa mais difícil de Luís Rodrigues. No PowerPoint da apresentação de resultados de 2022 está evidenciado a negrito que “é crítico ter novos acordos coletivos de trabalho competitivos”. O que neste caso significa alterar os Acordos de Empresa existentes, reduzindo custos e melhorando a produtividade. Uma necessidade que decorre do plano de reestruturação e que não deverá mudar com a entrada do novo gestor.

Os sindicatos passaram já ao ataque, preventivamente. Num comunicado conjunto divulgado na quinta-feira vieram exigir o fim imediato dos cortes e dos congelamentos salariais, o regresso aos acordos laborais que vigoravam antes da pandemia da Covid-19 e a reintegração dos trabalhadores alvo do despedimento coletivo. Deixam no ar a ameaça de greve (embora não usando a palavra) se a empresa e o Governo não mudarem de posição sobre estes temas.

Na SATA, Luís Rodrigues conseguiu construir boas relações com os sindicatos. Um grupo de 100 trabalhadores chegou mesmo a assinar um manifesto para que continuasse à frente da companhia aérea. Elogiado pela sua capacidade para conseguir consensos, o novo CEO enfrentará na TAP um teste ainda mais exigente.

2. Gerir os voos no verão

Os meses de verão são os mais fortes para a TAP mas este é também o período em que enfrenta maiores dificuldades operacionais. Ao congestionamento do aeroporto Humberto Delgado, somam-se constrangimentos de pessoal na própria companhia. Faltam técnicos de manutenção, o que cria problemas na disponibilidade das aeronaves, além de outro pessoal.

O presidente do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil afirmou esta quinta-feira, em declarações ao ECO, que a TAP terá de cancelar 200 voos só em maio, por falta de pilotos e tripulantes de cabine. Tiago Faria Lopes prevê um verão “caótico, semelhante ao de 2015”. Luís Rodrigues tem poucos meses pela frente para evitar que assim seja.

Para limitar as falhas, a companhia tem recorrido a contratos com outras companhias em regime de ACMI (Aircraft, Crew, Maintenance e Insurance), uma espécie de aluguer de aviões com tudo incluído: aeronave, pessoal, manutenção e seguros. Voltou a fazê-lo este ano, como avançou o ECO.

3. Cumprir o plano de reestruturação e reduzir a dívida

A TAP voltou em 2022 aos lucros, o que não acontecia há cinco anos, fechando o exercício com um resultado positivo de 65,6 milhões. O plano de reestruturação só previa o regresso aos lucros em 2025. Luís Rodrigues assume os comandos com a companhia a voar tranquilamente rumo aos objetivos acordados com Bruxelas. A incerteza na economia continua, no entanto, a ser muito elevada e muito pode acontecer até 2024, quando termina o mandato da administração.

Uma das tarefas mais exigentes será continuar a baixar o endividamento, que no final de 2022 se cifrava em 2.740 milhões, menos 14,7% do que em 2019. Uma soma, ainda assim, demasiado elevada. Se ao nível da rentabilidade operacional a companhia compara bem com os pares europeus, quando se inclui o custo com a dívida a TAP fica bastante para trás, penalizando a sua capacidade de crescimento.

Reduzir a alavancagem (está em 3,5 vezes o EBITDA) continuará a ser uma prioridade com o novo CEO. O que passa por continuar a aumentar as receitas e conter os custos. A descida do preço do combustível está, até agora, a dar uma ajuda.

O plano de reestruturação acordado com Bruxelas prevê que depois das injeções de capital do Estado a companhia emita dívida no mercado. A subida das taxas de juro e o rating de elevado risco da TAP complicam a operação.

4. Levar a privatização da TAP a bom porto

Luís Rodrigues chega à companhia com o processo de reprivatização em marcha. O banco de investimento norte-americano Evercore está a trabalhar com a TAP na preparação do dossiê e no contacto com interessados há cerca de nove meses, embora sem contrato.

O ministro das Finanças afirmou no início de fevereiro que a venda do capital iria “em breve” a Conselho de Ministros, o que ainda não aconteceu. Certo é que a reprivatização é para avançar e já há três interessados de peso: Lufhtansa, Air France – KLM e grupo IAG. Este último, que é dono da British Airways e da Iberia, avançou para a contratação de assessores jurídicos e de comunicação, como noticiou o ECO.

A anterior CEO, Christine Ourmières-Widener, afirmou na comissão parlamentar de inquérito que achava “difícil” que a reprivatização ficasse concluída este ano. Luís Rodrigues já ajudou a pôr em marcha a privatização da SATA, terá de fazer agora o mesmo na TAP.

5. Gerir a relação com o Governo

A experiência da presidente executiva e do chairman cessantes são reveladoras de que uma das principais complexidades do cargo é a gestão da relação com a dupla tutela da TAP: Infraestruturas e Finanças.

O até aqui presidente do conselho de administração afirmou esta semana, na audição na comissão parlamentar de inquérito, que o ministério das Infraestruturas exercia um controlo excessivo, imiscuindo-se no que considerou ser atos “corriqueiros” de gestão, sobretudo se pudessem ter algum impacto mediático. Queixou-se também da resposta demasiado lenta das Finanças a temas de elevada importância para a companhia. Para Manuel Beja, a transportadora padece também de problemas de governança e nos canais de comunicação com a tutela, refletidos na saída da antiga administradora Alexandra Reis.

Acresce ainda o desafio de gerir uma transportadora aérea com a dimensão da TAP tendo de cumprir as exigências de ser uma empresa pública. Os acontecimentos dos últimos meses poderão ter servido para alguma aprendizagem do Governo e da companhia. Uma coisa é garantida: a política não vai deixar a TAP.

6. Recuperar a imagem da TAP

As polémicas dos últimos meses mancharam a imagem de gestores e governantes, mas também da TAP. A comissão parlamentar de inquérito, onde serão ouvidas 58 personalidades, vai manter a companhia no radar mediático e político. O Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos comparou mesmo os trabalhos na Assembleia da República a uma “novela mexicana”, que está a denegrir a empresa e os seus trabalhadores.

Uma dos desafios de Luís Rodrigues será, por isso, melhorar a imagem da empresa junto dos clientes e dos portugueses. O que passará pela capacidade de negociar com os sindicatos, evitar o caos no verão, melhorar os resultados financeiros, completar com sucesso (e um bom encaixe para o Estado) a reprivatização e ser capaz de gerir a relação com a tutela.

 

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