Exigir que os trabalhadores passem mais dias no escritório pode ser um fracasso. Saiba porquê

CNN , Jeanne Sahadi
19 jul 2022, 08:00
Trabalho

Antes da pandemia, muitos dos líderes empresariais acreditavam que ao permitir que os seus empregados trabalhassem a partir de casa, a produtividade seria comprometida. Mas, em inúmeros casos, a pandemia veio a provar o contrário.

“A produtividade não foi afetada apesar de muitas empresas se terem tornado completamente remotas. Muitas prosperaram durante esse processo e, hoje em dia, continuam a contratar a um ritmo nunca antes visto”, disse Ben Wigert, o diretor de investigação e estratégia para a gestão do local de trabalho da Gallup.

De acordo com o Gabinete de Análise Económica, os lucros das empresas, por exemplo, aumentaram constantemente desde o segundo trimestre de 2020 até ao final de 2021. Esta métrica tem em conta tanto o crescimento das receitas, que reflete a produtividade, e a gestão de custos, que reflete a eficiência dos trabalhadores, observou Wigert.

Além disso, nos inquéritos feitos durante a pandemia, os gestores de trabalho, “em média, deram uma pontuação mais alta na análise de desempenho aos seus empregados remotos em comparação com os seus empregados no escritório”, disse Brian Kropp, chefe de investigação na empresa de consultoria Gartner's Human Resources Practice.

Ainda assim, um grande número de empregadores quer que os trabalhadores regressem aos escritórios durante pelo menos três dias por semana. A sua razão de ser? A necessidade de reforçar a cultura no local de trabalho, e de promover uma colaboração e inovação acrescidas.

De acordo com especialistas do local de trabalho, embora esses objetivos sejam fundamentais, a emissão de um mandato para que os trabalhadores trabalhem mais dias no escritório do que gostariam não garante sucesso e pode fazer com que alguns trabalhadores se demitam.

O ponto de situação

Vários inquéritos revelam que tanto os chefes das empresas como os trabalhadores reconhecem a importância do regresso ao local de trabalho. Os seres humanos são seres sociais capazes de entender certas situações e construir mais confiança com os seus colegas presencialmente do que virtualmente. Para além disso, estar presente no escritório é essencial para orientar os trabalhadores mais jovens e os recentemente contratados.

Ao mesmo tempo, verifica-se também uma nova aceitação por parte dos trabalhadores em relação à flexibilidade e à opção de continuar a trabalhar remotamente. A este respeito, a questão que se coloca agora aos trabalhadores e chefes é: “Será que essa ligação interpessoal do trabalho presencial vale o tempo de viagem, os custos e a ansiedade que traz?”, disse Kate Lister, presidente da Global Workplace Analytics.

De acordo com o último Survey of Working Arrangements and Attitudes mensal (SWAA é dirigido pelos investigadores Jose Maria Barrer do Instituto Tecnológico Autónomo do México, Nicholas Bloom da Universidade de Stanford, Steven J. Davis da Universidade de Chicago e Jinhua Zhao da Iniciativa de Mobilidade do MIT),  existe neste momento uma discrepância entre a frequência com que os empregados querem trabalhar remotamente e a frequência com que as suas empresas o permitem.

Mas a maioria dos empregados (56,1%) diz querer trabalhar remotamente durante três ou mais dias: 15,6% preferem três; 9,3% preferem quatro; e 31,2% querem trabalhar à distância durante a semana inteira.

Os especialistas do local de trabalho advertem que os empregadores podem correr o risco de perder trabalhadores caso exijam demasiados dias no escritório.

Por exemplo, a investigação da Gallup descobriu que, quando se pede às pessoas que trabalhem a tempo inteiro no local, mas preferiam trabalhar de forma mista ou totalmente remota, “estes apresentam um empenho e bem-estar significativamente menor, uma intenção significativamente maior de se despedirem e níveis significativamente mais elevados de exaustão”.

Será que precisamos de um estatuto de “mínimo de dias”?

No risco de fazer com que chefes saiam a correr do escritório aos gritos, há um argumento a ser apresentado, segundo o qual a exigência de qualquer número de dias no escritório poderá ser prejudicial para as empresas que procuram reforçar a cultura e a inovação.

A cultura tem a ver com as pessoas e os seus comportamentos, não com o lugar, disse Lister. Por isso, convém que, em primeiro lugar, as empresas sejam claras sobre o que querem que seja a sua cultura no seu escritório e depois sejam mais intencionais sobre a forma como a cultivam.

Quanto à inovação, o trabalho presencial é essencial, mas o tempo individual também o é.

O Gensler Research Institute verificou que, mesmo antes da pandemia, nas empresas mais inovadoras os funcionários só trabalhavam no escritório cerca de três dias por semana.

“Os inovadores que passaram um tempo a trabalhar fora do escritório relataram maior satisfação profissional, mais significativo, e com melhores capacidades de gestão. Para os inovadores, o escritório é apenas um dos muitos locais onde o trabalho acontece”, relataram os investigadores.

Como a divisão deverá ser feita depende das tarefas a serem feitas e de como um indivíduo e uma equipa trabalham melhor nessa tarefa, sugeriu Janet Pogue McLaurin, a directora global de investigação no local de trabalho da Gensler. “Sugerir todos os dias da semana pode ser a forma errada de refletir sobre o assunto”.

Para alguns membros da equipa, pode fazer sentido realizar o trabalho de forma remota, e para outros, pode fazer sentido estar no escritório os cinco dias da semana, ou vir apenas em alguns dias ou até mesmo só metade dos dias.

O psicólogo organizacional britânico Craig Knight, que trabalha com os empregadores para melhorar o bem-estar, o empenho e a produtividade no local de trabalho, concorda que um mandato arbitrário, de cima a baixo, não é o ideal.

“As melhores soluções que encontrámos até agora foi quando nos referimos aos empregados que fazem o trabalho em questão. E essas pessoas não são o chefe”, disse Knight.

Ele aconselha os empregadores a consultar primeiro com os empregados sobre quais devem ser os objetivos gerais das suas equipas e da empresa, inclusive esclarecer a quantidade de dias é que as pessoas preferem estar no escritório e em casa.

“Definir os parâmetros”, disse ele.

Mas depois deixe ao critério das equipas individuais a negociação entre si dos horários mais adequados para alcançarem os objetivos estabelecidos.

“Confiem neles para chegar a uma solução viável. Os resultados são quase sempre excelentes”.

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