73 milhões de dólares. Um acordo histórico entre as famílias das vítimas de Sandy Hook e a fabricante de armas

CNN , Sarah Jorgensen, Jason Hanna e Erica Hill
17 fev 2022, 15:58
Memorial do massacre de Sandy Hook. Robert F. Bukaty/AP

As famílias de cinco crianças e quatro adultos mortos no tiroteio na escola primária de Sandy Hook em 2012 chegaram a um acordo de 73 milhões de dólares com a atual falida fabricante de armas Remington e as suas quatro seguradoras, afirmaram os advogados das partes queixosas na terça-feira.

O acordo ocorreu mais de sete anos depois de as famílias terem dado entrada a um processo de homicídio culposo contra a Remington, fabricante da espingarda Bushmaster AR-15 usada no massacre que matou 20 crianças e seis adultos em Newtown, Connecticut.

As famílias também "obtiveram e podem tornar públicas milhares de páginas de documentos internos da empresa que comprovam as infrações da Remington e contêm lições importantes para ajudar a evitar futuros tiroteios em massa", explicaram os advogados das partes queixosas num comunicado à imprensa.

"Determinámos o que era claramente verdade... a imunidade que protege a indústria das armas não é à prova de balas", afirmou o advogado das partes queixosas, Josh Koskoff, numa conferência de imprensa em Trumbull, Connecticut. “Esperamos que percebam que têm muito em jogo, em vez de, literalmente, culpar todos os outros."

A CNN entrou em contacto com os advogados da Remington, mas não obteve resposta.

As famílias processaram a Remington em 2014, alegando que deveria ser parcialmente responsabilizada pelo tiroteio, devido à sua estratégia de marketing. Uma lei federal de 2005 protege muitas fabricantes de armas de processos por homicídio culposo iniciados por membros da família - mas o argumento do marketing foi uma nova abordagem.

Os advogados das partes queixosas alegaram que a empresa comercializava espingardas exaltando as suas qualidades militaristas e reforçando a imagem de uma arma de combate - violando uma lei de Connecticut que impede práticas de marketing enganosas.

O Supremo Tribunal dos EUA, em 2019, decidiu não aceitar um recurso da Remington, permitindo, com efeito, o avanço do processo.

O acordo também deve servir como aviso para as seguradoras que cobrem fabricantes de armas, afirmou Koskoff.

"Companhias de seguros, está na altura de começarem a tratar a indústria de armas como me tratam sempre que recebo uma multa de excesso de velocidade. ... Agravam o prémio", afirmou. "Já ouviram falar de uma seguradora que apoia um segurado que não se importa com o risco que está a criar? ... Onde está a fiscalização? Isto pode ser feito.”

O público deve "ficar atento" para obter mais informações sobre os milhares de documentos internos da Remington obtidos pelas partes queixosas, afirmou Koskoff.

É necessário mais trabalho para tornar os documentos digeríveis para o público, explicou.

Julia Ofman, porta-voz que trabalha com o escritório de advocacia Koskoff, disse à CNN que o acordo, tecnicamente, ainda não foi aprovado, mas ela afirmou: "não há expectativas de que a aprovação não aconteça" e acrescentou: "isto acabou".

"Vitória histórica e marcante"

Familiares das vítimas falaram na conferência de imprensa para lembrar os seus entes queridos e comemorar o acordo.

"Esta vitória histórica e marcante envia uma mensagem forte e convincente aos fabricantes e aos setores de seguros e bancários que os apoiam: Este é um mercado de alto risco, não é lucrativo, e serão responsabilizados", afirmou Nicole Hockley, cujo filho Dylan, de 6 anos, foi morto no tiroteio.

Hockley afirmou que tinha prometido, após a morte do seu filho, fazer mudanças que impediriam tiroteios em massa.

"Nada trará Dylan de volta. O mais próximo que consigo estar dele agora é beijar a sua urna todas as noites, dizer que o amo e sinto a falta dele", afirmou Hockley. "Mas fiz-lhe uma promessa e continuarei a trabalhar para cumprir essa promessa para o resto da minha vida.

"O que espero com este processo é que, ao serem enfrentadas e, finalmente, penalizadas pelo impacto do seu trabalho, as empresas de armas, juntamente com os setores de seguros e bancários que as impulsionam, sejam forçadas a tornar as suas práticas mais seguras do que nunca, o que irá salvar vidas e impedir mais tiroteios."

Hockley afirmou que os milhares de documentos internos da Remington que as partes queixosas obtiveram "criam a imagem de uma empresa que perdeu o rumo" e que as famílias mal podem esperar por partilhar os documentos com o público.

O acordo de 73 milhões de dólares diz respeito a toda a cobertura disponível que as seguradoras da Remington podiam pagar, afirmaram os advogados das partes queixosas. No verão passado, a Remington ofereceu às famílias um acordo de quase 33 milhões de dólares. Na altura, os advogados das famílias responderam que considerariam as próximas ações a tomar.

As famílias não aceitaram a proposta anterior "porque queriam garantir que obtinham documentos e depoimentos suficientes para provar a má conduta da Remington" e "para garantir que a mensagem do caso para o setor de seguros era clara", segundo o comunicado de imprensa de terça-feira.

Quando questionado se o acordo com a Remington incluía uma admissão de infrações, Koskoff respondeu que não sabia se podia entrar em detalhes, devido a alguns acordos de confidencialidade.

"O que diria é que pela obra é que se conhece o artista. Há quatro seguradoras, cada uma representada por pessoas diferentes. Todos pagaram até ao último cêntimo. Eles viram as mesmas circunstâncias que nós. A Remington está falida, por isso, eles saíram", afirmou Koskoff.

Em 2020, a Remington entrou com o pedido de proteção de falência conforme o Capítulo 11 da lei de falência dos EUA pela segunda vez em pouco mais de dois anos.

Lenny Pozner e Veronique De La Rosa, cujo filho Noah foi morto no tiroteio, declararam no comunicado à imprensa que a sua perda é "irreversível e, neste sentido, este resultado não é redentor nem reparador".

"Num momento, estávamos com este menino de 6 anos maravilhoso e cheio de energia e, no momento seguinte, tudo o que nos restava eram ecos do passado, fotografias de um menino perdido que nunca envelhecerá, calendários que marcam um novo aniversário horrível, uma campa solitária e pedaços da vida de Noah guardados numa mochila e em caixas.”

"O que está perdido permanece perdido. No entanto, a resolução oferece uma certa responsabilidade numa indústria que, até agora, operou com impunidade. Por isso, estamos gratos", afirmaram Pozner e De La Rosa.

E.U.A.

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