Símbolo do empoderamento feminino, Tina Turner pegou em todas as improbabilidades de vir a ter sucesso e construiu o seu trono

25 mai 2023, 08:00

Mulher negra, de famílias desfavorecidas e com um início de carreira marcado pela violência doméstica

Queria ser a primeira mulher a encher estádios, como a própria admitiu. E Tina Turner conseguiu, mesmo que tudo indicasse, ao início, que iria ter um futuro pouco auspicioso. Filha de famílias modestas numa altura em que a segregação nos Estados Unidos ainda era tema, foi vítima de um relacionamento abusivo durante o início da carreira.

A separação de Ike Turner poderia ter sido o fim da sua carreira - a cantora chegou a ir limpar casas depois disso - mas a estrela estava só a nascer. “A Tina Turner é uma das maiores intérpretes da música rock e soul desde o final dos anos 50”, recorda à CNN Portugal o crítico de música Vítor Belanciano.

Uma mulher que, mesmo quando passava por obras que não eram suas, de certa forma as “agarrava”, sempre com uma “interpretação sexualizada e erótica”, descreve Vítor Belanciano.

“Tinha a capacidade de vestir a pele das personagens e fazer uma coisa sua, mesmo na fase de maior sucesso, em que já não correspondia aos protótipos da beleza feminina”, acrescenta, confessando que, na sua opinião, algumas das versões de Tina Turner eram até melhores do que as originais.

Luís Jardim destaca à CNN Portugal a "grande imagem", de uma mulher com "aquela dança", que "nos chamava a atenção". Ainda assim, o produtor diz que Tina Turner "ia ter sucesso fosse como fosse" por causa da voz poderosa que sempre teve.

Tina Turner atua no estádio Maracanã, no Rio de Janeiro, para 200 mil pessoas (AP)

Contra todas as probabilidades

À "grande voz", Vítor Belanciano acrescenta a “grande intérprete”. Um traço que manteve para lá dos 40 anos, e que potenciou após a separação do marido, às mãos de quem sofreu violência doméstica durante 15 anos. “Mesmo nessa fase manteve um lado sensual que conquistava todas as pessoas, sendo um dos poucos exemplos de alguém com mais de 40 anos que conseguia fazer isso.”

Luís Jardim fala da "amiga" Tina Turner como alguém que acabou por saber gerir a sua carreira, apesar das dificuldades. "Foi uma mulher que conseguiu manter-se no topo estes anos todos."

O músico e produtor recorda Tina Turner como uma "mulher extremamente forte" e sem "papas na língua". Falava com todos como se os conhecesse desde sempre, deixando escapar um episódio com Rod Stewart, em que a norte-americana falou com o cantor "como se ele fosse filho dela".

Também Vítor Belanciano vê Tina Turner não como uma vítima, mas como alguém que pegou em todas as improbabilidades de vir a ter sucesso no mundo da arte, e que, com uma “vertente do empoderamento feminino”, se encheu de “coragem” para ser uma das maiores de sempre. Uma "triunfante".

“Quando finalmente se separa e tem a coragem de vir falar publicamente e expor uma vida muito complicada durante 15 anos, isso é digno de coragem”, reitera.

Beyoncé ou Rihanna são duas artistas contemporâneas que incorporam aquilo que Tina Turner simboliza, argumenta Vítor Belanciano. O seu legado atravessa gerações e estilos musicais. Deixou a sua marca no soul, no R&B e no rock.

Cantora exímia e performer nata, a sua morte vai fazer com que se revisite as músicas dos anos 60 e 70, e essa “possibilidade de a redescobrir” vai trazer boas surpresas.

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