Onda de calor extremo é apenas um vislumbre: "Temos de ter consciência de que este será o futuro"

30 jun, 21:12
Calor em Portugal (Nuno Veiga/LUSA)

Chegamos ao fim de junho com um episódio de "grande excecionalidade", mas em breve já não o poderemos dizer. Portugal vai batendo recordes de temperaturas todos os anos e a situação vai "sempre piorando"

Olharmos para o mapa de Portugal e ver grande parte dos distritos pintados a encarnado com o aviso mais severo que existe não é apenas uma anomalia, mas antes um pequeno olhar do futuro de um país que vai, inevitavelmente, aquecer.

O meteorologista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) Carlos Pereira reconhece que registar temperaturas como os 46,6 graus Celsius que se sentiram em Mora durante este domingo não é normal, mas é provável que o venha a ser em breve.

“Esta situação está para ficar. A frequência deste tipo de fenómenos e a sua intensidade e magnitude vão intensificar-se nos próximos anos e décadas”, aponta, falando na crista anticiclónica que se abate sobre a Península Ibérica, formando aquilo a que os especialistas chamam de “cúpula de calor”.

Na prática, é como se uma tampa gigante fechasse o oceano em redor, impedindo a libertação de energia, o que acaba inevitavelmente por aquecer o ar. É assim em Portugal por estes dias, como se de uma tampa a ferver se tratasse.

“Quando falamos de alterações climáticas pensamos sempre que é algo que ainda está por vir, mas já vivemos com elas e temos de nos começar a habituar com um novo mundo, mais quente. Este episódio em junho é de grande excecionalidade”, reitera Carlos Pereira.

Em Portugal, sim, mas em grande parte da Europa, já que Espanha, França ou Reino Unido estão a passar pelo mesmo, temendo-se uma canícula, um período marcado por várias ondas de calor motivadas por fenómenos anticiclónicos.

A expressão “hábito” é cara a Miguel Miranda, antigo presidente do IPMA. À CNN Portugal, o especialista avisa que a população até pode fazê-lo, mas que a paisagem nunca conseguirá.

E é por isso que, como aconteceu em Aljustrel - onde já foi batido o recorde de área ardida - acontece uma consequência óbvia. “A paisagem não se habitua. Quando tem estes picos de calor arde”, lamenta.

Miguel Miranda antecipa que esta é apenas a primeira de mais ondas de calor deste ano. “À medida que o tempo passa, cada dia que passa, cada vez temos mais combustível seco e cada vez vai ser mais complicada a ação dos elementos da Proteção Civil”, sublinha.

E isso, depois de dois anos com níveis de “precipitação muito razoável”, faz com que o fogo tenha muito por onde arder, já que há “muito combustível” nas matas e florestas portuguesas.

Sobre o que se pode esperar no futuro próximo, Miguel Miranda lembra que “a temperatura tem batido recordes todos os anos”, pelo que não há lugar a cantar vitória.

“O facto de batermos recordes todos os anos, com temperaturas já muito próximas dos 47 graus, começamos a entrar num terreno muito complicado”, avisa, apontando que os 50 graus são “um limite para a capacidade de utilização do território pelos humanos”.

“Ainda estamos um bocadinho longe, mas não estamos demasiadamente longe”, reitera, lembrando que a tendência é que a situação vá “sempre piorando”.

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