Cientistas analisaram anos de entrevistas de Taylor Swift para perceber como muda a forma de falar

CNN , Amarachi Orie
11 out, 18:00
Taylor Swift em palco na digressão “The Eras Tour” no BC Place, em Vancouver, Colúmbia Britânica, a 6 de dezembro de 2024 (Kevin Winter/Getty Images)

Os fãs de sempre de Taylor Swift conhecem o longo caminho que a superestrela pop teve de percorrer desde que iniciou a sua carreira musical como cantora country. E essa evolução é evidente no sotaque, segundo cientistas da fala.

Do Tennessee à Pensilvânia, seguindo depois para Nova Iorque, a carreira da vencedora de 14 prémios Grammy levou-a “a entrar e a sair de comunidades com formas de falar diferentes, que são reflexo de contextos regionais ou socioculturais diferentes”, escrevem dois investigadores da University of Minnesota num estudo publicado no The Journal of the Acoustical Society of America.

Miski Mohamed e Matthew Winn, os autores do estudo, assistiram a inúmeras entrevistas e presenças da cantora na comunicação social ao longo da sua carreira, que representam uma “oportunidade rara” de observar mudanças na forma de falar durante um longo período de tempo. De outra forma, tal “seria praticamente impossível de observar num estudo controlado em contexto de laboratório”. Segundo os cientistas, essas observações podem trazer-nos lições sobre a forma como as influências que o local onde se está, que a profissão e os objetivos de liderança têm na forma de falar de uma pessoa.

Nascida na Pensilvânia em 1989, Swift mudou-se para o Tennessee aos 13 anos para procurar chamar a atenção das editoras country em Nashville.

Lá, alcançou sucesso enquanto jovem artista country, tendo lançado em 2009 o álbum country pop de sucesso “Fearless”.

Análise dos registos vocais de Taylor Swift nos seus períodos em Nashville, Filadélfia, e em Nova Iorque (The American Institute of Physics)

A transição para um pop mais “mainstream” tornou-se evidente no lançamento, em 2012, do álbum “Red”, que tinha como tema principal “We Are Never Ever Getting Back Together”.

Em 2014, Swift mudou-se para Nova Iorque, lançando o quinto álbum de estúdio, intitulado “1989”, trabalho que descreveu como o seu primeiro “álbum oficialmente pop”. Dele fazem parte os temas de sucesso “Bad Blood”, “Blank Space” e “Shake It Off”.

Os investigadores analisaram as mudanças na forma de falar de Swift entre 2008 e 2019, com recurso a registos áudio de entrevistas presentes no YouTube e noutros sites.

Cada entrevista analisada encontrava-se ligada à promoção de um álbum específico. Os investigadores escolheram os álbuns com base no local onde Swift morava quando os gravou e promoveu.

Deste modo analisaram vários conjuntos de entrevistas: o primeiro relacionado com o álbum country de 2008 “Fearless”, em Nashville; outro relacionado com o quarto álbum de estúdio, de transição, “Red”, produzido em Filadélfia; e um conjunto final ligado ao sétimo álbum de estúdio, “Lover”, notoriamente pop, que foi desenvolvido em Nova Iorque em 2019, segundo o estudo.

Ao todo foram analisados conjuntos de áudio com 45 minutos, 24 minutos e 37 minutos de fala para cada uma das fases de Swift, respetivamente, em Nashville, Filadélfia e Nova Iorque.

Foi então que os investigadores fizeram medições acústicas para “centenas e centenas de vogais que Taylor pronunciou durante estas entrevistas”, explica à CNN Matthew Winn, coautor do estudo e cientista da área da comunicação e fala.

Eras vocais

Depois de compararem medições acústicas das diferentes fases de Swift, os investigadores observaram sinais de mudanças na forma como a artista pronunciava as vogais: “eram consistentes com os marcadores do sotaque sulista de Nashville. Depois, perderam essas características quando ela foi para Filadélfia”, refere Winn.

A trajetória do movimento da língua da cantora era mais curta quando Swift pronunciava a vogal /aɪ/ [nota do tradutor: algo em português semelhante a ‘ai’, som feito aquando da palavra inglesa “I”, que significa “eu” na língua portuguesa] durante o seu tempo em Nashville, fazendo com que uma palavra como “ride” soasse mais como “rod”. É uma caraterística associada ao sotaque sulista, segundo o estudo.

Swift alongou a pronúncia da vogal /aɪ/ quando se mudou para Filadélfia, mantendo essa pronúncia em Nova Iorque. O final do som da vogal quando Swift estava em Nova Iorque era tão agudo que “é tentador interpretá-lo como uma hipercorreção do dialeto sulista”, afirmam os investigadores.

Quando Swift vivia em Nashville, a sua pronúncia — que a levava a articular vogais com a língua mais à frente — da vogal /u/ era muito mais vincada do que noutras fases, confirmando que estava a adotar um sotaque sulista, defendem os autores do estudo.

Tal fazia a artista pronunciar palavras como “two” de uma maneira que soava como “tee-you”, segundo o comunicado de imprensa que acompanhou o estudo. Contudo, tal traço acabaria por desaparecer quando Swift foi para Filadélfia.

“É bom continuar a encontrar evidências de que isto é verdade: que uma pessoa, mesmo entrando na idade adulta, ainda encontra motivos para mudar a forma como fala, para se encaixar na sua comunidade”, destaca Winn.

“Há muitas pessoas a pensar que os sotaques pertencem a regiões geográficas, pelo menos nos Estados Unidos. Contudo, esse lado da geografia é apenas uma parte. Há muitos outros fatores que levam as pessoas a mudar a forma como falam, incluindo a comunidade social em que estão inseridas. E deste modo, tal como aconteceu com Taylor Swift, que se estava a mudar para essa comunidade da música country, houve outra razão pela qual a voz da cantora se alterou”, acrescenta.

Sotaques e ativismo

O tom de voz de Swift também se mostrou “significativamente mais baixo” durante a sua fase em Nova Iorque, segundo o estudo. Observou-se que um tom de voz mais baixo é usado com frequência por quem fala para sinalizar confiança e autoridade em assuntos importantes, procurando que o orador seja percebido como um líder.

“Esta época coincidiu com o aumento da sua visibilidade, falando sobre questões de mudança social, sexismo, direitos dos músicos e ainda acerca da sua própria autonomia na carreira musical”, afirmam os investigadores.

Swift promoveu a igualdade da comunidade LGBTQ na edição de 2019 do MTV Video Music Awards, cantou acerca da mobilização dos jovens na canção «Only The Young» de 2020 e expressou o seu apoio aos democratas.

Helen West, professora de Língua Inglesa na University of Chester, no Reino Unido, que faz parte da equipa do “The Swift Accent Shift Project” desta universidade, conta que ficou “animada” com o fato de as conclusões do estudo realizado no Minnesota serem semelhantes às da sua equipa no que respeita ao sotaque de Swift enquanto canta.

“O que achei especialmente notável neste estudo, que se debruça sobre as entrevistas de Taylor Swift, não foi só o facto de a cantora ter adaptado a sua forma de falar pelo facto de viver perto de Nashville e tocar produzir música country, e de ter depois mudado no sentido de adotar as características de sotaque associadas ao norte dos EUA, enquanto o seu género musical se aproxima da música pop. É uma conclusão que o nosso próprio estudo corrobora na análise do sotaque da cantora na sua música. O que achei notável foi o facto de que ela terá baixo o tom de voz para soar como uma figura de autoridade no momento de discutir questões sociais”, reage West, que não participou no estudo referido neste artigo.

“Tal demonstra como os nossos sotaques podem ser adaptáveis, dependendo do nosso sentido de identidade, do nosso contexto social, da nossa perceção do público que temos à nossa frente e da natureza da mensagem que desejamos transmitir em determinado momento”, junta.

No entanto, embora seja possível que Swift tenha baixado o tom de voz “para sinalizar a seriedade desses temas e transmitir a sua competência para falar sobre eles com substância”, a verdade é que a mudança no tom de voz também coincide com uma outra fase da sua vida, no que à idade diz respeito, dos 19 aos 30 anos, notam os investigadores.

Um padrão semelhante de redução do tom de voz foi observado, por exemplo, na fala da rainha Isabel II durante o mesmo período da sua vida. Trata-se de algo frequente entre as mulheres na faixa dos 30 anos. Por isso, “pode ser apenas um simples padrão associado ao envelhecimento na casa dos 20 anos”, acrescentam os investigadores.

"Não era o 'verdadeiro' sotaque dela"

Em maio, Swift anunciou que adquiriu os direitos autorais de todo o seu catálogo musical, anos depois de as suas gravações originais terem sido vendidas pela antiga editora da cantora. Além disso, confirmou que concluiu a nova gravação do seu álbum de estreia, “Taylor Swift”, de 2006.

Os fãs “têm discutido isto há décadas”, refere à CNN a escritora Elly McCausland, que é professora de Literatura Inglesa na Ghent University, na Bélgica, tendo organizado o curso “Literature: Taylor’s Version”.

“Especula-se que foi por isso que Taylor esperou tanto tempo para regravar o seu álbum de estreia, uma vez que teria de voltar a adotar o sotaque country sulista, que não era o seu ‘verdadeiro’ sotaque”, continua McCausland, que não participou no estudo referido neste artigo.

“Acho que diz mais sobre o tipo de sotaque que se espera de certos géneros musicais do que outra coisa, uma vez que a música country está associada sobretudo ao sul dos Estados Unidos”, acrescenta.

Todavia, os autores do estudo observam que, como ouviram gravações de conversas casuais, e não tidas num ambiente controlado de um laboratório, e não puderam falar com a própria Taylor Swift, o estudo só pode determinar a variedade de razoes pelas quais a artista pode ter alterado, de forma consciente ou inconsciente, a sua fala enquanto a sua carreira evoluía.

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