Afinal não há parecer jurídico sobre demissões na TAP. Só uma deliberação fundamentada da assembleia geral

ECO - Parceiro CNN Portugal , Filipa Ambrósio de Sousa e André Veríssimo
20 abr 2023, 16:59
A presidente executiva da TAP, Christine Ourmières-Widener, na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP (Lusa/António Cotrim)

O parecer jurídico sobre a destituição da CEO e do chairman da TAP, que tem motivado trocas de acusações entre o Governo e o oposição, afinal não existe

O parecer jurídico que fundamentaria a demissão da CEO e do chairman da TAP, que o PSD requereu e o Governo não entregou, afinal não existe. Há apenas a deliberação da assembleia geral para a destituição dos administradores, cuja fundamentação jurídica foi preparada com o apoio da JurisAPP, um centro de competências do Estado, apurou o ECO.

A fundamentação para a demissão de Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja por “justa causa” foi contestada pela CEO e levou a oposição a pedir ao Governo que apresentasse os argumentos jurídicos em que a mesma se baseia. O ministro das Finanças chegou a afirmar em meados de março que a exoneração dos administradores estava “juridicamente blindada”, acrescentando que o processo estava “nas mãos dos serviços jurídicos do Estado”.

A oposição quis saber se existia um parecer e, existindo, que ele fosse divulgado. O PSD aproveitou a comissão parlamentar de inquérito (CPI) à tutela pública da gestão da TAP para requerer o documento aos ministérios das Infraestruturas e Finanças. O Governo negou o pedido, argumentando com a “defesa do interesse público” e o facto de se tratarem de acontecimentos ocorridos já após a tomada de posse da CPI e que extravasam o seu objeto. Os deputados aprovaram esta quarta-feira o envio de um novo pedido aos ministérios, ameaçando com uma queixa à Procuradoria-Geral da República caso não fosse novamente entregue.

Afinal, não há mesmo nenhum parecer autónomo. Há apenas a deliberação tomada na assembleia geral de dia 14, em que foram adotadas as decisões finais sobre os procedimentos legalmente previstos para a destituição dos titulares dos cargos de presidente do conselho de administração e da comissão executiva. Deliberação essa que vem acompanhada por uma fundamentação jurídica, preparada com o apoio da JurisAPP o Centro de Competências Jurídicas do Estado, apurou o ECO.

O Centro de Competências Jurídicas do Estado é “um serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa e está sujeito ao poder de direção do Primeiro-Ministro ou do membro do Governo em quem aquele o delegar”, segundo se pode ler no site da JurisAPP.

“O JurisAPP tem por missão prestar consultoria, assessoria e aconselhamento jurídicos, bem como informação jurídica em matéria de contratação pública, procedimentos contraordenacionais e procedimentos disciplinares, aos membros do Governo, ficando, igualmente, responsável por assegurar a representação em juízo do Conselho de Ministros, do Primeiro-Ministro e de qualquer outro membro do Governo organicamente integrado na Presidência do Conselho de Ministros ou que beneficie dos respetivos serviços partilhados, incluindo nos processos que correm perante o Tribunal Constitucional e o Tribunal de Contas”, acrescentam.

O advogado da ex-CEO da TAP, Paulo de Sá e Cunha, afirmou em declarações à RTP3 que teve acesso apenas a dois projetos de deliberação de demissão – da TAP – “e são deliberações dos acionistas destas sociedades, o Estado e a Parpública”. O que fundamenta a decisão de demissão “essencialmente é o relatório da IGF”, publicamente divulgado a 6 de março. Uma parte muito significativa dessas fundamentações reside nesse relatório, que considerou nulo o acordo para a cessação de funções da antiga administradora Alexandra Reis e a indemnização de 500 mil euros brutos nele prevista.

De acordo com a deliberação assinada no passado dia 12 de abril pelos representantes da Parpública e da Direção Geral do Tesouro e Finanças (DGTF), acionistas públicos da TAP, o presidente do conselho de administração (PCA) da companhia, Manuel Beja, terá violado as normas legais e estatutárias por ter subscrito o acordo de rescisão de Alexandra Reis e “por em momento algum ter solicitado a convocação de uma assembleia geral para esse efeito ou sequer ter reportado ao ministério das Finanças”.

Já a CEO, Christine Ourmières Widener, terá violado as normas por “por sua iniciativa ter iniciado e conduzido o processo que culminou no acordo de saída de Alexandra Reis, o ter subscrito, e igualmente por em momento algum ter solicitado a convocação de uma AG para este efeito ou sequer o ter reportado ao Ministério das Finanças”.

 

Em janeiro, Fernando Medina e João Galamba, depois de terem recebido o relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) sobre a saída de Alexandra Reis da TAP, decidiram demitir a liderança da companhia aérea.

Fernando Medina afirmou, nessa altura, que “se impõe neste momento um virar de página na gestão da empresa”, tendo por isso o Governo decidido a “exoneração, com justa causa, do Presidente do Conselho de Administração e da Presidente da Comissão Executiva da TAP“.

O ministro das Finanças afirmou que o processo de saída da antiga administradora Alexandra Reis com uma indemnização de 500 mil euros “levantou uma legítima indignação no país”, numa altura em que a companhia está sujeita a um plano de reestruturação que “impõe sacrifícios diários aos trabalhadores da empresa e que requereu um esforço muito significativo dos portugueses”. Gerou além disso “justificada incompreensão quanto a falhas evidentes nas práticas de gestão e de governo societário”.

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