O ex-secretário de Estado das Infraestruturas descartou que a capitalização da TAP tenha sido feita com dinheiro da própria companhia, à custa dos fundos Airbus, que terão colocado a transportadora a pagar aviões acima do valor de mercado
O governo de Passos Coelho só foi informado da existência dos polémicos fundos Airbus em outubro de 2015, já depois de assinado o acordo de venda à Atlantic Gateway de 61% do capital da TAP em junho desse ano.
“Tomámos conhecimento das fontes de financiamento que David Neeleman e Humberto Pedrosa apresentaram nos meses de setembro e outubro, detalhadamente numa carta remetida pela Atlantic Gateway à Parpública a 16 de outubro, de que a Parpública nos deu conhecimento”, informou o ex-secretário de Estado das Infraestruturas Sérgio Monteiro.
Na comissão parlamentar de inquérito sobre a gestão da TAP, confirmou que só nessa altura “tomámos nessa ocasião conhecimento daquilo que se tem designado como fundos Airbus”. “Não eram conhecidos em junho”, reforçou.
Em causa estava a referência a uma “contribuição” de 224 milhões de euros da fabricante aeronáutica, justificada pela “magnitude” da encomenda de 53 aviões para a TAP e o facto de David Neeleman ser um “parceiro credível”.
Questionado sobre a existência de uma referência a esses fundos numa versão prévia do acordo com a Atlantic Gateway, descartou: “Em maio, há um contrato que tem como contraparte a Airbus. Em nenhum sítio é referido que a origem dos fundos para aquisição do contrato que tem como contraparte a Airbus é a própria Airbus”.
“A contribuição da Airbus não corresponde a dinheiro da TAP”
Ora, esses 224 milhões de euros foram utilizados por David Neeleman para financiar a sua entrada na TAP. Mas Sérgio Monteiro descarta que este processo de capitalização da companhia aérea tenha sido feito com verbas da própria TAP.
“A contribuição da Airbus não corresponde a dinheiro da TAP. Corresponde a uma contribuição, por parte de um fornecedor, tendo em conta um cancelamento de um contrato e uma encomenda relevante”, afirmou.
Embora hoje esteja a ser investigado que a TAP está a pagar acima do preço de mercado pelas aeronaves, Sérgio Monteiro assegurou que toda a informação existente na altura é de que existia um desconto comercial à TAP, dada a dimensão da encomenda, um cenário que acabou mesmo confirmado por avaliações independentes: “o valor apresentado pela encomenda, face ao justo valor dos aviões, é de 233 milhões de euros a menos”.
Em causa está o acordo celebrado por David Neeleman com a Airbus, que permitiria à TAP desistir do ‘leasing’ de 13 aeronaves A350 e assinar um novo contrato para adquirir 53 novos aviões.
O ex-governante reconheceu que, sem a privatização da TAP, esses 224 milhões de euros nunca teriam sido possíveis para a capitalização da transportadora.
Ainda antes deste acordo de Neeleman com a Airbus ser conhecido, o ex-presidente executivo da TAP Fernando Pinto pediu a Sérgio Monteiro que interviesse junto da fabricante de aviões, considerando que tinha perdido toda a “credibilidade” junto da Airbus e que se arriscava a perder 40 milhões adiantados para a encomenda pendente. Sérgio Monteiro deu então esse “testemunho direto” à Airbus sobre a existência da privatização, contou.
Havia informação, mas governo não a passou aos sucessores
Nesta semana, o antigo ministro das Infraestruturas socialista Pedro Marques argumentou que só teve conhecimento dos chamados fundos Airbus através de uma entrevista de David Neeleman à Visão em janeiro de 2016, lamentando que no processo de passagem de pastas nem o anterior governo PSD/CDS-PP, nem a Parpública nem a TAP tenham prestado diretamente informação sobre este tema.
O ex-ministro explicou que foi após a entrevista que confirmou a existência de documentação sobre esse tema na pasta de transição entregue pela Parpública, mas descartou alguma vez ter-se cruzado com referências que atestasse que os aviões estivessem a ser pagos pela TAP acima do preço de mercado.