Ex-presidente da TAP trabalhou para Atlantic Gateway antes da privatização ser fechada. “Erro administrativo” ou esquema para Neeleman conseguir fundos da Airbus?

1 jun 2023, 22:57
Fernando Pinto

Retrato traçado pelo comunista Bruno Dias permite concluir que Fernando Pinto terá encetado várias ações para dar força ao acordo com a Airbus, que permitiu os fundos necessários à entrada de David Neeleman na TAP

O ex-presidente da TAP Fernando Pinto terá trabalhado para o consórcio privado Atlantic Gateway durante o processo de privatização da companhia aérea, cujo processo de venda só seria concluído em novembro de 2015.

O cenário foi traçado na comissão parlamentar de inquérito sobre a gestão da TAP pelo deputado comunista Bruno Dias, que revelou a presença de Fernando Pinto na constituição da Atlantic Gateway, de David Neeleman e Humberto Pedrosa, a 19 de junho de 2015, antes de assinado o acordo de venda.

O comunista sugeriu que a presença de Pinto - que alertava para a necessidade de renegociar um contrato existente com a Airbus dada as dificuldades de pagamento das prestações acordadas - terá favorecido os interesses de Neeleman enquanto negociava com a fabricante aeronáutica, garantindo capital para a sua entrada na empresa.

Isto porque a negociação do empresário americano permitiu à TAP desistir do ‘leasing’ de 12 aeronaves A350 (onde a TAP estava em risco de incumprimento) e garantir a compra de 53 novos aviões mais alinhados com a nova estratégia privada para a empresa. E, com isso, a Airbus cedeu-lhe 224 milhões de euros, aplicados na TAP como prestações acessórias.

“Tivemos o presidente da TAP enquanto estava a ser privatizada, a trabalhar para aqueles que a compraram”, lamentou Bruno Dias.

O ex-secretário de Estado das Infraestruturas Sérgio Monteiro, que foi responsável pelo processo de privatização, disse não ter memória da passagem de Fernando Pinto pela Atlantic Gateway. Mas, alguns minutos depois, o antigo chefe de gabinete recordava-o que o ex-presidente da TAP esclareceu, em novembro de 2015, que essa nomeação tinha sido um “erro administrativo”.

“Há oficialmente um ato de renuncia de Fernando Pinto da Atlantic Gateway em novembro de 2015. Há uma renúncia oficial para sair de um erro administrativo. Falar-se em erro administrativo durante cinco meses é obra”, retomou o comunista.

A renúncia só aconteceu a 8 de novembro, depois de reconfigurada a proposta da TAP para os fundos Airbus. A venda da TAP seria fechada quatro dias depois, a 12. Também nesse dia surge o parecer jurídico da Vieira de Almeida a atestar a legalidade da capitalização com recurso aos fundos Airbus.

“Eu não tinha conhecimento do erro administrativo que foi alegado por Fernando Pinto. Lamento que tenha acontecido. Acho-o profundamente desadequado esse erro administrativo que foi assumido pelo próprio Fernando Pinto em novembro de 2015. Era preferível que não tivesse acontecido”, reagiu Sérgio Monteiro.

No final da audição, o deputado Hugo Carneiro, do PSD, lembrou que no site de Publicações de Atos Societários do Ministério da Justiça é referida a entrada de Fernando Pinto a 5 de novembro de 2015.

Na resposta, Bruno Dias citou que a cronologia que traçou assenta em documentação confidencial cedida à comissão de inquérito, confirmando 19 de junho de 2015 como data da entrada de Fernando Pinto no consórcio.

O PCP deu entrada a um requerimento, dirigido ao Ministério da Justiça, para obter toda a documentação relativa a este caso.

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