CMVM: TAP não estava obrigada a comunicar indemnização de 500.000€ a Alexandra Reis

13 abr 2023, 19:10

Segundo o líder da CMVM, era obrigatório comunicar a saída de administradores como Alexandra Reis. Mas o valor a pagar só seria exigido se pudesse “influenciar, de forma sensível, a formação dos preços das obrigações”

O presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Luís Laginha de Sousa, reconheceu aos deputados que a TAP não estava obrigada a comunicar ao regulador do mercado a indemnização de 500 mil euros paga à antiga administradora Alexandra Reis.

Apesar de reconhecer que a cessação de funções deveria sempre ser comunicada, “só haveria exigência de divulgação de indemnizações pagas se a indemnização fosse de tal forma elevada que pudesse influenciar, de forma sensível, a formação dos preços das obrigações emitidas pela empresa”.

Laginha de Sousa lembrou o primeiro comunicado enviado pela TAP à CMVM, em fevereiro de 2022, dando conta das “dúvidas” que acabaram por ser levantadas quanto à saída de Alexandra Reis.

“Tendo verificado que a informação inicial apontava para um contexto de saída diferente daquele que se revelou ter existido, a CMVM determinou a correção do comunicado, não quanto à validade ou consequências legais dos atos práticos, que não compete à CMVM aferir, mas quanto à factualidade do que foi comunicado”, determinou.

Foi então feita a correção para esclarecer que a iniciativa de fim de funções de Alexandra Reis “partiu da empresa e não da referida administradora”.

Laginha de Sousa confirmou que o principal intermediário da TAP com a CMVM era o administrador financeiro, Gonçalo Pires, embora também houvesse interações com os serviços jurídicos. E descartou responsabilidades do acionista, o Estado, no reporte ao regulador: “A responsabilidade é da emitente”, ou seja, a TAP.

O líder da CMVM foi confrontado se a correção do comunicado pela TAP para clarificar que a saída de Alexandra Reis foi uma iniciativa da empresa foi suficiente. “Essa alteração foi adequada, nesse momento, à luz da informação que tínhamos disponível”, disse. Isto porque, a 25 de janeiro de 2023, a CMVM consideraria que não foram prestadas todas as informações relevantes. “De facto, houve essa prestação de esclarecimentos” da TAP, juntou.

 

CMVM identificou falha de reporte de indemnização paga a Antonoaldo Neves. Mas acordos milionários com Urbahn e Pinto ficam de fora do âmbito

Também sobre o dever de informação, Laginha de Sousa foi questionado sobre a demora da TAP a comunicar ao mercado a saída da CEO e do presidente do conselho de administração. A companhia começou por dizer que não tinha mais detalhes além da conferência de imprensa dada por João Galamba e Fernando Medina a demitir os dois gestores com justa causa. Essa comunicação só aconteceu a 14 de março. “Houve processo de interação entre a CMVM e a TAP, que conduziu a que a TAP emitisse um comunicado na sequência da indicação que a CMVM lhe transmitiu.”

Questionado sobre se a CMVM também não procurou perceber os contornos das saídas de Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja, tal como aconteceu com Alexandra Reis, lembrou que “ainda existe um processo a decorrer”. “Se houver informação que seja materialmente relevante e que possa impactar naquilo que é o valor das obrigações que os obrigacionistas têm, ela está obrigada a comunicar isso ao mercado”, reforçou.

Já sobre os acordos milionários para a pré-reforma do antigo administrador Maximilian Otto Urbahn (1,3 milhões de euros) e para um contrato de consultoria prestada por Fernando Pinto (1,6 milhões de euros), antigo presidente da TAP, que Mariana Mortágua apresentou como “indemnizações apresentadas de outra forma”, Laginha de Sousa concretizou: “Tanto quanto eu sei, essa situação corresponde a um período em que a empresa não era emitente”.

Isto porque, só a 29 de maio de 2019, com a emissão de obrigações, é que a TAP passa a estar sobre o crivo da CMVM.

CMVM acreditou na boa-fé da TAP? Não havia “histórico” para soar campainhas de alarme. “Somos sempre rigorosos”

Questionado sobre se a CMVM se limitou a confiar na boa-fé da TAP ou se não tinha capacidade para agir atempadamente, já que demorou 11 meses a pedir a correção do comunicado sobre a saída de Alexandra Reis, Laginha de Sousa recorda o histórico da companhia.

E apontou: “A CMVM não tinha motivos nenhuns para duvidar da veracidade de um comunicado que é emitido por uma entidade com obrigações cotadas. E portanto, naturalmente, que, para exercer a sua supervisão, leva em conta fatores que entenda que mereçam maior atenção. Olhando para o quadro, para o histórico de cumprimento da entidade em mercado, é uma entidade que cumpriu todos os compromissos associados a essas obrigações”.

“Do ponto de vista de proteção do interesse dos obrigacionistas, a leitura que existia na CMVM era uma leitura que não apontava para qualquer tipo de preocupação relativamente à veracidade desse comunicado”, juntou, lembrando que o documento não tinha impacto na capacidade da empresa honrar os seus compromissos com os obrigacionistas.

E, se houver novos comunicados à CMVM, a CMVM será “mais rigorosa”? À pergunta do deputado do Chega Filipe Melo, Laginha de Sousa garante que “rigorosos somos sempre”. “E adaptamos a capacidade de supervisão em função daquilo que são os fatores que, na avaliação que fazemos dos interesses a defender, adaptamos também a nossa atuação”.

Já Bernardo Blanco da Iniciativa Liberal questionou se os investidores poderão procurar ser ressarcidos pela TAP por ter prestado informação incorreta ao mercado. Laginha de Sousa responde: “Da parte dos obrigacionistas, se eles não forem lesados naquilo que foi o compromisso que a emitente assumiu para com eles, não sou jurista, mas creio que não há matéria”. Mas lembra que, se alguém se sentir lesado, pode sempre recorrer à justiça.

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