Faz sentido tomar suplementos alimentares para reforçar a saúde e energia no pós-férias?

16 ago, 12:00
Suplementos alimentares (Unsplash)

VERÃO CNN | Dicas que o ajudam a viver melhor esta estação

A oferta é variada, o preço encaixa em qualquer carteira e as promessas são mais do que muitas: há largos anos que os suplementos alimentares ganham adeptos, sobretudo por quem procura otimizar o bem-estar e a performance desportiva. Mas são assim tão ‘milagrosos’? Não, mas há casos em que podem fazer sentido. Como há também casos em que, como diz a sabedoria popular, o que é demais é moléstia. E nem os médicos estão totalmente de acordo.

Para o médico Jorge Dores, vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM), estamos perante “uma moda”. A toma de suplementos alimentares - seja para reforçar a concentração, melhorar o sono, dar aquele extra de ómega 3 - vive das promessas que são feitas e também das redes sociais, que é agora um palco de destaque para a promoção destes produtos. 

É uma moda talvez um pouco implementada pela indústria em geral destes produtos e pela procura incessante do bem-estar, enquanto há coisas que deviam ter sido feita previamente”, diz o médico.

Não há números que espelhem o consumo nacional destes produtos - que não são classificados como medicamentos e, por isso, escapam à validação do Infarmed e, por isso, a rotulagem nem sempre é fidedigna -, mas os especialistas dizem que é uma tendência sobretudo no pós-férias e regresso ao trabalho, quando o objetivo é conseguir a melhor forma física e mental. A questão é que nem todas as pessoas precisam se suplementar. E dificilmente precisam de tanta variedade de suplementos.

Sofia Couto da Rocha, médica especialista em Medicina Funcional e Anti-Envelhecimento nos Lusíadas diz que “existem tantos suplementos quantos os nutrientes e minerais necessários para o nosso corpo funcionar, passíveis de quimicamente serem colocados numa formulação possível de toma, maioritariamente oral ou por absorção cutânea, que são os meios de auto-administração típicos”. Mas apressa-se a dizer que dificilmente uma pessoa precisa de tanta variedade, sobretudo em simultâneo. 

Inevitavelmente há que estudar o nosso estado nutricional, os nossos hábitos de vida, a história da nossa saúde e das nossas doenças e o momento de vida em que estamos. Evitamos gastar tempo e recursos com suplementos que não trazem benefício e podem ainda estar a gerar efeitos contraproducentes ou desequilíbrios”, atira a médica.

Quando faz sentido tomar suplementos alimentares?

Sofia Couto da Rocha defende que os suplementos alimentares podem fazer sentido “para adultos e crianças quando estão em défices ou longe dos valores ideais”, devendo esses suplementos ser “selecionados e dirigidos”, sendo, por exemplo, uma mais-valia em casos de “níveis de exercício mais elevados ou dietas alimentares mais restritivas”. E, nestas situações concretas, a toma deve ser feita em qualquer altura do ano, não apenas no pós-férias. Mas sempre com a supervisão médica, dizem os especialistas.

Queda de cabelo, unhas enfraquecidas, falta de energia e incapacidade de manter o foco são alguns dos sinais aos quais as pessoas tentam dar resposta com suplementos alimentares, mas a médica alerta que “as causas” para estes sintomas “podem ser múltiplas, de origens muito diferentes e de gravidade muito variável também” e nem sempre o suplemento pode ser o mais indicado ou suficiente para arrumar com a questão.

Algumas [causas] podem ser tão somente nutricionais, outras podem ter alterações de vários órgãos como a tiróide. Quando a suplementação se faz com multivitamínicos cujas doses são standard e sempre abaixo da dose diária recomendada os riscos são mínimos mas também os efeitos, nomeadamente neste tipo de exemplos, não são sentidos. Há que fazer uma avaliação aprofundada para entender a fundo a causa destes sintomas, tantas vezes tratados como ‘normais’”, aconselha a médica.

Jorge Dores recomenda às “pessoas sem doenças de base” consultarem um médico ou nutricionista para saber “na história clínica” se há alguma carência nutricional e se esta beneficia de um suplemento ou de um medicamento. Pessoas com padrões alimentares que fogem da dieta mediterrânea, “em que há menor aporte de determinados alimentos” e “pessoas que não comem carne” podem apresentar carências de “vitamina B12, ferro e zinco” e aquelas “que não comem vegetais” podem apresentar “falta de ácido fólico”. Nestes casos, assegura, o suplemento pode ser a solução.

“Nestes casos, pode ser [benéfico] um suplemento de determinado nutriente, não um tiro de caçadeiras com múltiplos nutrientes”, diz o médico.

Especialistas defendem que a toma pode fazer sentido quando há alguma carência nutricional detetada, mas advertem para riscos da toma por conta própria (Pexels)

Suplementos para dormir: bons sonhos ou só pesadelos?

A eficácia destes produtos é uma questão central. Se efetivamente houver alguma carência, estes produtos podem ser uma mais-valia, mas há casos, como os suplementos com melatonina - agora também à venda sob a forma de gomas e com a promessa de melhorar a qualidade de sono - que pouco mais fazem do que o efeito placebo.

“Em tom de brincadeira, mal não fazem, é preciso tomar aquilo com fé”, diz-nos, a rir, Jorge Dores. E agora num tom sério: “não há estudos” que comprovem a eficácia, pois “para que os medicamentos sejam vistos como eficazes te de haver estudos controlados com placebo, as que tomam placebo também melhoram, é o chamado efeito placebo”, explica, dizendo que no caso dos suplementos, por vezes, nem há estudos na base da sua formulação e comprovação de eficácia.

A Sofia Couto da Rocha é mais otimista quanto aos suplementos de melatonina. “Esta hormona é produzida pelo nosso cérebro em resposta à escuridão, suplementa-se para num determinado momento aumentar a concentração no corpo e facilitar o adormecer”.

Quanto à possibilidade de causar habituação, a médica esclarece que “o que se sabe sobre a melatonina é que tomar consistentemente não leva a um decréscimo da melatonina produzida pelo próprio corpo, ele não se torna ‘preguiçoso’ e quando se suspende tratamento, voltamos ao estado pré-toma de melatonina”. 

Mas, tal como qualquer outro suplemento, adverte Sofia Couto da Rocha, há “alguns possíveis efeitos colaterais, mais associados à dose que cada um tolera”, mas efeitos esses “passíveis de gerir sem grande complicação”. 

“O nosso corpo já é dependente desta hormona para dormir (produzida naturalmente), e, com a idade tendencialmente produzimos menos, o que pode tornar muito útil a sua toma”, diz a médica.

O risco de toxicidade é real

À partida, a toma destes suplementos é inofensiva se for feita a curto prazo. Mas está longe de ser imaculada. 

“As doses dos suplementos é um dos temas menos referidos e dos mais importantes. Algumas vitaminas e minerais podem chegar a doses tóxicas ou mesmo não estarem adequadas se tivermos algumas condições de saúde, como por exemplo magnésio tomado de forma não adequada em pessoas com alguns tipos de alterações do trânsito intestinal”, adverte a médica Sofia Couto da Rocha, que continua: “O risco vem de mãos dadas com o desconhecimento. Não são moléculas inócuas, são substâncias muito úteis se bem usadas”.

Sobre este ponto, o médico Jorge Dores não hesita em dar exemplos de casos em que um suplemento pode fazer pior do que melhor. “Há pessoas que podem ter tendência para desenvolver hipertireoidismo, que é um aumento de hormonas da tiróide, que tende a trabalhar em excesso e se não houve um aporte suficiente de matéria-prima, como o iodo, não chega a haver a expressão do hipertireoidismo. Se fizermos um polivitamínico com idoo podemos ter hipertireoidismo”, adianta o médico, que dá outro exemplo: “quando damos indiscriminadamente um suplemento, como selénio, se vai com um conjunto de outros nutrientes, pode haver toxicidade”.

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Se em causa não está qualquer carência nutricional e o objetivo é apenas conseguir concentrar-se, dormir melhor e ter mais energia, então há que mudar hábitos e padrões alimentares. 

O melhor é, sem aumentar o balanço energético, o consumo de alimentos ricos em energia [calorias], diversificar ao máximo para que consigamos ter o aporte suficiente deste nutriente fundamentais”, aconselha o médico, dizendo que muitos dos suplementos à venda são feitos com base em alimentos e, por isso mesmo, nada melhor do que consumir o alimento no seu estado natural e não manipulado.

Ter um estilo de vida ativo e com prática regular de exercício físico é meio caminho andado para ganhos na saúde, assim como manter-se fiel ao padrão alimentar mediterrâneo, privilegiando a saúde intestinal, controlar o consumo de cafeína (e não dizemos apenas café, ela esconde-se em vários alimentos), reduzir o tempo em frente aos ecrãs - sobretudo redes sociais à noite - e adotar uma boa rotina de sono, criando o hábito de deitar e levantar todos os dias à mesma hora e com o quarto na temperatura adequada.

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