As multivitaminas e estimulantes de memória e cérebro estão no topo da tabela de vendas, já o magnésio aumenta 100% desde 2013
O consumo de suplementos não tem parado de subir nos últimos anos. Desde 2013, houve um aumento de 90% da venda destes produtos e só até ao mês de maio deste ano já se venderam cerca de seis milhões de caixas.Quanto aos gastos com estes suplementos, atingiram os 119 milhões de euros. Os dados, disponibilizados à CNN Portugal pela HMR - Health Market Research, revelam um fenómeno cada vez maior no recurso a este tipo de vitaminas por parte dos portugueses, nomeadamente dos jovens.
Os suplementos mais vendidos nas farmácias e parafarmácias são as multivitaminas com minerais, seguidas pelos estimulantes de cérebro e memória, que cresceram quase 40% desde 2013.
“Há uma crescente consciencialização sobre a importância dos micronutrientes na saúde e prevenção da fadiga”, diz à CNN Portugal a médica de smart aging e longevidade do Hospital Lusíadas Saúde, Sofia Rocha, considerando que esta situação pode estar por trás do crescimento de vendas dos suplementos alimentares em Portugal.
Mas o aumento também se deve ao facto de a maior parte das vitaminas terem deixado de ser prescritas pelos médicos, aponta Fátima Gonçalves, médica de clínica geral. Depois disso, “os laboratórios começaram a apresentar combinações de princípios ativos” que são vendidas nas farmácias e parafarmácias. Ao mesmo tempo, sublinha a médica, “muita gente começou a praticar desporto e, por isso, acham que devem tomar suplementos”.
Normalmente, esclarece, as “pessoas com mais idade sentem uma mais valia em relação ao consumo de suplementos”. Por outro lado, hoje em dia, frisa a clínica geral, cerca de 80% da população tem tendência a ter falta de vitamina D, por exemplo. A toma de suplementos pode, assim, ajudar a colmatar possíveis faltas desta vitamina.
Multivitaminas são o suplemento mais vendido
O valor arrecadado com as vendas do suplemento era, em 2013, de 18 milhões de euros chegando em 2023 aos 27 milhões - um aumento de quase dez milhões de euros.
As multivitaminas, que mantêm o primeiro lugar nas vendas desde 2013, são, normalmente, compradas por quem “não sabe o que realmente necessita“, indica a médica do Hospital Lusíadas Saúde. “Assumem a compra do suplemento como menos risco e algum benefício", acrescenta Sofia Rocha.
É o caso de Inês Ribeiro, uma estudante universitária de 24 anos, que acumula os estudos com um trabalho, e começou a tomar multivitaminas há seis meses.
Com os dias praticamente ocupados, sentia-se sobrecarregada e constantemente cansada, além de andar “em baixo” e com dificuldades em comer e dormir bem. O dia da jovem de 24 anos começa normalmente às nove da manhã e até às seis horas da tarde tem trabalho ou aulas, dependendo do dia.
“Depois num dos dias do fim de semana também trabalho o dia todo. Portanto tenho um dia livre por fim de semana e, por vezes, tenho um dia livre na semana, mas nem sempre”, explica. Mesmo nos dias aparentemente livres, a jovem aproveita para estudar ou fazer trabalhos, o que não lhe deixa muito tempo de descanso.
Inês Ribeiro garante que, desde que reforçou a sua alimentação com as vitaminas, sente-se melhor a nível de sistema imunitário. "Foi um dos invernos em que menos fiquei doente", garante. Já a nível físico, o cansaço também foi menor. Relativamente à concentração, para já, ainda não sentiu nenhuma diferença.
Combater a falta de memória e estimular o cérebro
Por dia, em 2023, venderam-se cerca de 2.000 caixas de estimulantes para o cérebro e memória, um aumento de 500 caixas diárias em relação a 2013. Também o preço por caixa subiu de 22,30 euros para 26,24 euros, o que representa um aumento de 3,94 euros.
Sofia Rocha explica que os estimulantes para o cérebro e memória são habitualmente utilizados para “melhorar a função cognitiva, a memória, a concentração e a capacidade de processamento mental”, sendo especialmente procurados por estudantes.
"O aumento dos estimulantes de cérebro e memória pode ser atribuído ao crescente interesse em melhorar o desempenho cognitivo, especialmente em contextos académicos e profissionais de alta demanda ou rendimento”, aponta a médica.
Também nos últimos dez anos, as vendas de suplementos alimentares para o sono quadruplicaram. Em 2023, os gastos com estes suplementos ultrapassaram os valores de 2013 em dez milhões de euros.
Consumo de magnésio aumentou 100% em dez anos
Outro dado interessante diz respeito ao magnésio: todos os dias são vendidas nas farmácias portuguesas 2.100 caixas deste suplemento, revela o estudo da HMR a que a CNN Portugal teve acesso. Já o preço médio por caixa também subiu significativamente, de 14,66 para 19,64 euros. Os números revelam ainda um aumento de consumo de 100% nos últimos dez anos: ou seja, passou de 389.797, em 2013, para 793.319, em 2023.
Foi há dois meses que Sofia Santos, estudante de Ciências da Comunicação de 18 anos, decidiu começar a tomar magnésio por recomendação farmacêutica.
O que sentia, relata, era que, mesmo que dormisse entre oito a nove horas, o cansaço mantinha-se. A jovem sentia dores nas pernas e no corpo e, depois de um dia de faculdade, chegava a casa e tinha de se sentar ou deitar imediatamente.
Depois de tomar a vitamina durante algum tempo, a universitária admite que começou a sentir menos cansaço e ansiedade: “Deixei de tomar medicação que me ajudava numa condição mental que tenho e também na minha ansiedade, então senti que o magnésio conseguia fazer um pouco o efeito de tratar essa parte mais nervosa.”
Sofia Rocha explica que o magnésio é um “mineral essencial que desempenha uma variedade de funções cruciais no corpo humano como produção de energia e regulação de humor e do stress”. Assim, o suplemento acaba por ajudar a reduzir os níveis de cortisol, “a mais conhecida hormona do stress”.
Segundo a médica, vários estudos têm demonstrado “o papel crucial do magnésio na produção de energia celular, no funcionamento muscular e na regulação do sistema nervoso”, o que pode ser um dos motivos do aumento significativo da compra de magnésio nas farmácias portuguesas.
A pouca quantidade de magnésio no organismo das pessoas tem sido um problema crescente e pode ser atribuído a fatores como uma “dieta pobre em magnésio, stress crónico e excesso de cafeína e álcool”, indica Sofia Rocha.
A estudante de Ciências da Comunicação diz que conhece outros universitários que andam "mais cansados e stressados", o que pode ser justificado com "a pressão" de estudar na faculdade. O trabalho e os exames aumentam o stress e o cansaço dos adolescentes, e tudo aliado, diz, conduz a um aumento da ansiedade.
Tal como Inês Ribeiro e Sofia Santos, o Hospital Lusíadas Saúde tem recebido cada vez mais jovens que garantem ter, de acordo com a médica de smart aging e longevidade daquela unidade, “fadiga constante, falta de energia, dificuldade de concentração, lapsos de memória, problemas de sono e sintomas de ansiedade e depressão”.
As causas podem ser, na análise de Sofia Rocha, resultado da “elevada pressão causada por exigências académicas e pressões sociais”. Mas o uso de dispositivos eletrónicos, como smartphones, tablets e computadores, também contribui para a fadiga devido à exposição prolongada à luz azul, o que interfere na qualidade do sono, alerta.
“É na camada jovem onde mais frequentemente se consomem alimentos processados, fast food e bebidas energéticas que não sustentam os níveis de energia a longo prazo", sublinha a médica, que considera, por isso, essencial adotar uma dieta rica em nutrientes para que não haja um défice de alguma vitamina essencial.
Como lidar com o cansaço e o stress
Sofia Rocha destaca a importância de promover a educação nutricional visto que, através da ingestão de frutas, vegetais, grãos integrais e proteínas magras, se consegue garantir os “nutrientes essenciais, incluindo magnésio, crucial para diversas funções do organismo”.
Além da nutrição, esclarece, a gestão do stress deve ser uma prioridade e a “implementação de programas que incluam técnicas de mindfulness, ioga e outras atividades” pode ser uma solução para o problema.
“É importante incentivar limites saudáveis no uso de dispositivos eletrónicos para melhorar a qualidade do sono”, avisa Sofia Rocha. A prática regular de exercício físico é outra medida eficaz sublinhada pela médica para melhorar a qualidade do sono e diminuir os níveis de stress.
Em casos específicos, acrescenta a profissional de smart aging e longevidade, a suplementação de nutrientes pode ser necessária. No entanto, só se deve recorrer a essa opção quando existe uma “deficiência confirmada de um nutriente ou quando a dieta não é suficiente para suprir as necessidades do corpo”.
Por exemplo, esclarece, sintomas como cãibras musculares, fadiga, irritabilidade e distúrbios do sono podem indicar uma escassez de magnésio. Além disso, indivíduos com condições médicas como diabetes, doenças cardiovasculares e problemas gastrointestinais "podem precisar de uma maior ingestão de magnésio e, portanto, beneficiar da suplementação".
À CNN Portugal, Pedro Lôbo do Vale, presidente da Associação Portuguesa de Alimentação Racional e Suplementos Alimentares, alerta que, embora os “alimentos concentrados” sejam frequentemente utilizados pelos jovens para reduzir o cansaço, melhorar a memória e o esforço intelectual, “não substituem uma alimentação saudável”.
Também Ana Mendes do Centro de Informação do Medicamento da Ordem dos Farmacêuticos, reforça a ideia, afirmando que, se for adotada uma “alimentação equilibrada, não existe necessidade de se tomar suplementos”. No caso dos jovens, especialmente na fase de exames, acrescenta, uma alimentação correta deve ser a prioridade, pois os suplementos "podem não produzir os efeitos que os estudantes pretendem”.