Ómicron e vacinação de crianças contra a covid-19 abrandam casos de MIS-C em Portugal. Hospitais sem casos "há várias semanas"

20 jun 2022, 07:00
Vacinação de crianças contra a covid-19 (Manuel Fernando Araújo/Lusa)

Especialistas explicam à CNN Portugal que há vários meses que não são registados casos desta síndrome multissistémica que está associada à covid-19 em crianças, uma doença que, alertam, pode ser fatal

As vacinas contra a covid-19 e as características da variante Ómicron fizeram abrandar os casos de MIS-C em Portugal, a síndrome multissistémica inflamatória associada ao SARS-CoV-2 nas crianças e que teve um aumento de casos durante a propagação da Delta. Especialistas em pneumologia e pediatria garantem à CNN Portugal que há várias semanas que casos graves da doença não são detetados nos hospitais, mesmo com a subida generalizada de infeções durante a sexta vaga.

A presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia Pediátrica e médica no Centro Hospitalar de São João, Maria João Baptista, diz que se verifica “uma franca diminuição” dos casos de MIS-C nos últimos meses e que na sua unidade “não há nenhum caso há várias semanas”. Esta diminuição, explica, tem sido “gradual” e totalmente diferente daquilo que se passou em 2021, ano em que foram internadas 33 crianças com a síndrome, das quais nove estiveram em cuidados intensivos.

Sempre que se dá um novo pico de infeções por covid-19, “normalmente, ele é acompanhado por um aumento de casos de MIS-C”, no entanto, nota Maria João Baptista, “o recrudescimento do número de casos de covid-19, com o fim da obrigatoriedade do uso de máscara e com o aliviar das restrições, não se verificou nos casos de MIS-C”.

Este cenário vai ao encontro de um estudo recente realizado na Dinamarca e que foi publicado a 8 de junho na revista científica JAMA Pediatrics. Nele é descrito que o risco de uma criança sofrer de MIS-C após uma infeção pela variante Ómicron é “substancialmente menor” do que noutras estirpes, como a Delta, e que o perigo de contrair a syndrome multissistémica é “significativamente mais baixo em crianças e adolescentes vacinados, quando comparado com os que não foram vacinados”.

“É a grande força deste estudo”, afirma Manuel Magalhães, pneumologista pediátrico no Centro Materno Infantil do Norte e no Hospital Lusíadas do Porto, que também não regista casos de MIS-C "há bastantes semanas". Para o medico, o trabalho feito na Dinamarca “mostra claramente que a vacina protege e muito contra este MIS-C, uma doença das mais graves que existem”. “O que este estudo mostra é que quem está vacinado tem uma proteçao dez vezes superior à MIS-C do que quem não está”, sublinha.

Por outro lado, o estudo também mostra que a Ómicron produz dez vezes menos casos de MIS-C em crianças não vacinadas. Isto acontece porque, como explica Maria João Baptista, existe uma “menor agressividade por parte da variante”, que é “menos capaz de desencadear uma resposta inflamatória exuberante”.

Risco reduzido em reinfeções

A médica sublinha ainda que há um risco muito mais reduzido de uma criança desenvolver MIS-C durante uma reinfeção por covid-19, porque, “havendo uma nova infeção numa criança, a exposição prévia ao vírus faz com que o sistema imunitário passe a ter memória e torne o desenvolvimento da síndrome muito menos provável”.

Para além das características da Ómicron e da campanha de vacinação, há outras razões pelas quais a MIS-C parece estar a abrandar no país, refere o médico Manuel Magalhães, apontando para o desenvolvimento da imunidade natural e para a “variação sazonal dos fatores ambientais, como a temperatura, a exposição solar e a humidade que influenciam a transmissão do SARS-CoV-2”.

Ainda assim, tanto Maria João Baptista como Manuel Magalhães garantem que a possibilidade de se registar uma subida de casos de MIS-C deve ser tida em conta, já que basta um caso para ser “bastante grave”, assinala o médico do Centro Materno Infantil do Norte, e poder gerar “consequências a longo prazo para crianças que ainda não conhecemos na totalidade”.

Maria João Baptista lembra também que a MIS-C é uma doença em que existe inflamação de diferentes órgãos, “incluindo coração, pulmão, rim, cérebro, pele, olho e órgãos gastrointestinais”, que surge em crianças e adolescentes que foram expostos ao SARS-CoV-2. Não sendo uma doença frequente, acrescenta a presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia Pediátrica, “afetando menos de 1% das crianças infetadas com covid-19”, pode ser muito grave e até fatal. “A literatura diz-nos que até 70% das crianças com MIS-C podem precisar de cuidados intensivos, com uma taxa de mortalidade de entre 1 a 2%”, indica Maria João Baptista.

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