Mulher vestida de palhaço assassinou a esposa do homem com quem depois casou. Caso aconteceu nos Estados Unidos e durou décadas a investigar
Esta história tem quatro datas essenciais: 1990, o crime; 2017, a detenção; 2023, a confissão; 2024, a libertação. É entre estas datas que se enrola e depois desenrola um crime hediondo – e uma história macabra.
Sheila Keen-Warren, hoje com 61 anos (na foto acima em 2023), foi libertada da prisão nos Estados Unidos este sábado, apenas 18 meses depois de ter confessado matar a tiro em 1990 uma mulher, Marlene Warren. Segundo a AP, Sheila Keen-Warren foi condenada a 12 anos de prisão, mas uma vez que já estava detida desde 2017, acabou por sair ao fim de um ano e meio por bom comportamento.
“Sheila Keen-Warren será sempre uma assassina condenada e terá essa mancha todos os dias para o resto da sua vida”, disse o procurador-geral do Condado de Palm Beach, Dave Aronberg, numa declaração citada pela AP.
O palhaço assassino
Marlene Warren estava a terminar o pequeno-almoço com o filho e os seus amigos quando, a 26 de maio de 1990, um Chrysler LeBaron branco estacionou na entrada da sua casa nos arredores de West Palm Beach, na Florida, EUA. Uma pessoa vestida de palhaço saiu então do carro com dois balões e um arranjo de flores. Quando Warren atendeu a porta, o palhaço entregou-lhe os presentes. “Warren disse algo como: 'Que bom'”, relatou então a detetive Paige McCann, do Gabinete do Xerife do Condado de Palm Beach.
O palhaço sacou então de uma arma, deu um tiro na cara de Warren, voltou para o carro e foi-se calmamente embora.
Warren morreu dois dias depois num hospital.
Prisão décadas depois
Na altura, os investigadores disseram que tinham identificado um suspeito, mas que não tinham provas suficientes para uma condenação. Até 2017, não foi efetuada qualquer detenção no caso do assassínio descarado.
Sheila Keen, que se casou com o marido da mulher assassinada 12 anos após o crime, foi nesse ano detida em Abingdon, Virgínia, uma cidade montanhosa a mais de 800 quilómetros do local do assassínio.
Keen, que tinha 54 anos na altura da detenção, foi acusada de homicídio em primeiro grau pelo assassínio de Warren 27 anos antes. Ela começou por renunciar à extradição para a Flórida, e os promotores estavam por anunciar se iriam pedir pena de morte assim que ela retornasse ao estado.
Casou com o marido da vítima
Durante anos, não houve desenvolvimentos no caso. Até que, em 2014, a unidade de casos arquivados do Gabinete do Xerife do Condado de Palm Beach reabriu a investigação.
As autoridades localizaram testemunhas, voltaram a entrevistá-las e examinaram provas utilizando tecnologia de ADN não disponível em 1990.
Os detetives apuraram então que a suspeita casara com Michael Warren, o viúvo da vítima, em 2002. Quando os detetives começaram a investigar o homicídio, ouviram rumores de que a suspeita estava a ter um caso com Michael Warren.
Na altura, Michael Warren e Keen negaram ter um caso.
Eles estavam juntos num carro quando ela foi presa em 2017, disse então Fred Newman, xerife do condado de Washington, Virgínia.
O Miami Herald noticiou na altura que a suspeita costumava gerir um negócio de recuperação de automóveis no sul da Florida. Michael Warren era um dos seus clientes e geria o seu próprio negócio de carros usados e de aluguer, segundo o jornal.
Antes da sua detenção, o casal viveu durante vários anos em Abingdon e nas proximidades de Kingsport, Tennessee, segundo as autoridades.
Avanços tecnológicos
Os investigadores do condado de Palm Beach não quiseram na altura dar mais pormenores sobre o caso, afirmando que a investigação estava em curso. Mas disseram que tinham apurado que os balões e as flores tinham sido comprados no dia do crime numa mercearia perto da residência da suspeita.
O xerife do condado de Palm Beach, Rick Bradshaw, disse em 2017 que os avanços nas provas de ADN tinham ajudado a encerrar o caso. Em 1990, as provas não eram suficientemente fortes para garantir uma condenação, disse. As fibras de laranja e o cabelo castanho encontrados no carro terão ajudado a encontrar o assassino.
“Lembram-se dos dias em que tínhamos telemóveis (...) que pareciam um tijolo, e agora temos smartphones em que se pode fazer tudo”, disse. “Essa é a diferença entre a tecnologia da altura em que isto aconteceu e a atual. É exponencialmente muito melhor para nos ajudar a ter a certeza de que temos a pessoa certa.”
“Eu tinha fé”
A mãe da vítima, Shirley Twing, disse em 2017 que sempre acreditara que seria efetuada uma detenção no caso da morte da filha. “Fiquei um pouco chocada. ... Às vezes apetece-me chorar quando falo sobre isso”, disse Twing à WPTV, filial da CNN. “Eu tinha fé... nunca desisti, sabe?”, disse ela, agradecendo aos investigadores pelo seu trabalho.
Joseph Ahrens, filho da vítima, disse à CNN que estava grato pelo progresso no caso arquivado. “Penso que demoraram tanto tempo a efetuar uma detenção porque queriam ter a certeza de que tinham a pessoa certa”, disse.
Mulher confessou mas negou crime
Foi em 2023 que a mulher se declarou culpada, em tribunal, mesmo apesar de os seus advogados defenderem a sua inocência.
Sheila Keen-Warren, na altura com 59 anos, retirou então a sua anterior declaração de inocência e declarou-se culpada, no âmbito de um acordo com o Ministério Público, poucas semanas antes de o caso ir a julgamento: declarou-se culpada de homicídio em segundo grau no caso da morte de Marlene Warren.
O acordo aconteceu, segundo disseram os seus advogados, para evitar uma possível condenação à morte. Como parte do seu acordo de confissão, Warren foi condenada a 12 anos de prisão, com crédito pelo tempo que já tinha tem estado a cumprir desde a sua detenção.
O filho da vítima aprovou então os termos do acordo, disse na altura o promotor Reid Scott no tribunal.
“Depois de anos a professar a sua inocência, Sheila Keen Warren foi finalmente forçada a admitir que foi ela que se vestiu de palhaço e tirou a vida a uma vítima inocente”, afirmou em 2023 o Procurador-Geral do Condado de Palm Beach, Dave Aronberg, num comunicado. O advogado de Keen-Warren, no entanto, disse na ocasião à CNN que ela mantinha a sua inocência, mas estava feliz com os termos do acordo.
“Esta mulher nunca deveria ter sido presa ou processada”, disse o seu advogado Greg Rosenfeld, “Ela estava ansiosa pelo seu dia no tribunal”. Em última análise, disse Rosenfeld, o acordo foi a melhor opção disponível para Keen-Warren. “Nunca se sabe o que pode acontecer num julgamento”, afirmou então.
Se o caso tivesse ido a julgamento, disse Scott no tribunal, as provas apresentadas pelos promotores “levariam o júri a considerá-la culpada do crime”.