Relatos vão desde homens a masturbarem-se a comentários obscenos e tentativas de abordagem
Peregrinas que percorrem sozinhas os Caminhos de Santiago estão a relatar experiências "aterrorizantes" de assédio sexual em áreas quase desertas de Espanha, Portugal e França, segundo uma investigação do jornal britânico The Guardian.
Em entrevistas ao The Guardian, nove mulheres descreveram como foram alvo de assédio durante os últimos cinco anos, com relatos que vão desde homens a masturbarem-se a comentários obscenos e a tentativas de abordagens em veículos. Muitas destas mulheres afirmam ter-se sentido em perigo durante a peregrinação.
A maioria dos incidentes ocorreu em zonas isoladas, onde as peregrinas estariam mais vulneráveis. Sete das mulheres entrevistadas revelam terem encontrado homens a masturbar-se, sendo que uma delas chegou a ser perseguida. Os casos ocorreram em Espanha e Portugal.
Lorena Gaibor, fundadora do fórum online Camigas, diz-se chocada mas não surpreeendia com os relatos de assédio. "O assédio sexual é endémico nos Caminhos. Parece muito comum. Durante todo o ano recebemos relatos de mulheres que passam pelas mesmas coisas”, lamentou.
O caso de Rosie, uma peregrina de 25 anos, aconteceu em Portugal, no início do verão. Caminhava numa zona de floresta quando se deparou com um homem sem calças e a masturbar-se enquanto a observava. "Foi assustador. Senti-me completamente sozinha naquele momento”, contou Rosie, que pediu para ser identificada apenas pelo primeiro nome.
“Os Caminhos são incríveis, porque são tão difíceis, tão desafiadores, fisicamente como mentalmente”, acrescentou. “Mas há esse elemento extra que as mulheres caminhantes enfrentam, esse problema de segurança enorme, que afeta toda a sua capacidade de enfrentar os desafios da peregrinação ou aproveitá-lo da mesma maneira que outras pessoas.”
O perfil dos peregrinos dos Caminhos de Santiago está a mudar, com as mulheres cada vez mais presentes. Em 2023, o número de peregrinas atingiu um recorde histórico, representando mais de 53% do total de caminhantes. "Mais de 230.000 mulheres fizeram os Caminhos no ano passado, e muitas delas não hesitaram em fazê-lo", indicou Pedro Blanco, representante do governo espanhol na Galiza.
A jornalista e escritora feminista Marie Albert, citada pelo jornal britânico, é uma das muitas críticas da falta de debate sobre a segurança das peregrinas nos Caminhos de Santiago. Durante a sua jornada de 700 km em 2019, Albert enfrentou uma série de agressões que marcaram profundamente a sua experiência. Um homem tentou beijá-la à força, outro expôs-se de forma obscena e outros assediaram-na verbal e fisicamente. A sensação de ser perseguida por alguns desses agressores, que também eram peregrinos, deixou-a em constante estado de alerta e medo.
Das nove mulheres que falaram com o Guardian, seis relataram os incidentes à polícia. Em apenas um caso, o perpetrador foi localizado e processado.
Em Espanha, a Guardia Civil intensificou as patrulhas em várias rotas.