Em dez anos, o salário médio dos portugueses só aumentou para os menos qualificados

21 jun 2022, 00:00
Trabalho

Relatório "Estado da Nação 2022", divulgado pela Fundação José Neves, faz um retrato da situação do país ao nível do emprego e da educação. O documento revela que os rendimentos em Portugal são dos mais baixos da União Europeia e que os trabalhadores com formação universitária registaram perdas acentuadas de salários na última década

Nos últimos dez anos, o salário médio dos portugueses aumentou apenas para os trabalhadores com o ensino básico, com uma subida na ordem dos 5% e muito por força do aumento do salário mínimo. Esta é uma das principais conclusões do relatório “Estado da Nação 2022”, divulgado esta terça-feira pela Fundação José Neves - instituição criada por José Neves, fundador da Farfetch. O documento faz um retrato do país ao nível do emprego e da educação, com um balanço dos avanços e recuos registados entre 2011 a 2019.

O documento revela que, neste período, os trabalhadores com ensino superior registaram perdas reais nos salários de 11% e os portugueses com o ensino secundário sofreram perdas de 3%. No caso dos trabalhadores mais jovens, as quedas foram ainda mais acentuadas para quem tem o ensino superior – o salário dos licenciados diminuiu 15%, o dos mestres cerca de 12% e o dos doutorados 22%.

Mais, o relatório destaca que os salários em Portugal estão mesmo na cauda dos salários da União Europeia. Para se ter uma ideia, em 2019 os trabalhadores portugueses com formação superior ganhavam menos do que os trabalhadores que tinham apenas o ensino secundário em 13 países da UE (Itália, Chipre, Irlanda, Finlândia, França, Malta, Bélgica, Países Baixos, Suécia, Dinamarca, Alemanha, Áustria, Luxemburgo) e do que os trabalhadores menos qualificados em cinco Estados europeus (Finlândia, Áustria, Países Baixos, Dinamarca e Luxemburgo).

O rendimento anual médio líquido em Portugal, em 2019, era de 13.727 euros, o 7.º mais baixo da UE. E se analisarmos apenas os salários dos trabalhadores com ensino superior, o rendimento médio não ultrapassava os 19.755€, o 8.º mais baixo da UE.

Ainda assim, as conclusões do estudo são claras: a educação compensa. Mais qualificações aumentam a probabilidade de os portugueses garantirem emprego e de auferirem rendimentos mais elevados.

Portugal é um dos países da UE com a produtividade mais baixa

Por outro lado, o relatório indica que a produtividade tem perdido terreno face à média europeia e que Portugal está mesmo entre o grupo de países da UE nos quais este indicador é mais baixo. Em 2019, era o 6.º país com menor produtividade, apenas acima de países como a Roménia, Polónia, Letónia, Grécia e Bulgária.

É certo que as qualificações contribuem para um aumento da produtividade e que os jovens são cada vez mais qualificados, mas o documento indica que, na prática, a produtividade só aumenta quando os jovens representam mais de 40% do total dos trabalhadores de uma empresa. O investimento na formação dos trabalhadores tende a aumentar a produtividade, mas poucas empresas fazem essa aposta seja por causa dos custos associados, seja pela falta de tempo. 

Além disso, na questão da produtividade, há outro fator a ter em conta: as qualificações dos gestores pesam quase tanto como as dos trabalhadores e a maior percentagem dos empregadores em Portugal não terminou o ensino secundário. Em 2021, este era o caso de 47,5% dos empregadores portugueses, um valor que é praticamente o triplo da média europeia - que se fixou em 16,4%.

Como a covid-19 mudou o emprego em Portugal

O relatório “Estado da Nação 2022” destaca ainda os efeitos da pandemia no emprego, sublinhando que os jovens foram os mais afetados pela crise sanitária. A pandemia de covid-19 não só eliminou milhares de empregos, como dificultou a entrada dos mais novos no mercado de trabalho. Em 2021, apenas 74% dos jovens entre os 20 e os 34 anos que tinham completado um nível de escolaridade nos últimos três anos estavam empregados, uma queda acentuada face a 2019 e que interrompe a tendência positiva que se vinha a verificar desde 2012.

A própria estrutura do emprego mudou com a covid-19: há setores em que o emprego aumentou - nas atividades mais ligadas à tecnologia e ao conhecimento - enquanto que noutros diminuiu – as atividades menos tecnológicas e setores como a energia e a eliminação de resíduos.

Por outro lado, o teletrabalho também veio para ficar em algumas áreas como a informação e a comunicação, nos serviços financeiros e de seguros e nas atividades de consultoria, científicas e técnicas. Ainda assim, o teletrabalho é um fenómeno que tem mais expressão nas zonas urbanas, com destaque para a Área Metropolitana de Lisboa  

O relatório da Fundação José Neves traça algumas metas para o país, até 2040, apontando a educação e a produtividade como “dois desígnios críticos”, que estão interligados. “É fundamental aumentar a produtividade de forma a melhorar os salários, aumentar o ganho salarial associado a mais educação, assegurar que há incentivos à educação e garantir um futuro mais próspero para Portugal e para os portugueses. É necessário garantir o aproveitamento ótimo das qualificações existentes, continuar a apostar nas qualificações dos mais jovens, na requalificação dos adultos com baixa escolaridade e que o mercado acompanhe o esforço de qualificações das gerações mais jovens”, lê-se no documento.

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