Um miúdo de 19 anos, um Nobel da Paz, um jornalista (que ainda quer entrevistar Putin), uma pacifista que colou autocolantes num supermercado. O quem é quem da maior troca de presos políticos entre a Rússia e o Ocidente desde a Guerra Fria

2 ago, 18:18
De cima para a esquerda: o jornalista americano Evan Gershkovich, o antigo fuzileiro americano Paul Whelan, o ativista da oposição russa Vladimir Kara-Murza e a jornalista russo-americana Alsu Kurmasheva (CNN)

Rússia e Bielorrússia aceitaram libertar 16 ativistas, dissidentes e jornalistas de várias nacionalidades detidos nos últimos anos sob acusações de "extremismo", "espionagem" e "traição à pátria". Em troca, EUA e um punhado de países alemães vão libertar oito pessoas presas por homicídio, espionagem e cibercrimes no Ocidente

Foi a maior troca de prisioneiros entre a Rússia e os Estados Unidos da era pós-soviética, num total de 24 pessoas libertadas de prisões nos dois países, na Bielorrússia e em quatro países europeus, incluindo o jornalista do Wall Street Journal Evan Gershkovich e Paul Whelan, um dos estrangeiros que mais tempo passou atrás das grades na Rússia.

Na madrugada desta sexta-feira, Gershkovich, Whelan e a jornalista russo-americana Alsu Kurmasheva aterraram na base aérea de Andrews, no Maryland, Estados Unidos, onde foram recebidos pelo presidente Joe Biden e a vice-presidente, Kamala Harris, antes de reencontros emocionados com as suas famílias. 

Nos próximos dias espera-se a libertação dos restantes prisioneiros, alguns para os EUA, outros para a Alemanha, incluindo a de Oleg Orlov, um dissidente russo de 71 anos, dos mais velhos presos políticos do país, que foi laureado com o Nobel da Paz há dois anos. Em troca, EUA, Alemanha, Eslovénia, Noruega e Polónia aceitaram libertar um total de oito pessoas com ligações ao Kremlin.

Entre elas contam-se Vadim Krasikov e Vadim Konoshchenok, dois dos mais notórios prisioneiros russos no Ocidente – o primeiro condenado a perpétua na Alemanha por matar "ao estilo execução" um ex-combatente checheno num dos maiores parques públicos de Berlim, “em plena luz do dia”; o segundo por operar um esquema que terá permitido a Moscovo contornar as sanções económicas impostas pelo Ocidente após a invasão em larga escala da Ucrânia há mais de dois anos.

DEVOLVIDOS À RÚSSIA

Vadim Krasikov, 58 anos

O Kremlin estava há anos a tentar garantir a libertação de Krasikov (CNN)

Um ex-coronel de alta patente do FSB, estava a cumprir uma pena de prisão perpétua na prisão na Alemanha pelo homicídio do ex-combatente checheno Zelimkhan “Tornike” Khangoshvili em 2019, no Kleiner Tiergarten, em Berlim.

Krasikov era um dos mais notórios presos russos do Ocidente que Moscovo queria ver libertados. Em 2022, o Kremlin pediu que fosse libertado juntamente com Viktor Bout, um negociador de armas russo que estava a cumprir uma pena de 25 anos de prisão nos EUA, em troca da libertação de Whelan e da estrela da WNBA Brittney Griner – levando inclusivamente Moscovo a rejeitar libertar Whelan quando percebeu que Krasikov não seria libertado há dois anos, apesar de a administração Biden ter proposto a libertação de uma série de outras pessoas em troca dele.

No início deste ano, um dos principais conselheiros de Alexey Navalny disse que o líder da oposição russa estava a dias de ser libertado em troca de Krasikov, pouco antes de ter morrido, em fevereiro, sob circunstâncias ainda por apurar numa colónia penal russa. Esses planos nunca foram oficialmente confirmados.

Segundo o tribunal alemão que condenou o checheno em 2021, Krasikov agiu em nome do Estado russo quando “executou” Khangoshvili em "plena luz do dia", um homem que, depois de lutar contra as forças russas nas guerras da Chechénia, se instalou na Geórgia, onde sobreviveu a várias tentativas de assassínio.

Na lista dos mais procurados da Rússia, sob acusações de terrorismo, a CNN Internacional descreve-o como uma particular pedra no sapato de Ramzan Kadyrov, o líder checheno que é um dos grandes aliados de Putin. Matthew Chance, correspondente internacional do canal, diz que esta troca de prisioneiros envolveu o Ocidente "pagar um preço alto", como ter agora Krasikov em liberdade.

Vadim Konoshchenok, 48 anos

Alegado espião do FSB, Konoshchenok tinha acabado de ser extraditado da Estónia para os EUA (CNN)

O cidadão russo com alegadas ligações ao FSB tinha acabado de ser extraditado da Estónia para os Estados Unidos no início deste mês, onde enfrentava acusações de conspiração pelo papel que desempenhou num esquema global de aquisições e branqueamento de capitais – segundo a procuradoria de Nova Iorque, em nome do governo russo.

Em comunicado, a procuradoria distrital adianta que Konoshchenok é suspeito de fornecer ao exército da Rússia equipamento eletrónico e munições de fabrico americano, violando as restrições às exportações dos EUA para Moscovo e as sanções económicas impostas pelo Ocidente.

De 2017 até à primavera de 2022, Konoshchenok e outros seis cidadãos russos (Yevgeniy Grinin, Aleksey Ippolitov, Boris Livshits, Svetlana Skvortsova, Vadim Yermolenko e Alexey Brayman) criaram empresas-fachada, moradas falsas e etiquetas contrafeitas para transportar o equipamento para a Rússia.

Vladislav Klyushin, 43 anos

Detido na Suíça há três anos, o empresário russo foi condenado a nove anos de prisão nos EUA por ciberfraude (CNN)

O empresário russo tinha sido condenado no ano passado por um tribunal de Boston a nove anos de prisão pelo que as autoridades norte-americanas dizem ter sido “um elaborado esquema” de transação de títulos com base em informações confidenciais de empresas, informações essas roubadas de redes informáticas norte-americanas – o esquema ter-lhe-á rendido cerca de 93 milhões de dólares (quase 86 milhões de euros).

Batizado por um canal americano com o cognome "o comerciante de Putin", Klyushin foi detido em Sion, na Suíça, em março de 2021. Tinha sido extraditado para os EUA em dezembro de 2021, onde a par da sentença de nove anos de prisão foi ainda condenado a devolver mais de 34 milhões de dólares (31,4 milhões de euros) em bens confiscados.

Roman Seleznev, 40 anos

Imagem não datada do hacker russo cedida pelo Departamento de Estado norte-americano aos media (CNN)

Hacker condenado por pirataria e fraude com cartões de crédito, conhecido pelos nomes de código Track2, Bulba e Ncux 3, Seleznev estava a cumprir uma pena de 27 anos de prisão nos EUA. 

Como Krasikov, esteve para ser libertado em troca de Griner e Bout há dois anos. Detido nas Maldivas em 2014, foi extraditado para os EUA, onde foi condenado em abril de 2017 por pirataria informática em computadores à venda em lojas para roubar e vender números de cartões de crédito ao submundo do crime.

Em novembro do mesmo ano, foi ainda condenado a 14 anos de prisão por um esquema de ciberfraude avaliado em 50 milhões de dólares e por ter defraudado bancos em 9 milhões de dólares através desse esquema.

"Por um lado, é difícil imaginar qualquer crime cibernético não-violento que valha 27 anos na prisão", referia um podcast de cibercrime há um ano, num episódio dedicado ao hacker russo. "Mas então qual seria a sentença apropriada para um homem como Seleznev?"

Artem Dultsev e Anna Dultseva (idades desconhecidas)

Edifício a partir de onde Artem Viktorovich Dultsev e Anna Valerevna Dultseva operavam na capital eslovena antes de terem sido detidos sob acusações de espionagem (Darko Bandic/AP)

Artem Dultsev é um espião russo que vivia à paisana na Eslovénia, onde se fez passar por um empresário do setor tecnológico chamado Ludvig Gish, casado com a espia Anna Dultseva, que se fazia passar por Maria Rosa Mayer Munos, uma negociadora de arte e dona de uma galeria - um suposto casal argentino que falava espanhol com os dois filhos.

Na quarta-feira, um dia antes da sua libertação nesta troca de prisioneiros, tinham acabado de se declarar culpados de espionagem num tribunal de Ljubljana e sido condenados a mais de um ano e meio de prisão (um período já cumprido em prisão preventiva).

Em comunicado, o tribunal esloveno adiantou que o casal aguardava deportação para a Rússia e que ficava proibido de entrar na Eslovénia por um período de cinco anos.

Mikhail Mikushin (idade desconhecida)

Espião russo detido na Noruega em 2022, onde se faz passar por um investigador académico brasileiro instalado na Universidade de Tromsø, no Círculo do Ártico.

Pavel Rubtsov (idade desconhecida)

Espião russo que vivia na Polónia também sob uma falsa identidade, dizendo ser um jornalista espanhol chamado Pablo Gonzales. Segundo a agência de notícias polaca, foi desmascarado e detido em fevereiro de 2022.

DEVOLVIDOS AOS EUA

Evan Gershkovich, 32 anos

Gershkovich aterrou nos EUA na madrugada desta sexta-feira juntamente com outros dois presos políticos libertados pela Rússia (AP)

O jornalista do Wall Street Journal trabalhava como correspondente do jornal americano em Moscovo quando, em março de 2023, as forças de segurança russas o detiveram sob acusações de espionagem. A procuradoria russa acusou-o de “recolher informações secretas” numa “missão da CIA” sobre uma infraestrutura militar do país, a fábrica de Uralvagonzavod, onde são produzidos carros de combate e outro armamento bélico, em Nizhny Tagil, na região de Yekaterinburg.

A Casa Branca manteve sempre que as acusações eram fabricadas e declarou que foi detido injustamente, o que legalmente obriga o governo dos EUA a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para o libertar. Foi o primeiro jornalista norte-americano a ser detido e formalmente acusado de espionagem na Rússia desde a Guerra Fria. 

Num julgamento à porta fechada, entre junho e meados de julho, sem que ninguém tivesse acesso às alegadas provas que o incriminavam, Gershkovich foi condenado a 16 anos de prisão na Rússia. Semanas antes de noticiada a sentença, o porta-voz de segurança nacional da Casa Branca, John Kirby, voltou a garantir que “Evan nunca foi empregado do governo dos Estados Unidos, não é um espião – o jornalismo não é um crime”.

Como parte das formalidades para ser libertado da prisão, Gershkovich recebeu uma caneta dos guardas para escrever um pedido formal de clemência dirigido a Vladimir Putin. No final do formulário, o jornalista acrescentou outro pedido: se o presidente russo aceitaria ser entrevistado por ele.

Paul Whelan, 54 anos

O ex-fuzileiro naval dos EUA estava preso na Rússia desde 2018 sob acusações de espionagem (AP)

Um fuzileiro naval tornado executivo de uma empresa de segurança, com cidadania americana, canadiana, britânica e irlandesa, Whelan estava detido na Rússia desde 2018, fazendo dele um dos americanos que mais tempo passou numa prisão russa. Foi detido pelos serviços de segurança federais da Rússia sob acusações de espionagem no final desse ano, durante uma visita ao país para um casamento.

Sergei Lavrov, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, disse então que Whelan fora apanhado “em flagrante delito” numa missão de espionagem focada na recuperação de uma pen com informações confidenciais e sensíveis. O seu advogado disse que Whelan recebeu o dispositivo “involuntariamente” durante a viagem.

Tal como com Gershkovich, a Casa Branca declarou que o empresário foi detido injustamente e esteve a trabalhar até esta semana para o libertar de uma colónia penal russa, para onde foi enviado em 2020, após ter sido condenado a 16 anos de trabalhos forçados.

Alsu Kurmasheva, 47 anos

Editora da Radio Free Europe/Radio Liberty, Kurmasheva tinha sido condenada a seis anos de meio de prisão por um tribunal russo no mês passado (AP)

No mesmo dia em que Gershkovich conheceu a sua sentença, um tribunal russo condenou a jornalista russo-americana, editora da Radio Free Europe/Radio Liberty, a 6 anos e meio de prisão por “espalhar falsas informações” sobre o exército russo.

Natural da república russa do Tartaristão, a mais de 960 quilómetros a leste de Moscovo, vivia com o marido, Pavel Butorin, e as duas filhas adolescentes,  há mais de duas décadas em Praga. Foi detida em junho de 2023 na Rússia, onde tinha ido visitar a mãe doente. Os seus dois passaportes foram confiscados, o que a impediu de regressar à Chéquia.

Enquanto esteve detida, o marido e as filhas enviaram-lhe postais, mas as respostas foram sendo cada vez menos e cada vez mais censuradas, denunciou a família.

Vladimir Kara-Murza, 42 anos

Ignorando os apelos dos amigos para não regressar à Rússia, a figura da oposição foi detida dois meses depois da invasão em larga escala da Ucrânia sob acusações de "traição à pátria" (CNN)

Uma das mais conhecidas figuras da oposição russa, Kara-Murza tinha ignorado os apelos de amigos e regressado ao país-natal em abril de 2022, onde foi detido por criticar a invasão russa da Ucrânia em discursos nos Estados Unidos e formalmente acusado de traição à pátria. Colunista convidado do “Washington Post”, o opositor de Vladimir Putin rejeitou as acusações como “infundadas, ilegais e politicamente motivadas”.

A partir da prisão, continuou a sua campanha contra o presidente russo e a guerra no país vizinho, com recurso à sua coluna de opinião no jornal norte-americano. Antes de ter sido detido e condenado a 25 anos de prisão, foi alvo de duas tentativas de envenenamento (acredita ele às mãos da Rússia), desenvolvendo um problema neurológico conhecido como polineuropatia, o que o colocava em risco de morrer na prisão.

Num dos seus mais recentes artigos de opinião, sob o título “Não sou um agente estrangeiro”, escrevera que enfrentava mais acusações cumulativas aos 25 anos de prisão que já estava a cumprir na Rússia – “parece que o Estado russo ainda não terminou a sua tarefa comigo”.

DEVOLVIDOS À ALEMANHA

Lilia Chanysheva, 42 anos

No tribunal que, há um ano, a condenou por "extremismo", pelas suas ligações ao partido de Alexei Navalny, Chanysheva disse estar a ser alvo de um "julgamento político" (CNN)

Aliada de Navalny, liderava o gabinete regional da oposição em Bascortostão, uma região russa com 4 milhões de habitantes, e foi condenada sob acusações de “extremismo” num julgamento à porta fechada no ano passado.

Ex-funcionária das empresas internacionais de contabilidade PricewaterhouseCoopers e Deloitte, nas suas sucursais em Moscovo, Chanysheva acabou por regressar a Bascortostão para denunciar a corrupção local em vídeos que acabariam por se tornar virais.

Também foi impedida de se candidatar a um cargo local e perseguida por agentes das forças de segurança durante a campanha.

Em tribunal, disse-se vítima de um “julgamento político” e pediu clemência ao juiz, para ter a oportunidade de ser mãe. “Se me puserem na prisão durante 12 anos, [quando for libertada] serei demasiado velha para ter um filho.” O juiz condenou-a a 7 anos e meio de prisão, uma pena que, em abril deste ano, foi prorrogada por mais dois anos.

Ksenia Fadeyeva, 32 anos

Fadeyeva candidatou-se ao conselho municipal de Tomsk nas eleições regionais russas de 2020, na cidade siberiana onde Alexei Navalny sobreviveu a uma tentativa de envenenamento antes de morrer em fevereiro sob circunstâncias ainda por apurar numa colónia penal russa (Alexander Nemenov/ AFP via Getty Images)

Dissidente que se juntou ao líder da oposição Alexei Navalny para “mudar a Rússia”, Fadeyeva tinha declarado, numa entrevista ao Washington Post em 2021, a partir da cidade siberiana de Tomsk: “Amo o meu país, mas sei que há algo de errado aqui.”

Chefe da equipa de Navalny naquela cidade, esteve com o líder da oposição em agosto de 2020, quando o ajudou a preparar um vídeo político horas antes de ele ter sido envenenado com um agente químico nervoso num hotel da cidade onde estava a ficar, sobrevivendo por um triz.

Fadeyeva tinha sido detida em dezembro de 2021 após as autoridades russas terem ilegalizado o partido de Navalny, classificando-o de “extremista”.

Em dezembro do ano passado, foi condenada a nove anos de prisão por “extremismo”, a par do líder da oposição, que acabaria por morrer numa colónia penal em fevereiro.

Oleg Orlov, 71 anos

Um dos diretores do grupo de direitos humanos russo Memorial, Orlov passou o seu julgamento a ler "O Julgamento" de Franz Kafka (Natalia Kolesnikova/AFP/Getty Images via CNN Newsource) 

Um dos mais velhos presos políticos da Rússia, o ativismo do dissidente remonta aos tempos soviéticos, quando imprimiu e distribuiu ilegalmente panfletos de oposição à guerra da URSS no Afeganistão. 

Codiretor da organização de direitos humanos Memorial, uma das mais famosas da Rússia, foi laureado com o Prémio Nobel da Paz em 2022, depois de ter sido formalmente acusado de “desacreditar” o exército russo num artigo publicado no início desse ano em jornais franceses, no qual criticava a guerra na Ucrânia.

Orlov recusou-se a participar ativamente no seu próprio julgamento, optando por ficar sentado no tribunal a ler “O Julgamento”, um dos mais famosos romances de Franz Kafka, sobre o desespero de um homem preso e executado sem ter feito nada de errado e sem nunca conhecer as acusações que enfrentava em tribunal.

No final, proferiu um discurso no qual declarou que, ao contrário do protagonista do livro de Kafka, “sabemos qual a verdadeira razão para sermos detidos, julgados, presos, condenados e mortos – estamos a ser punidos porque nos atrevemos a criticar as autoridades”.

Ilya Yashin, 41 anos

Ilya Yashin numa das famosas "jaulas de vidro" dos tribunais russos durante uma audiência judicial no distrito de Meshchansky, em Moscovo, a 9 de dezembro (Yuri Kochetkov/Reuters)

Outra das figuras-maiores da oposição russa, Yashin era próximo de Alexei Navalny e de Boris Nemtsov, outro opositor do Kremlin, assassinado em 2015. Quando foi condenado a oito anos e meio de prisão por criticar a guerra da Rússia na Ucrânia, em dezembro de 2022, disse ao tribunal: “Não me arrependo de nada”.

Na prisão, foi colocado em “celas de castigo” várias vezes, mas conseguiu manter comunicações com o exterior através dos seus advogados, que foram fazendo publicações nas redes sociais em seu nome.

Uma semana antes de ter sido libertado, numa dessas publicações, contou a história de um parceiro de cela cujo pai se voluntariou para lutar na Ucrânia e que foi ferido duas vezes, antes de desaparecer numa das linhas da frente dos combates – “O inferno que nunca deveria ter existido. Uma guerra que nunca deveria ter começado.”

Kevin Lik, 19 anos

Nascido e criado na Alemanha, é um dos mais jovens prisioneiros russos acusados de traição. Lik viveu em Colónia até aos 12 anos, quando a mãe, de nacionalidade russa, se mudou com ele para Maikop, no sul do país.

Antes de chegar à maioridade, foi detido pelos serviços de segurança federais russos por fotografar instalações militares na região. Isso aconteceu no final de 2021, meses antes de Putin ordenar a invasão em larga escala da Ucrânia, no final de fevereiro do ano seguinte.

Foi condenado num julgamento à porta fechada a quatro anos de prisão por alegada “traição”.

Rico Krieger, 30 anos

Imagem de um vídeo divulgado pelos serviços de segurança russos que mostra Krieger a ser levado para um aeroporto nos arredores de Moscovo na quinta-feira (Serviços de Segurança Federais da Rússia/RTR via AP)

Dois dias antes de Krieger ser incluído na troca de prisioneiros, o presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko, fez um anúncio surpresa: ia perdoar o cidadão alemão acabado de ser condenado à morte no país sob acusações de terrorismo.

Na semana anterior, uma entrevista na televisão estatal bielorrussa (“altamente coreografada”, destaca o Washington Post) foi transmitida na televisão estatal. Durante 17 meses, confessava ter colocado explosivos perto de uma linha ferroviária russa no ano passado, a mando dos Serviços de Segurança da Ucrânia, que – disse – também lhe pediram para fotografar locais militares.

Como os julgamentos de outros nomes incluídos nesta lista, também o de Krieger ocorreu à porta fechada, sem cobertura mediática independente e sem apresentação de provas públicas.

O perdão inesperado pela mão de Lukashenko, um dos maiores aliados de Putin, ocorreu em resposta a um pedido formal de clemência feito horas antes pelo detido.

Dieter Voronin, 45 anos

Cientista político com dupla nacionalidade alemã e russa, foi detido em 2021 durante uma operação policial ligada às acusações de traição a Ivan Safronov, um jornalista de investigação em tempos conselheiro do diretor da agência espacial russa.

Safronov foi, segundo o seu advogado, acusado pelos investigadores russos de vender a Dieter Voronin, por 248 dólares, informações sobre o pessoal militar da Rússia instalado na Síria em 2015. Segundo as acusações das autoridades russas, Voronin também passou ao jornalista informações sobre funcionários de uma universidade de Zurique e dos serviços de informação externos da Alemanha (BND).

Segundo uma notícia do jornal de negócios russo Kommersan, o cientista político ter-se-á declarado culpado das acusações antes de optar por uma declaração de inocência. Acabaria por ser condenado a mais de 13 anos de prisão em 2022, com Safronov condenado a 22 anos.

Patrick Schobel, 38 anos

Como a basquetebolista americana Brittany Griner, o alemão Patrick Schobel foi detido num aeroporto russo sob acusações de tráfico de droga por transportar uma pequena quantidade de gomas de canábis (Andrei Bok/SOPA Images/LightRocket via Getty Images)

O seu caso é em tudo semelhante ao da atleta norte-americana Brittney Griner: foi detido no aeroporto internacional de Pulkovo, em São Petersburgo, quando agentes aduaneiros encontraram seis gomas de canábis na sua bagagem. Foi formalmente acusado de tráfico de droga, enfrentando pelo crime uma sentença de até sete anos de prisão na Rússia.

O alemão foi detido a 14 de fevereiro, apenas cinco dias depois de Putin ter manifestado interesse em libertar alguns presos políticos em troca de Vadim Krasikov durante uma já famosa entrevista com o apresentador conservador norte-americano Tucker Carlson.

Juntamente com o caso da basquetebolista americana, a detenção de Schobel fez disparar os receios de que a Rússia estava a aumentar o número de detenções de cidadãos estrangeiros para os usar como moedas de troca - como agora.

German Moyzhes, 39 anos

Advogado russo-alemão, à data em que foi detido em São Petersburgo, no final de maio deste ano – sob acusações de traição à pátria num caso que nunca foi tornado público – Moyzhes trabalhava como sócio-gerente de uma empresa de consultoria que ajudava cidadãos russos a obter vistos de residência na Europa.

Segundo a agência russa Tass, foi um dos fundadores de um movimento de ciclistas em São Petersburgo e diretor de uma organização que desenvolvia infraestruturas para ciclistas na cidade. A Reuters adianta que cresceu sobretudo na Alemanha, antes de ter regressado à Rússia há cerca de seis anos.

Vadim Ostanin, 58 anos

Selfie partilhada por Ostonin nas redes sociais (Facebook)

Outro associado de Alexei Navalny, que liderava os escritórios da equipa em Barnaul, uma cidade da Sibéria, Ostanin foi detido em 2021 e condenado a nove anos numa colónia penal sob acusações de extremismo, no final do ano passado.

Após a morte de Navalny, o gabinete de direitos humanos do Departamento de Estado norte-americano publicou uma foto de Ostanin nas redes sociais; na legenda podia ler-se que “o pensamento independente” não é um crime e que “deter vozes da oposição não vai esconder os crimes do Kremlin”.

Andrei Pivovarov, 42 anos

Andrei Pivovarov faz o sinal da vitória dentro da jaula de vidro do tribunal em Krasnodar, Rússia, onde foi julgado pela sua dissidência e ligações a Alexei Navalny (AP)

Figura da oposição russa em São Petersburgo, líder do extinto Open Russia, um grupo de defesa dos direitos humanos, Pivovarov chegou a planear candidatar-se às eleições parlamentares russas em setembro de 2022.

Quatro meses antes, em maio, após embarcar num avião e enquanto aguardava a descolagem rumo a Varsóvia, foi arrastado por agentes encapuzados dos Serviços Federais de Segurança russos, sob acusações de liderar uma “organização indesejável” – segundo várias ONG e grupos de monitorização, uma designação usada pelas autoridades para silenciar grupos críticos do Kremlin.

Condenado em julho de 2022 a quatro anos de prisão, manteve a sua candidatura eleitoral. Como único preso político candidato a eleições na história da Rússia, a sua campanha atraiu grande atenção mediática, iluminando a estratégia das autoridades russas para manipular o plebiscito, ao proibir as candidaturas de quase todos os candidatos da oposição a Putin.

Alexandra Skochilenko, 33 anos

Skochilenko fotografada durante uma audiência judicial em São Petersburgo, a 13 de novembro de 2023 (CNN)

Artista e música russa famosa pelo seu pacifismo, sem qualquer historial conhecido de ativismo político, foi condenada a sete anos de prisão por um tribunal de São Petersburgo em novembro passado, após ter sido detida durante um protesto contra a guerra na Ucrânia.

O protesto consistiu em substituir etiquetas de produtos de supermercado por autocolantes com informações sobre a invasão do país pelas forças russas.

Num dos autocolantes podia ler-se: “O Exército russo bombardeou uma escola de artes em Mariupol onde cerca de 400 pessoas estavam escondidas dos bombardeamentos.” E num outro: “A inflação semanal atingiu um novo pico nunca visto desde 1998 por causa das nossas ações militares na Ucrânia. Fim à guerra.”

Skochilenko foi detida em abril de 2022, sob acusações de “disseminar notícias falsas” sobre o exército russo, após um cliente do supermercado ter alertado a polícia para a ação de protesto.

Durante a leitura da sentença, usando uma das suas famosas camisas coloridas com um coração vermelho estampado na frente, disse ao juiz: “Todos veem e sabem que vocês não estão a julgar uma terrorista. Não estão a julgar uma extremista. Não estão sequer a julgar uma ativista política. Estão a julgar uma pacifista.”

E.U.A.

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