Rogério Samora não era um doce de pessoa, mas tinha uma espécie de criança grande dentro dele. Se calhar, como todos os artistas, precisava de mimo, atenção e palmas. Frontal, pagou muitas vezes o preço de dizer em voz alta o que se comentava em surdina. Falava com uma ironia que desarmava os outros.
Foi um grande ator e um ator pleno. Camaleónico no cinema, magistral no teatro, profissional e eficaz na televisão, onde se tornou conhecido do grande público.
Faz parte de uma geração com escola, o que sempre faz a diferença, mas nunca obstruiu a chegada dos novos talentos e, mesmo não apreciando o método, gostava de os ver crescer.
Era exigente e muito rigoroso na profissão. “É o meu trabalho, não uma brincadeira”, disse-me uma vez nas vésperas de começarmos um projeto em conjunto.
Quase morrer em cena teria sido uma morte desejada, até feliz, que a longa agonia dos últimos tempos não permitiu.
A solidão destes meses é um certo retrato da sua vida, sempre em pista própria, mesmo quando tudo parecia caminhar numa qualquer direção comum.
Homem de paixões e encantos repentinos, Samora deixa obra. Num ano trágico para as artes também ele vê o pano cair antes do tempo.