Comprar clubes de futebol tornou-se um bom investimento?

4 jan 2022, 23:55
Arsenal

O sérvio Dragan Solak adquiriu esta terça-feira o Southampton e tornou-se no último de vários milionários e fundos de capital estrangeiro que a investir em clubes europeus. Há três variáveis de razões para o fazerem e todas elas buscam o lucro, num meio cada vez mais rico e saudável.

A notícia de que o bilionário sérvio Dragan Solak comprou oitenta por cento do Southampton, tornando-se sócio maioritário do clube inglês, já não deixou ninguém de boca aberta.

Cada vez mais os clubes europeus, sobretudo em Inglaterra, Itália e França, são adquiridos por capital estrangeiro, grande parte do qual norte-americano, e muitas vezes por empresários sem uma ligação aparente ao mundo do futebol.

Mas porque está isso a acontecer? Os clubes tornaram-se um bom investimento?

A resposta é que sim, os clubes de futebol parecem ter-se tornado um bom investimento. Mesmo sabendo-se que nem todos os investidores têm o mesmo objetivo ao adquirir um clube, é seguro dizer que todos eles procuram, direta ou indiretamente, o lucro e acreditam que o vão alcançar.

A 777 Partners, uma empresa de investimento privado com sede em Miami, comprou em outubro o Génova por 150 milhões de euros. Em declarações à Forbes, Juan Arciniegas, diretor-geral da empresa, explicou que «o facto de o clube ter tido um rendimento inferior nos últimos anos apenas nos torna mais capazes de fazer a diferença».

«Vamos fazer o que precisa de ser feito. Acho que as oportunidades estão aí para quem estiver disposto a aproveitá-las», acrescentou Juan Arciniegas.

A verdade é que a pandemia fez baixar as receitas do futebol e, por arrasto, baixou também o preço dos clubes. Como já se disse, o Génova foi comprado por 150 milhões de euros. O Southampton, diz-se, foi adquirido por Dragan Solak por 120 milhões: e vale a pena lembrar que na época passada, só em direitos televisivos, os Saints receberam 125 milhões de euros. Até o Newcastle foi adquirido pelo Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita por 350 milhões, o que está longe de ser um preço alto quando falamos de um histórico inglês.

Dragan Solak, dono do Southampton

São preços muito atrativos, sobretudo para empresas de private equity habituadas a lidar com ativos problemáticos e a fazer investimentos de risco, as quais conseguem ver retorno financeiro a longo prazo neste tipo de aplicações financeiras.

Por isso torna-se mais evidente que clubes como o Aston Villa, o Burnley, o Crystal Palace e West Ham, na Liga Inglesa, Milan, Génova, Veneza e Spezia, na Liga Italiana, Bordéus e Toulouse, em França, todos eles tenham no capital fundos de investimento norte-americanos.

Nuno Mousinho Esteves, consultor para a área desportiva, com larga experiência financeira, diz que «há muitas verticais de negócio num clube de futebol que te permitem gerar receitas de segunda a sexta, para não teres que arriscar tudo nas ‘roletas’ do fim de semana».

A valorização direta da propriedade é uma dessas verticais, obviamente, permitindo aos proprietários adquirir um clube, valorizá-lo e posteriormente fazer uma mais-valia.

Vale a pena lembrar, a esse propósito, as palavras de John Textor, que disse recentemente que a SAD do Benfica, que atualmente está avaliada em 80 milhões de euros na Bolsa de Lisboa, podia facilmente chegar aos 1,5 mil milhões de euros se entrasse na bolsa dos Estados Unidos. Possíveis exageros à parte, a verdade é que os americanos têm essa ideia: de que os clubes europeus estão subvalorizados para o potencial de rentabilização que têm.

Ora portanto essa é uma das verticais que justificam o investimento: a possibilidade obter retorno financeiro através da constituição de mais-valias.

Outra vertical passa pelo retorno através dos rendimentos comerciais dos clubes.

Juan Arciniegas dizia, na mesma entrevista à Forbes, que ao comprar o Génova, a 777 Partners não comprou apenas um clube italiano: comprou um clube daquela que já foi a maior liga de futebol do mundo, que todos os anos coloca quatro equipas na Champions (tantas quanto Inglaterra ou Espanha) e que tem uma enorme margem de crescimento em direitos televisivos, até pelo facto do futebol não ter outra modalidade no paisa disputar o espaço mediático com ele.

Ora por isso há quem invista para rentabilizar o capital em rendimentos comerciais, através de uma série de variantes em que as grandes ligas europeias são fortes, como sejam a internacionalização, o merchandising, os patrocínios ou os direitos televisivos: o que ainda não acontece em Portugal, onde os grandes vivem sobretudo da venda de passes e dos prémios da UEFA.

Sheikh Mansour, proprietário do Manchester City

Depois há outro objetivo que alguns empresários procuram ao investir em clubes europeus: legitimação mediática internacional. Nuno Mousinho Esteves dá um exemplo óbvio.

«O Blackburn Rovers foi comprado por uma família indiana que é a maior produtora de aves e de ovos, que pouca gente conhecia. Eles hoje são conhecidos em toda a Índia por terem comprado o Blackburn Rovers, apesar de continuarem a vender galinhas e ovos. Mas o Blackburn Rovers validou-os localmente e hoje têm acesso a uma série de negócios que antes não tinham. Negócios esses que compensam o facto do Blackburn lhes dar anualmente prejuízo.»

No fundo é isso que muitos investidores procuram: validação local ou até mesmo internacional. Comprar um clube de futebol dá-lhes uma projeção que lhes permite começarem a sentar-se na mesa dos grandes e conseguir realizar negócios que sem essa projeção não conseguiriam.

Há outros exemplos, para além do já referido Blackburn.

Em Itália, o Parma foi adquirido por uma empresa norte americana de lojas de conveniência, que através da aquisição de um grande clube europeu ganhou um prestígio dentro dos Estados Unidos que até então não tinham. Já a Roma foi adquirida foi um empresário que fez fortuna a vender carros da Toyota e que, também ele, conseguiu a partir daí crescer para outros negócios.

Ora expandir o grupo é muitas vezes o que motiva os investidores que compram clubes europeus. Eles não procuram o retorno direto, mas indireto do investimento, através do lucro noutras áreas. Até mesmo os proprietários de grandes grupos desportivos estão cada vez mais de olho no futebol como forma de adicionar assets ao portfolio que já têm em outros países.

É o caso, por exemplo, de Stan Kroenke, o bilionário norte americano que juntou o Arsenal a um grupo que já detinha os Denver Nuggets, da NBA, e os Los Angeles Rams, da NFL. Ao adquirir o Arsenal, que ainda para mais é um clube que costuma dar lucro, ele valoriza todo o grupo.

O mesmo se pode dizer da Fenway (que juntou o Liverpool aos Boston Red Sox), da família Glazzer (que juntou o Manchester United aos Tampa Bay Buccaneers), da York Family (que juntou o Leeds United aos San Francisco 49ers), do NSWE Group (que juntou o Aston Villa aos Milwalkee Bucks), de Shahid Khan (que juntou o Fulham aos Jacksonville Jaguars) ou de Frank McCourt (que juntou o Marselha aos Los Angeles Dodgers).

A verdade é que o futebol é um desporto global e que está a ficar cada vez maior, até em mercados nos quais nunca foi forte, como os Estados Unidos. Os valores de direitos televisivos aumentam exponencialmente todos os anos, cada vez há mais empresas a disputar a compra dos direitos e surgem novos fluxos de receitas associados aos tokens, aos NFT’s e ao vídeo streaming.

Por isso, sim, os clubes de futebol são cada vez mais procurados pelos grandes milionários.

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