Devem as crianças voltar à escola? Pais e professores acham que sim e alertam para a saúde mental

30 dez 2021, 08:00

A comunidade escolar está toda na expectativa do que vai ser anunciado pelo Governo, mas numa coisa estão todos de acordo: o melhor para as crianças era um regresso na data prevista

Portugal bateu em dois dias consecutivos os recordes de casos diários de covid-19. Mais de 17 mil na terça-feira, e esta quarta-feira mais de 26 mil. A ministra da Saúde já avisou que este vai ser um cenário que se vai repetir nos próximos dias, apontando mesmo 7 de janeiro como uma data em que o país pode chegar aos 37 mil casos em apenas 24 horas.

A acontecer, isso será a dois dias do fim da semana de contenção de contactos, altura em que está previsto um regresso generalizado à atividade, incluindo nas escolas, que se preparam para reabrir a 10 de janeiro.

A Associação Nacional de Diretores e Agrupamentos de Escolas está “na expectativa” do que vai ser anunciado a 5 de janeiro pelo Governo, e afirma que aquilo que pretende é um regresso às aulas presenciais.

Caso isso não aconteça, refere Filinto Lima à CNN Portugal, as escolas estão preparadas para regressar a um regime de ensino à distância.

“Queremos as aulas presenciais. Na possibilidade de isso não se afirmar, com certeza que, do mal o menos, o ensino remoto de emergência deverá ser acionado”, acrescenta, lembrando que esse foi o caso de muitas turmas no início deste ano letivo, defendendo ainda que as escolas estão “mais bem preparadas”, nomeadamente a nível de material digital e de literacia digital, tanto de alunos, como de professores.

Do lado dos pais, o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais lembra que a recomendação da vacinação de crianças dos 5 aos 11 anos teve, como uma das bases, a contribuição para que “o 2.º e o 3.º períodos do ano letivo funcionassem com o máximo de normalidade, e o máximo de normalidade é o ensino presencial”.

“Sabemos que este ensino à distância não tem os resultados que todos pretendemos”, sublinha Jorge Ascensão.

Destacando uma aparente menor gravidade associada à variante Ómicron, o representante dos pais diz que “não parece haver razão para adiar o regresso às escolas”, até porque esta é uma situação “já esperada”.

Assim, Jorge Ascensão pede “menos pânico e alarmismo”, até porque pode haver um forte impacto do isolamento na saúde mental, lembrando que muitos pais e famílias podem ver as rotinas alteradas caso se prolongue o encerramento das escolas.

“Isto cria uma grande perturbação. Nem todos podem estar em teletrabalho. Nem todos têm condições em casa para terem um trabalho como deve ser com as escolas. As escolas muitas vezes ligam-se, mas não se conectam, e as famílias igualmente”, refere, pedindo uma ponderação dos vários fatores antes de ser tomada uma decisão.

Numa situação diferente estão as crianças abaixo dos cinco anos e as respetivas famílias, até porque muitos pais dependem das creches para poderem ir trabalhar.

Para a Associação de Creches e Pequenos Estabelecimentos de Ensino Particular (ACPEEP), “o que era importante para todos era que reabríssemos nessa altura [10 de janeiro] para conseguirmos estabilizar as nossas vidas”,

Susana Pereira, presidente daquela associação, diz que é crucial para as crianças o regresso ao convívio, também em termos de saúde mental.

Sem olhar ainda para 10 de janeiro, Susana Pereira diz que o que preocupa pais e profissionais é a situação atual: “As pessoas não estão receosas com o regresso, estão receosas do que está a acontecer agora”.

A ACPEEP teve mesmo conhecimento de que vários casos foram já identificados nos seios familiares de profissionais e crianças, a grande maioria identificados na testagem massiva que se ocorreu antes e depois do Natal.

“Há muitas famílias em isolamento. Todos os contactos diretos em isolamento, famílias inteiras”, vinca.

Sobre um regresso ou não, a associação remete uma avaliação para o que vai ser decidido a 5 de janeiro pelo Governo.

O problema visto de dentro

Do lado de quem está lá dentro também há uma esperança de um regresso às aulas de forma presencial, pelo menos para a maioria dos alunos. É o que pensa o professor Paulo Guinote, que entende que, a acontecer, o adiamento do regresso às aulas seria mais aconselhado para os alunos até aos 12 anos.

Ainda assim, o docente refere a possibilidade de um ensino misto, com alguns dias da semana em aulas presenciais e outros dias em casa.

“O primeiro ciclo, mas também o segundo, têm uma grande percentagem de alunos não vacinados. Em termos de pais vai haver uma grande divisão entre os que se assustam com os números dos contágios, e nem sequer vão querer levar os filhos para a escola, e aqueles que, por necessidades ou por crença de que o ensino presencial é essencial, vão querer um regresso”, explica, falando numa decisão que será sempre polémica, e que vai ser tomada a menos de um mês das eleições legislativas.

Na perspetiva de Paulo Guinote, o primeiro ciclo “ganharia” em ter mais uma semana em casa, mesmo que em regime de escola online, enquanto no segundo ciclo já poderia ser possível a implementação de um regime misto.

Numa perspetiva mais científica, o virologista Pedro Simas vai de encontro às opiniões das associações escolares: “Portugal não pode começar o ano com as escolas fechadas. Não há razão nenhuma científica nem de saúde pública para se terem as escolas fechadas. Estes vírus vão propagar-se como os outros”, teoriza.

Escolas com mais de metade dos surtos

Portugal tem mais de 600 surtos ativos atualmente. Desses, mais de metade são em escolas públicas ou privadas.

São 399 surtos ativos só na comunidade escolar, mesmo numa altura em que as instituições de ensino estão fechadas. Esperam as autoridades que a semana de contenção que tem início a 2 de janeiro seja suficiente para quebrar as cadeias de contágio na comunidade escolar.

Ainda assim, os dados mostram que se trata de uma comunidade onde vírus se espalha com grande facilidade.

Segundo a Direção-Geral da Saúde, nos 399 surtos ativos em estabelecimentos de educação e ensino dos setores público e privado - escolas, ensino superior, creches e demais equipamentos sociais - existiam 3.186 casos de covid-19 acumulados, que dizem respeito a alunos, profissionais e seus coabitantes, parte dos quais já estarão recuperados.

Vacinação completa nos mais novos em março

De acordo com o plano de vacinação delineado pelo Governo, todas as crianças abaixo dos 12 anos devem ter a vacinação completa até 13 de março, data em que está previsto que sejam administradas as últimas segundas doses.

A vacinação nas crianças dos 5 aos 11 anos iniciou-se a 18 e 19 de dezembro, na sequência de uma recomendação da Direção-Geral da Saúde na qual foi tido em conta o impacto da covid-19 na comunidade escolar.

O primeiro fim de semana de vacinação foi logo um sucesso. Mais de 77 mil crianças agendaram a vacinação, e cerca de 88 mil acabaram por receber a primeira dose. O plano deve ser estendido nos próximos dias a todas as crianças daquela faixa etária.

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