Uma parte (surpreendentemente) difícil da reforma: gastar o que tanto trabalhou para poupar

CNN , Jeanne Sahadi
9 out 2022, 10:00
Idosos

Ao longo das últimas décadas, tem vindo a trabalhar e a poupar para este momento: a reforma.

Mesmo que possa estar pronto para deixar de trabalhar a tempo inteiro, a parte mais difícil vai chegar agora: permitir-se gastar as suas poupanças agora que vai deixar de receber o salário que até agora cobria as suas despesas mensais.

Fazer a transição psicológica de poupador para gastador – já para não falar de gestor do pé-de-meia – não é coisa pouca para a maioria das pessoas.

“A partir de agora tem uma quantia fixa e vai ter de começar a gastá-la. Para certas pessoas, é quase fisicamente doloroso”, disse David John, consultor sénior de políticas estratégicas do Instituto de Políticas Públicas da AARP (anteriormente designada por Associação Americana de Pessoas Reformadas na tradução literal).

Mas determinados fatores imprevisíveis como o desempenho dos mercados, a esperança média de vida e os problemas de saúde fazem com que gastar o seu dinheiro seja mais complicado do que parece, disse John. Por isso é que as pessoas podem hesitar em usar as suas poupanças, porque pensam: “Eu tenho X dólares e têm de me durar toda a vida, mas o meu futuro é tão incerto. Se mexo no dinheiro, estou a pôr a minha vida em risco.”

E os estudos indicam que, entre os reformados com poupanças, uma boa parte não mexe muito nesses recursos, optando por viver de fontes fixas de rendimento, como a Segurança Social ou as pensões, ou o salário de um emprego em part-time que decidam assumir. Um estudo da Black Rock concluiu que a grande maioria dos reformados ainda tem pelo menos 80% das suas economias após duas décadas de aposentação.

Obviamente que isto se deve em parte ao facto de terem beneficiado de um dos mais longos períodos da História com os mercados em alta, entre 2009 e 2020, o que ajudou a repor parte do que foram gastando ao longo dos anos. E fazem parte da última geração de trabalhadores a ter direito a uma pensão corporativa.

Mas a relutância psicológica em gastar as poupanças é um fator que pesa para a maioria das pessoas, independentemente dos seus recursos financeiros. E pode tornar-se ainda mais acentuado para aqueles que estão prestes a reformar-se, perante os cenários da inflação, dos mercados voláteis e da falta de pensões, disse John.

Mudar a mentalidade é fundamental

O gestor financeiro certificado (GFC) Kyle Newell lembra aos clientes que as poupanças que eles trabalharam tanto para acumular estão lá para ajudá-los a viver uma boa reforma.

“Eu digo-lhes, agora quem trabalha é o dinheiro para que não tenham de ser vocês. Isso parece ajudar as pessoas”, disse Newell, que faz projeções para os seus clientes para ajudá-los a perceber se podem gastar um pouco mais do que aquilo que julgam.

Aos clientes que estão fixados em ter a mesma quantidade de dinheiro ou mais quando morrerem, o GFC David Edmisten coloca uma pergunta simples: porque é que isso é importante para vocês?

“Tento perguntar-lhes qual a finalidade do dinheiro: é tê-lo? Ou usá-lo como uma ferramenta para fazerem o que querem e evitarem o que não querem?”

Pede-lhes igualmente que pensem sobre aquilo que realmente querem alcançar e que vejam as suas poupanças como um meio para esse fim. “É necessário gastar muito mais tempo a pensar nos objetivos para a reforma. Aqueles que sabem quais os seus objetivos e aquilo que querem fazer mostram estar mais satisfeitos”, disse Edmisten.

Ele aconselha ainda os clientes a irem com calma e a pensar no primeiro ano de reforma como uma experiência de aprendizagem no que ao consumo diz respeito.

Estão a tentar redescobrir-se a si mesmos agora que deixaram a vida ativa e a perceberem aquilo que podem e não podem fazer financeiramente, disse. “Tive um cliente com milhões que me perguntou se podia comprar um carro usado.”

Medidas práticas que pode tomar

É difícil fazer uma boa gestão do seu dinheiro durante a reforma sem que seja realista sobre o que está em jogo.

A primeira coisa a fazer é criar um orçamento e traçar um plano para cobrir as suas despesas.

“Uma pessoa precisa de ter noção: ‘Quais são os meus ativos e os meus padrões de despesa e como posso conciliar os dois?’” disse John.

Por isso, antes de se reformar, faça um registo dos seus gastos e das suas despesas regulares, como habitação, alimentação, cuidados de saúde, etc. De seguida, avalie as mudanças que estas despesas podem sofrer depois de se reformar (por exemplo, se tenciona mudar-se para uma casa ou área menos dispendiosa; e se vai ser elegível para o seguro de saúde [Medicare] ou se os seus gastos com seguros serão subsidiados pela sua antiga entidade patronal).

Tenha também em conta despesas pontuais previstas, como pagar o casamento de um filho, comprar um carro ou fazer umas boas férias.

Depois, apure os rendimentos fixos que irá ter (por exemplo, Segurança Social ou pagamento de pensões).

A diferença entre as suas despesas previstas e os seus rendimentos fixos é a quantia que precisará de retirar das suas poupanças.

Assim que tiver este número determinado, construa um fundo de maneio que possa cobrir as suas necessidades durante um ano ou dois, para que não se veja forçado a ter de vender se houver uma quebra nos mercados, ou se iniciar a reforma com os mercados em baixa.

“Um ano antes de se reformar, deverá ter dinheiro para um período entre 12 e 24 meses”, disse Edmisten. “Se entrarmos em recessão, nunca devemos ter de vender ações para dar resposta às necessidades ao nível das despesas numa altura em que os mercados estão em baixa.”

Falar com um profissional do sector também poderá ser benéfico. Um consultor financeiro fiduciário, num regime de pagamento de honorários, poderá ajudá-lo a traçar uma estratégia para gerir e usar o seu dinheiro nos próximos anos, disse John.

As pessoas à beira da reforma ficam muitas vezes “como veados encandeados pelos faróis”, disse Edmisten, cujos clientes estão maioritariamente entre os 58 e 63 anos e planeiam viver durante uns tempos das suas carteiras de investimentos até que entre em jogo a Segurança Social e a Medicare. “A sensação mais comum que vou observando nos meus clientes é o facto de se afirmarem assoberbados com todas as escolhas que têm de fazer para viver das suas poupanças na reforma”, disse.

“Com os diferentes tipos de contas que muitos deles possuem, o potencial para penalizações ou impostos mais altos no caso de fazerem um levantamento de forma incorreta é elevado, e compreender como é que os seus investimentos poderão ter de mudar para o período da reforma também pode ser complicado para alguém que se acabou de reformar.”

 

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