Li recentemente algumas notícias sobre uma nova tendência nas viagem de avião, conhecida como “raw-dogging” (não fazer nada), onde os passageiros passam longas horas no ar simplesmente a olhar em frente. Sem música, sem filmes, sem fazer nada. O futebolista do Manchester City, Erling Haaland, aderiu recentemente a esta moda. Completou um voo de 7 horas e estava satisfeito com essa experiência. Alguns especialistas acreditam que assim se pode recuperar o espaço mental, pensar em projetos a médio/longo prazo e aprender a lidar com a solidão.
Os gregos clássicos davam uma grande importância à contemplação. Em particular, Aristóteles dizia que um cidadão não devia trabalhar em algo produtivo, porque isso dificultava o que realmente importava: pensar, dialogar, contemplar. Não lhe faltava razão. Mas faltava-lhe algo, um olhar diferenciador sobre o trabalho que faz dele mais do que o meio para obter o que precisamos para viver.
Numa altura em que regressamos ao trabalho e às aulas, gostaria de refletir sobre a produtividade do nosso trabalho, especialmente do trabalho numa empresa. A produtividade cresce, dizem os economistas, quando investimos em bens de capital (mais e melhores máquinas ou tecnologia), ou quando temos uma organização mais eficiente, de modo a não desperdiçar recursos.
No entanto, a produtividade também cresce com mais e melhor contribuição dos trabalhadores. O Papa Francisco recorda que é importante devolver o centro do trabalho à pessoa: a missão ou o propósito interno da empresa é a atenção às necessidades, esperanças, expectativas, desejos das pessoas que depois se encarregam de traduzir isso em atenção às necessidades dos clientes. Aqui ficam 6 ideias.
- Explique ao trabalhador em que desafio se integram as tarefas que ele deverá desenvolver , qual o seu contributo para a satisfação das necessidades dos clientes. Fale-lhe dos resultados do seu trabalho, e não apenas das tarefas. A um canalizador que vem arranjar um problema em sua casa, não é preciso dar-lhe todas as indicações. Bastaria dizer-lhe «Veja se consegue que esta torneira deixe de pingar». Ele encarregar-se-á do resto. Isto é importante no regresso ao trabalho quando se estabelecem objetivos e metas para a empresa. Como diz Saint-Exupery, se quer construir um navio, não chame as pessoas para juntar madeira ou atribuir-lhes tarefas. Mas ensine-os a desejar a infinita imensidão do oceano.
- Procure flexibilizar os horários: que cada um se dedique à tarefa que mais gosta, no horário em que mais lhe convém, na qual pode ser mais útil. Isto não é uma utopia, nem uma via para a desordem. Sabe o que cada pessoa da sua equipa mais gosta de fazer? Sabe se ele prefere trabalhar de manhã ou à tarde? Em casa ou no escritório? Pergunte-lhe e verá como essa informação é valiosa para marcar reuniões, gerir os ritmos, delegar atividades que os outros farão melhor que nós.
- Assegure-se de que o ambiente de trabalho é adequado no aspecto humano. É pouco motivador encontrar-nos com um chefe mal-humorado, que passa o dia a queixar-se; um colega pessimista, que só vê dificuldades… Não é fácil, mas, com paciência e perseverança, pode consegui-lo. Como recorda Richard Branson, fundador do Virgin Group, “um sorriso pode abrir portas que um simples aperto de mão não consegue”. É a primeira atitude para conseguir um cliente e não custa nada. Sorrir também nas reuniões virtuais de segunda-feira de manhã, quando não apetece, é um incentivo para a sua equipa.
- Cuide da justiça na retribuição, que não depende apenas do salário, mas também do reconhecimento de um trabalho bem feito, de horas extras dedicadas a um assunto urgente. Premiar umas vezes com dinheiro, outras com umas palavras ditas na altura certa, um e-mail de agradecimento, um Whatsapp com a palavra mágica “Obrigado”. Recordo o bom exemplo de um chefe de serviço que levava os seus colaboradores a casa quando lhes pedia que ficassem no escritório até mais tarde, pensando que o seu colaborador tinha a mulher e os filhos à sua espera.
- Ofereça oportunidades para os empregados serem inovadores. Pergunte-lhes como poderiam melhorar a sua tarefa, que software se poderiam utilizar, se a IA melhoraria os processos em que está envolvido. Assim o trabalho ganha um sentido. O sentido não vem da remuneração, nem da categoria, mas sim de saber o que se está a fazer. Ou seja, explicar-lhes o que aquele tratador de jaulas de macacos no zoo de Londres tinha descoberto, quando descreveu o seu trabalho como «criador de sonhos para crianças».
- Pergunte-se como faria Jesus este trabalho. Ele também trabalhou durante 30 anos e há muito a aprender d’Ele. A pergunta que podemos fazer é: o que faria Jesus se estivesse nesta reunião, a fazer este relatório, ou ocupado nesta tarefa repetitiva. As coisas deste mundo já pertencem a Deus, mas, através da nossa liberdade, elas adquirem uma nova dimensão. Com a nossa liberdade, o próprio trabalho pode tornar-se santo, tornando-se assim mais de Deus.
Oxalá as memórias das férias, de uma viagem longa de avião, de um momento de “não fazer nada”, de um passeio junto à praia, nos ajudem a repensar estratégias para melhorar o nosso trabalho. E, sobretudo, a investirmos em melhorar o trabalho das pessoas à nossa volta.