81% das infrações detetadas foram em ‘websites’ e redes sociais
Mais de 50 mil euros de multas foram aplicadas a quem violou a lei que restringe publicidade alimentar a menores de 16 anos, em vigor desde 2019, e a maioria das infrações foram ‘online”.
Segundo o relatório da primeira avaliação do impacto desta lei, que será apresentado esta sexta-feira, em Lisboa, 81% das infrações detetadas foram em ‘websites’ e redes sociais.
O documento indica também que 9,5% das infrações ocorreram em revistas e outros 9,5% em televisão.
Durante o período de aplicação da lei foram instaurados 11 processos de contraordenação, dos quais sete resultaram em condenações num valor total de 50.500 euros de coimas aplicadas.
Das categorias de alimentos com mais infrações destacam-se os bolos, bolachas e outros produtos de pastelaria (28%), assim como as refeições pré-preparadas, de conveniência e refeições prontas a consumir (23,0%).
A avaliação do impacto da lei que introduziu restrições à publicidade dirigida a menores de 16 anos de alimentos e bebidas com alto valor energético, teor de sal, açúcar e gorduras foi feita por um grupo de trabalho coordenado pela Direção-Geral da Saúde (DGS) e que inclui representantes da Direção-Geral do Consumidor (DGC), Direção-Geral da Educação (DGE) e Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).
Segundo o documento, entre 2019 e 2023, a DGC realizou cinco ações de fiscalização para analisar a publicidade alimentar para menores de 16 anos. No total, foram analisadas 258 mensagens divulgadas por 34 operadores económicos nos diversos contextos de comunicação (revistas, televisão e meio digital).
Do total de operadores económicos abrangidos, registou-se uma taxa de cumprimento de 68%. No que se refere ao universo de mensagens publicitárias analisadas, a taxa de cumprimento chegou aos 94%.
Quanto à análise da comunicação comercial presente nos serviços televisivos dirigidos ao público jovem, foi feita pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e decorreu no último trimestre de 2023.
Neste trabalho, a ERC identificou “diversas técnicas de marketing e conteúdos dirigidos a crianças e jovens no interior dos programas e nos seus intervalos”, com 11 violações da lei na televisão e plataformas de streaming
Foram ainda identificados 41 anúncios a menus infantis de duas cadeias de ‘fast-food’ nos quais são promovidos as marcas e brinquedos que acompanham os menus, sem que seja identificado um produto alimentar específico (‘brand marketing’).
“Esta estratégia de adaptação à legislação existente parece continuar a permitir a exposição das crianças ao marketing alimentar”, alertam os especialistas.
O relatório aponta ainda situações “suscetíveis de indiciar violação ao disposto no Código da Publicidade”, quanto à publicidade a alimentos e bebidas dirigidas a crianças, assim como “outras comunicações comerciais que se mostram mais difíceis de enquadrar atentos os constrangimentos legais, nomeadamente no que se refere aos patrocínios”.
Ainda na televisão, a análise de monitorização da publicidade alimentar dirigida a crianças e jovens abrangeu todos os canais portugueses generalistas e de acesso livre (RTP1, RTP2, SIC e TVI) e os canais infantis por cabo/fibra destinados ao público infantil.
Em 2020 foram analisados 5.555 anúncios com publicidade alimentar, 10,4% promoviam alimentos e bebidas e não se verificou qualquer publicidade a alimentos nos canais infantis. A maioria da percentagem de anúncios a alimentos e bebidas não cumpria o perfil nutricional definido pela DGS (65,6%), um valor que no ano seguinte subiu para 78,3%.
Mais de metade de anúncios envolvem alimentos pouco saudáveis
Mais de metade dos anúncios publicitários na televisão e conteúdos online sobre alimentos analisados pela DGS destacavam alimentos pouco saudáveis.
Os dados do primeiro relatório de avaliação ao impacto da lei que em 2019 restringiu a publicidade alimentar dirigida a menores de 16 anos indicam que um em cada cinco anúncios televisivos e conteúdos nos websites das marcas analisadas tinham “conteúdo apelativo a crianças”.
Quanto à publicidade a alimentos com "perfil nutricional inadequado", o documento indica que mais de 65% dos anúncios/conteúdos analisados em contexto televisivo e 'online' tinham um perfil nutricional que não cumpria os critérios definidos pela DGS.
Os dados das ações de fiscalização realizadas nesta avaliação sugerem uma “maior preocupação com o ambiente digital”, pois cerca de 80% das infrações detetadas à Lei foram no seguimento ‘online’.
“Ainda que alguns destes anúncios/conteúdos identificados possam estar a cumprir o disposto na Lei (…), fica claro que as crianças portuguesas continuam expostas à publicidade e a um conjunto alargado de estímulos para o consumo de alimentos com um perfil nutricional desadequado”, refere o relatório.
As categorias de produtos alimentares mais publicitadas ou nas quais mais foram detetadas infrações pela Direção-Geral do Consumidor correspondem aos produtos com ”perfil nutricional inadequado”, como bolos e produtos de pastelaria, aperitivos/snacks, sumos, gelados, chocolates e refeições de conveniência ou prontas a consumir, não cumprindo os critérios definidos pela Direção-Geral da Saúde.
O relatório, que será hoje divulgado em Lisboa, foi elaborado pelo grupo de trabalho definido para avaliar o impacto desta lei, que é coordenado pela DGS e tem representantes da Direção-Geral do Consumidor (DGC), Direção-Geral da Educação (DGE) e Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).
Em declarações à Lusa, a diretora do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, Maria João Gregório, destaca a importância da avaliação das medidas públicas: “devemos não só implementar medidas, mas ter a capacidade de as monitorizar, avaliar e propor sugestões de melhoria para conseguirmos alcançar os resultados que exatamente pretendemos”.
Em relação ao perfil nutricional dos alimentos, os especialistas assinalam alguns dados positivos: entre 2019 e 2022 aumentou a percentagem de produtos alimentares que cumprem os critérios de perfil nutricional definidos pela DGS, nomeadamente nas categorias de iogurtes sólidos e líquidos, cereais de pequeno-almoço e leites aromatizados.
“Estes dados podem sugerir que a lei parece estar a ter um papel importante no incentivo à reformulação dos produtos alimentares, promovendo, em particular a redução do teor de sal e de açúcar nos alimentos”, refere o documento, recordando, no entanto, que há outras medidas, como a taxa sobre bebidas açucaradas, que podem igualmente ter contribuído para este resultado.
O relatório conclui ainda que a publicidade a alimentos com um perfil nutricional desadequado “é ainda amplamente utilizada” e a identificação de anúncios/conteúdos que apresentam elementos que apelam a crianças foi frequente.
Os dados recolhidos sugerem também que as restrições previstas na lei estão, na sua maioria, a ser cumpridas, mas lembra que “está a ser feito um investimento em áreas, canais e estratégias ainda não regulados ou menos fiscalizados”.
“Destaca-se o patrocínio, a utilização de sistemas de verificação da idade para acesso aos conteúdos dos sites, a ‘alegação’ de que o conteúdo não é dirigido para menores de 16 anos, mas sim conteúdo dirigido para um píblico diferente e o brand marketing”, refere.
A legislação publicada em 2019 veio restringir a publicidade a alimentos e bebidas com elevados valores energéticos, de sal, açúcar e gorduras – como alguns refrigerantes ou batatas fritas, por exemplo - nas escolas, nos cinemas, em programas televisivos e em aplicações dirigidas a menores de 16 anos.