Adeptos foram apanhados no meio de confrontos com a PSP depois de terem sido atirados engenhos pirotécnicos. Agora contam a história daquela noite
Para Bernardo o dia 17 de maio devia ter sido de festa. Marcelo pensou o mesmo quando se levantou no sábado.
Para eles e para os milhares de sportinguistas que saíram à rua era dia de celebrar o que o Sporting não fazia há 70 anos: ser bicampeão.
Vitória garantida, festa certa na cidade de Lisboa, onde, como tantos outros, os jovens se juntaram com amigos para celebrar nas ruas.
Só que para nenhum dos dois aquele será o dia do bicampeonato, sobretudo para Bernardo, comissário de bordo da TAP que perdeu um olho durante os festejos do título. Embora não seja um caso tão grave, Marcelo ficou sem um dente e com uma sutura no lábio.
Ambos os adeptos garantem que os seus ferimentos foram provocados por ações da PSP, que atuou com balas de borracha para dispersar a multidão em algumas zonas da capital.
Depois de ter sido atingido por uma bala de borracha no olho na zona do Saldanha, Bernardo foi hospitalizado e operado de urgência, mas não conseguiu salvar uma vista. Teve o azar de estar no meio da muita pirotecnia utilizada pelos adeptos leoninos, ainda que o mesmo garanta à CNN Portugal que não estava em posse de nada.
"Não recebi qualquer aviso, só os comecei a ver a disparar, ouvi, vi-os de longe. E, do nada, pronto", descreve.
Esses artefactos pirotécnicos foram arremessados contra agentes da polícia, desencadeando momentos de tensão e violência entre as partes. Bernardo, que diz que queria apenas festejar, ficou sem um olho aos 28 anos.
Marcelo é ainda mais novo. Tem 25 anos e também recorda os confrontos com agentes da PSP à CNN Portugal. Aponta que foi agredido sem qualquer motivo, tendo ficado sem um dente e com uma grave sutura no lábio.
Tudo aconteceu no Saldanha, onde esperava a passagem do autocarro que levava a equipa do Sporting do Estádio de Alvalade para o Marquês de Pombal. Por volta das 01:30 foi agredido de forma inesperada e violenta pela polícia, acabando levado de ambulância para o Hospital de Santa Maria.
Foi lá que levou quatro pontos no lábio e foi também lá que ficou a saber que terá de colocar um implante dentário. No meio das agressões foi ainda atingido por uma bala de borracha no peito. Sobre o que fazia à altura da situação, Marcelo garante que ele e os amigos estavam apenas a gritar cânticos afetos ao clube, não tendo, em momento algum desrespeitado a polícia ou as suas ordens.
"Do nada um polícia saltou para cima de mim. Deu-me um pontapé, eu caí ao chão e, no momento em que caí, saltaram mais dois ou três polícias para cima de mim a darem-me pontapés, com cassetetes", lembra, referindo que foi quando se levantou que ainda foi atingido por uma bala de borracha.
Mas voltemos a Bernardo, que ao início até pensou ter sido vítima da pirotecnia que ia sendo lançada ali ao lado. Só mais tarde confirmou que as lesões que sofreu foram provocadas também por balas de borracha que tinham sido disparadas pelas forças de intervenção.
"Lamentavelmente, a PSP teve conhecimento de ferimentos em cidadãos, aos quais foi prestado todo o auxílio (...) foram também identificados os intervenientes feridos para respetiva e ulterior comunicação dos factos conhecidos ao Ministério Público, informação essa já efetuada", garantiu a PSP num comunicado em que também confirmou a instauração de um processo de inquérito que vai apurar o que aconteceu.
Bernardo acabou por ser transportado para o Hospital de São José, onde, para lhe retirarem os fragmentos de plástico do olho, acabaram por ter de lhe remover a vista.
Quanto a Marcelo, o adepto encontra-se em casa a estudar para os exames da faculdade desde aquela noite. A mãe vai avançar com uma queixa contra a atuação da PSP.
O adepto garante que na ambulância onde seguiu ia outro adepto igualmente atingido por uma bala de borracha nos genitais. À CNN Portugal chegaram ainda fotografias que confirmam que outros adeptos terão passado por situações semelhantes.