Os restantes partidos criticaram a decisão dos sociais-democratas salientando várias vezes que existem regras na atribuição aos grupos parlamentares da elaboração de pareceres, segundo uma grelha criada para o efeito
O PSD justificou esta terça-feira a sua recusa quanto à elaboração do parecer sobre a censura do Chega ao presidente do parlamento dizendo que não quer contribuir para qualquer tipo de "folclore", com os partidos a lembrar que “há regras”.
Em debate na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias esteve esta terça-feria um requerimento apresentado pelo grupo parlamentar do PSD a pedir escusa de elaborar o parecer sobre a resolução do Chega que visa censurar o comportamento do presidente da Assembleia da República (PAR), Augusto Santos Silva (deputado eleito pelo PS).
“Comprovados todos os elementos que me foram enviados, o PSD entendeu não participar por qualquer forma ou via nestas contendas entre o PAR do PS e o Chega”, justificou a deputada social-democrata Paula Cardoso, que tinha ficado responsável por elaborar o parecer em causa.
Segundo a deputada, o presidente do parlamento, no despacho em que pediu à primeira comissão um parecer sobre a iniciativa do Chega, “é claro e reconhece que o que está em causa não é nenhuma questão regimental ou constitucional na qual ele não tem dúvidas como a aplicar, mas é uma questão ético-política”.
“Se é uma questão ético-política não nos cumpre a nós dar pareceres sobre este folclores entre o PAR e o Chega”, disse a deputada, completando que o grupo parlamentar do PSD não está disponível “nem hoje nem doravante para participar” neste tipo de questões.
A deputada sustentou que a decisão em causa sobre a admissibilidade do projeto do Chega “podia ter sido tomada, tinha outra forma de ser tomada” e que “tentar escudar-se, não tomando decisões por práticas que reiteradamente violam o Regimento e a Constituição são práticas reprováveis de um lado e do outro e o PSD não alinha nessas práticas”.
PS, Iniciativa Liberal, Chega, PAN e Livre (BE e PCP não estavam presentes) criticaram a decisão dos sociais-democratas, salientando várias vezes que existem regras na atribuição aos grupos parlamentares da elaboração de pareceres, segundo uma grelha criada para o efeito.
Apesar de os partidos terem apelado ao PSD para que mudasse de posição, o pedido não foi acedido e, sendo que nenhum deputado pode ser obrigado a elaborar um parecer, seguindo a grelha de distribuição, a elaboração do documento acabou por ficar atribuída à deputada única do PAN, Inês Sousa Real, já depois de a Iniciativa Liberal, ter recusado "fazer o trabalho que deve ser feito pelo PSD".
De acordo com uma notícia avançada durante a tarde pela TSF, o requerimento entregue pelo PSD pretenderia atribuir a elaboração do parecer ao PS.
No debate, o socialista Pedro Delgado Alves defendeu que “não é prática da comissão votar-se quem é o partido relator de pareceres” e salientou que “há regras sobre a distribuição de iniciativas legislativas que seguem uma sequência”.
O deputado disse ainda que, por norma, os deputados apresentam escusa se tiverem "algum interesse direto na matéria" e apontou que nenhum destes argumentos foi invocado pelo PSD.
“Naturalmente, se todos os senhores e senhoras deputados e deputadas, suplentes e efetivos, disserem que não estão disponíveis politicamente por razões de consciência (…) é legítimo que um deputado se recuse a fazer um parecer, nenhum deputado pode ser obrigado a fazê-lo. Agora, a conclusão que aqui se retira é: então qual é o grupo parlamentar que se segue na lista”, sustentou, salientando que, por uma questão de eventual conflito de interesses, nem PS nem Chega poderiam fazê-lo.
Pelo Chega, o líder parlamentar Pedro Pinto disse que o partido apenas quer que o parecer seja feito mas lembrou que o PSD tinha aceitado a elaboração do parecer em julho, antes da pausa para férias parlamentares.
O mesmo argumento foi utilizado pela deputada da Iniciativa Liberal Patrícia Gilvaz, que acrescentou que se trata “de uma regra de distribuição que tem que ser seguida e que tem que ser cumprida”.
Inês Sousa Real, do PAN, mostrou-se espantada com a recusa, lembrando que o PSD “é o maior partido da oposição”.
“Os pareceres podem ter a sua complexidade até quando estamos aqui a destrinçar aquilo que possam ser fundamentos éticos, políticos, ou até mesmo formais e regimentais mas, não obstante se queira cair no domínio ético ou político, parece-nos que é para isso mesmo que cá estamos”, disse.
Rui Tavares, do Livre, salientou que esta recusa “transporta consigo uma mensagem política” e argumentou que todos os deputados são eleitos para se pronunciar sobre temas, mesmo que estes tenham “mais ou menos seriedade política”, acrescentando que, independentemente da sua origem, esta é uma matéria “importante e relevante” que envolve “o prestígio” da Assembleia da República.
No final de julho, Santos Silva pediu à 1.ª comissão que emitisse um parecer "sobre a conformidade constitucional e regimental” do projeto de resolução do Chega, "nomeadamente para efeito da sua admissibilidade" e justificou esta decisão “pelas dúvidas suscitadas pelos serviços da Assembleia mas também em razão das dúvidas muito fundas e muito complexas” suscitadas “no plano ético-político, não por este projeto de resolução em concreto, mas pelo precedente que ele pode criar”.