Regresso dos debates quinzenais divide PSD e PAN: Rio diz que são uma "berraria", Sousa Real acusa-o de "desprezar a democracia"

15 jan 2022, 22:41

O último frente-a-frente das legislativas foi entre Inês Sousa Real e Rui Rio. A líder do PAN deixou claro que está disponível para negociar, mas há questões fundamentais em que os partidos não se entendem

Rui Rio e Inês Sousa Real estiveram frente-a-frente no último debate após duas semanas de sistemáticos confrontos e foi notória a busca por acordos, tanto em matéria ideológica, como em matéria financeira ou de política ambiental. O único problema? Ambos os partidos pisam as linhas vermelhas um do outro.

Nos primeiros minutos, Inês Sousa Real respondeu que não era indiferente quem seja eleito primeiro-ministro, mas mostrou-se disponível para negociar quer com António Costa, quer com Rui Rio. Uma tomada de posição, aliás, que o presidente do PSD utilizou para atacar o líder socialista. “Elogio o PAN, temos de ter disponibilidade para governar, o contrário daquilo que o PS está a fazer”, disse, agradecendo à ambientalista a viagem que fez até ao Porto, onde foi o debate.

Mas as hostilidades foram rapidamente abertas e a líder do PAN foi clara a estabelecer linhas vermelhas e a primeira que elencou foi imediatamente a inexistência de debates quinzenais com o primeiro-ministro. Decisão aprovada a 30 de agosto de 2020 com os únicos votos a favor do PS e PSD.

“Foi pela mão do Bloco Central que se acabaram com os debates quinzenais com o primeiro-ministro na Assembleia da República. Foi com o Bloco Central que aumentaram o número de assinaturas para petições e que a contratação pública flexibilizou-se, aumentando o risco de corrupção”, criticou Inês Sousa Real. Mais tarde, a ambientalista viria a agudizar as críticas, sublinhando mesmo que Rui Rio mostrou “desprezo pelo Parlamento” ao ter votado ao lado do PS.

Em defesa, o presidente do PSD afirmou que aquilo que é relevante na Assembleia da República é a sua capacidade de fiscalizar o Governo e referiu que os debates quinzenais continuam a existir com as equipas ministrais do Executivo. 

“Mas a questão é esta”, acrescentou Rui Rio, evidenciando os encargos de uma disponibilidade quinzenal do chefe de Governo: “semana sim, semana não tem de estar lá o primeiro-ministro com a equipa governamental toda e, nas noites anteriores, ter de preparar todas as perguntas que lhe são feitas”. “É um espetáculo mediático”. 

“O que a Assembleia da República precisa de fazer é o acompanhamento do Governo e não um espetáculo mediático em que semana sim, semana não está lá o primeiro-ministro para aquela berraria”, disse Rui Rio.

Último frente-a-frente foi o único que não foi disputado em Lisboa

Esta foi uma caracterização que levou Inês Sousa Real a pedir “mais respeito pelo Parlamento”, “a casa da democracia que representa a voz do povo”. “Achar que perder uma tarde a dialogar com a Assembleia da República é uma perda de tempo é desprezar o parlamento”, considerou.

Questionado, mais tarde, se tem mostrado desprezo pelo Parlamento, Rui Rio disse que não, mas explica que é “crítico da forma como ele funciona”. “Nos anos 90 tinha uma qualidade e uma atividade muito maior e superior. Obviamente, não sou crítico do funcionamento democrático do Parlamento”. Pressionado sobre se considera esta uma crítica muito grave, Rio não respondeu.

Eucaliptos: um regresso "à lei cristas"

As críticas às opções políticas do PSD continuaram por mão de Inês Sousa Real, nomeadamente acusando os sociais-democratas de não darem o exemplo pela igualdade de género. “O PSD, em 22 distritos, só tem seis mulheres cabeça de lista, as mulheres que são as mais vulneráveis à pobreza, que trabalham igualmente, mas com salários desiguais, é importante que os partidos políticos tomem a dianteira”. Mas foi na questão dos eucaliptos que ambos mostraram pisar as linhas vermelhas um do outro.

Reiterando que o PSD votou contra a proposta do PAN para reverter os apoios para a plantação de eucaliptos no país, Inês Sousa Real disse que o país está a regressar à “lei cristas”, “ao tempo em que se andava a plantar eucaliptos em todo pais”, “somos uma caixa de fósforos” e isso revela “memória curta” dos incêndios devastadores de 2017.

Depois de acusar o líder dos sociais-democratas de privilegiar os incentivos à plantação de árvores de crescimento rápido e de ter uma visão extrativista do país que desconhece os impactos das alterações climáticas, Rui Rio foi buscar estatísticas para justificar o seu programa eleitoral. “25% do território português é mato, metade dos incêndios começam aí”, pelo que o plano passa por dar valências aos donos dos terrenos para que essas zonas deixem de “não servir para nada”.

A proposta, diz o candidato, “é permitir árvores de crescimento rápido rentável, mas também complementar isso com árvores de crescimento lento”. “Com sensatez e sem fundamentalismos”, argumentou. Mas, questionado se isto é uma linha vermelha impeditiva a um acordo com o PAN no futuro, Rio escolheu não responder.

Após este silêncio, Inês Sousa Real interveio, recordando que o PSD chumbou a iniciativa do PAN de aumentar os apoios à floresta autóctone. "Tenho a certeza que Rio se irá aproximar da posição do PAN nesta matéria". “É uma questão de fé?”, perguntou o jornalista. "Espero que sim, mais que não seja de sobrevivência", respondeu a ambientalista.

PPPs rodoviárias: “O que é que quer que faça? Tem de dizer ao Governo anterior…” 

Mais uma das medidas imprescindíveis para negociar com o PAN é o fim das “borlas fiscais” às grandes empresas poluidoras, o caso da EDP e da GALP. Para o Pessoas Animais Natureza, deve-se retirar as isenções que existem e apoiar as empresas com boas práticas e as famílias. Como moeda de troca, Sousa Real sugeriu estar disponível para descer o IRC. 

Ao encontro dessa ideia, Rui Rio concordou que “devemos incentivar quem polui menos e penalizar quem polui mais”, mas rejeitou a ideia do PAN de descer o IRS e o IRC ao mesmo tempo, já que isso iria agravar o défice, a dívida e tornar Portugal ainda mais dependentes.

“Doutor Rui Rio o dinheiro existe, ele está a ser mal aplicado”, retorquiu Inês Sousa Real, explicando que Portugal perde para as PPPs Rodoviárias cerca de 10 mil milhões de euros - “três vezes mais do que aquilo que deviam custar ao país”.  

“Aí estamos de acordo”, interrompeu por momentos Rui Rio, mas Sousa Real partiu imediatamente para o ataque: “Lamento se concorda que o grupo parlamentar do PSD não tenha acompanhado as iniciativas do PAN na Assembleia da República. Terá que articular o seu discurso com o seu grupo parlamentar”.

Rui Rio estendeu as mãos. Considerando que as renogociações das cláusulas contratuais podem ser feitas, mas, “meta-se do lado dos outros…para ver se há alguma renegociação”. Perante isto, a líder do PAN pediu que o interesse público fique acima dos interesses privados. Algo que Rui Rio concordou, mas “o que é que quer que faça? Tem de dizer ao Governo anterior…” 

“Não só ao Governo anterior, mas também ao PSD, porque o PSD podia ter acompanhado o PAN e votado a seu lado”.

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