Entre os socialistas, faz-se a distinção. Medina não vai nas listas porque, depois de anos e anos em cargos de grande responsabilidade, precisa de uma pausa: não se revê no trabalho parlamentar e está também saturado da forma como o caso Tutti Frutti desgastou a sua vida pessoal. Já Sérgio Sousa Pinto saltou, por vontade própria, por uma questão de “ego”. Há quem diga que fez um favor ao partido
Ainda a campanha eleitoral não aqueceu e já se tornou notória a divisão no Partido Socialista (PS). As escolhas de Pedro Nuno Santos estão a gerar desconforto, embora haja quem se apresse a negá-lo. Há quem já estique a passadeira para a sucessão do secretário-geral do PS. Se Fernando Medina é a pessoa certa para esse caminho? No Largo do Rato, admite-se que não, mas poderá ser fundamental para o apoio necessário a quem vier a seguir. Provavelmente, José Luís Carneiro.
“É um tiro no porta-aviões, numa altura destas, antes da campanha, perder dois moderados”, reage um militante, que no passado chegou a manifestar publicamente apoio a Pedro Nuno Santos. Em causa está o facto de Fernando Medina ter decidido não integrar as listas de deputados e de Sérgio Sousa Pinto ter saltado delas depois de ver o seu nome aprovado como um dos primeiros em Lisboa. Com interpretações diferentes no PS, como veremos.
Ninguém nega que as saídas terão impacto na perceção da opinião pública. Ainda assim, sobretudo entre os que estão mais alinhados com o líder socialista, procura-se desconstruir a ideia de que há um descontentamento generalizado, por mais que haja em todas as distritais quem esteja desiludido. Fala-se apenas em “casos isolados”.
“O que posso mesmo garantir é que isto não é um movimento generalizado que tem o Fernando [Medina] e o Sérgio [Sousa Pinto] como as pontas do icebergue”, garante um dos cabeças de lista.

Os 3 erros de Pedro Nuno
Entre os que se identificam como moderados, apontam-se três erros a Pedro Nuno Santos, que alimentam a fissura interna. E alimentam as ideias de uma sucessão.
Erro 1: Ter chumbado a moção de confiança e ditado a ida a eleições antecipadas. No PS há quem veja essa decisão do secretário-geral como “suicida” porque “nunca se vai para uma guerra quando o adversário nos chama”. “Ele aguenta-se até às presidenciais. Perde as legislativas, perde câmaras nas autárquicas e o jogo também está definido nas presidenciais”, diz um socialista à CNN Portugal.
Erro 2: Escolher os nomes errados. E não é só nas listas para deputados. É também na escolha de Alexandra Leitão para Lisboa ou de Manuel Pizarro para o Porto. “Não têm hipótese”, dizem socialistas ouvidos pela CNN Portugal. Nas escolhas para as legislativas, diz Ascenso Simões, que pede para ser identificado neste artigo, “há preocupação pelo facto de não ter sido possível ter nas listas gente com estatuto superior, com uma vida pública certificada. Se nas anteriores listas estava uma parte dos antigos ministros, agora quase não há gente com experiência governativa transversal. Há um corte profundo com o passado”.
Um militante por Lisboa, também insatisfeito com as escolhas que vêm sendo feitas por Pedro Nuno Santos, olha para as listas como “uma assunção clara de um entrincheiramento político por parte do secretário-geral e de que vai perder as eleições, garantindo lugares para os que lhe são mais próximos”. “Há um desconforto desta direção nacional em relação a quem lhe faz oposição”, remata.
Erro 3: Deixar o centro vazio. Quando as sondagens confirmam uma viragem do país à direita, no Largo do Rato havia quem esperasse que Pedro Nuno Santos, cuja imagem sempre esteve mais colada à esquerda, se posicionasse ao centro. “Só deixa espaço vazio para o PSD. Ele tem uma imagem muito à esquerda, que não descola, não vende”, diz um militante.

Medina fará falta, Sousa Pinto talvez tenha feito um favor
Depois do voto na moção de confiança, Fernando Medina fez questão de entregar uma declaração de voto onde defendia que devia ter sido feito mais para evitar novas eleições. Dentro do PS, esse momento não foi visto como uma forma de contestação a Pedro Nuno Santos.
Aliás, vinca-se que a decisão do antigo ministro das Finanças em não seguir como deputado é “completamente diferente” da saída de Sousa Pinto das listas. O primeiro, dizem, terá abdicado do lugar de deputado por já não se sentir realizado no Parlamento depois de tantos anos em “cargos executivos de alta densidade” e do “desgaste” que o caso Tutti Frutti teve na sua vida.
Já Sousa Pinto, argumenta a maioria, sai “por uma questão de ego”, até porque as diferenças, pelo menos nos lugares cimeiros da lista por Lisboa, não são assim tão vincadas face há um ano. Há quem inclusive quem se alegre com essa saída voluntária, lembrando o reduzido trabalho parlamentar levado a cabo por Sousa Pinto. “Acho que não se perde nada, até há quem vai votar em Lisboa com mais alegria”, reage um antigo ministro. Estranha-se sobretudo que a decisão tenha surgido só depois da aprovação das listas, num “timing infeliz”, que apanhou todos de surpresa. Na manhã desta quinta-feira, ainda havia deputados que contactos pela CNN Portugal o davam como certo nas listas.
“Acho que a recusa do Sérgio [Sousa Pinto] tem a ver com o facto de o núcleo duro do Pedro Nuno Santos serem uns miúdos muito à esquerda”, justifica um militante que se considera moderado, que lembra o lado mediático do deputado e a sua eventual importância na hora de captar votos.
Sucessão sim, mas Medina não é o tal
Sim, no Largo do Rato já se fala em sucessão. E para já há um nome em destaque. Não, não é o de Fernando Medina, embora exista quem o encare como uma “reserva tática” do partido. Há unanimidade no PS de que a decisão do ex-ministro das Finanças nada tem a ver com o facto de estar a preparar a sucessão de Pedro Nuno Santos.
“Uma pessoa que fizesse contas para vir a ser secretário-geral fá-lo-ia no Parlamento”, reage um antigo colega de governo. Além disso, vinca-se que a Medina falta a capacidade de mobilização. E daí o nome mais expectável: José Luís Carneiro, “que tem mais partido, mais tropa no terreno” - e já disputou esse mesmo cargo com Pedro Nuno. Medina será, para muitos, o apoio que o sustentará num novo ciclo.
Chegue esse novo ciclo quando chegar, por agora admite-se que “o desconforto” que vai tomando forma no PS é também um caminho de preparação para o futuro.

Defesa de Pedro Nuno
Pedro Nuno Santos não fica sem defesa, antes pelo contrário. “Há um erro de perceção. Tem mostrado várias vezes que o tempo em que tinha uma determinada visão mais à esquerda, mais radical, como alguns gostam de apelidar, já passou”, argumenta Frederico Castro, antigo presidente da federação de Braga, uma das que gera sempre mais celeuma na hora de elaborar listas.
E remata: “o secretário-geral está de pedra e cal, até rima”. Otimismo partilhado pelo próprio Pedro Nuno Santos que, depois da comissão política que aprovou as listas com 92% dos votos, garantia isto: “podem ter a certeza que vamos ganhar”. Já o presidente do partido, Carlos César, reforçava a mensagem, falando num partido “empenhado e unido em torno da sua liderança”.
Os socialistas alinhados com Pedro Nuno Santos reconhecem à CNN Portugal que é normal que exista tensão e algum mal-estar na hora de definir nomes. “Há sempre quem diga quem fulano devia estar mais acima, que beltrano devia ter entrado”, conta um deles.
Mas a sensação, na reunião da comissão política desta quarta-feira, era de que tudo tinha corrido pelo melhor. Mesmo com a tentativa mal recebida de ter José Luís Carneiro como cabeça de lista em Coimbra, a intenção de levar Fernando Medina por Leiria ou os rumores de que Sousa Pinto não faria parte.
A CNN Portugal contactou Fernando Medina e Sérgio Sousa Pinto por mensagem, mas não obteve qualquer reação.