Candidato presidencial diz que Governo com Chega seria mau para o país e procuraria evitá-lo
O candidato presidencial António Filipe defende que uma convergência à esquerda nas presidenciais deve ser feita à volta da sua candidatura e não de António José Seguro, que considerou ter um posicionamento próximo de Luís Marques Mendes.
“Se se quer que haja uma convergência a uma candidatura à esquerda, eu creio que essa convergência deveria ser feita em torno da minha candidatura e não, com todo o respeito, em torno da candidatura de António José Seguro”, afirmou António Filipe em entrevista à agência Lusa.
Questionado se não teme que a sua candidatura, ao provocar uma dispersão de votos, possa impedir que um candidato de esquerda se qualifique para a segunda volta das presidenciais, António Filipe respondeu: “Mas o candidato de esquerda sou eu”.
“Se o objetivo é desistências a favor de um candidato de esquerda, eu pergunto: qual é o outro candidato? Porque, eu tenho muito respeito pelo doutor António José Seguro, de quem eu sou amigo há muitos anos, mas eu não considero que ele tenha um posicionamento de esquerda”, afirmou.
António Filipe defendeu que, com base nos diferentes posicionamentos políticos que teve ao longo da vida, Seguro “está mais próximo do posicionamento” de Luís Marques Mendes do que do seu.
“Portanto, não percebo que se me faça um apelo para que eu desista a favor de uma outra candidatura que eu não considero que seja uma candidatura de esquerda. O facto de ter sido líder do PS, eu creio que tem muitas responsabilidades, ao longo do seu posicionamento político, pela situação de insatisfação a que o país chegou”, afirmou.
Relativamente a Catarina Martins, António Filipe disse “respeitar muito” a sua candidatura e admitiu ter mais “convergências do que divergências” com a ex-coordenadora do BE, mas considerou ter uma “diferença fundamental”.
“É que a minha candidatura apresentou-se independentemente de quaisquer outras possibilidades de candidaturas”, referiu, salientando que “é público que Catarina Martins anunciou a sua candidatura pelo facto de o professor Sampaio da Nóvoa não ter avançado com a sua”.
“Eu, quando avancei com a minha candidatura e quando mantenho a minha candidatura, faço independentemente de qualquer candidato. Ou seja, não sou uma segunda opção. Sou uma primeira opção por considerar que tenho condições para protagonizar uma candidatura que vale por si”, disse.
Interrogado assim se sugere a António José Seguro e a Catarina Martins que desistam das suas candidaturas a favor da sua, António Filipe disse começar a “ser moda nova, quando alguém acha que o candidato que apoia não vai lá, apelar à desistência do outro”.
“Eu não me recordo de assistir a situações como esta, em que se pretende que só há condições para um candidato ganhar se os outros desistirem. Eu, brincando um pouco, podia dizer que, se todos desistirem, ganho à primeira volta”, ironizou.
Sobre o que o levou a apresentar uma candidatura à Presidência da República, António Filipe referiu que tomou essa decisão por ter sentido uma “grande inquietação” de vários cidadãos de esquerda por não haver “nenhum candidato em que se pudessem rever”.
“Todos os candidatos apresentados eram candidatos com grandes responsabilidades na situação a que o país chegou. Nenhum deles dava qualquer garantia que não fosse termos mais do mesmo”, referiu.
Questionado se se estava a referir a António José Seguro, Luís Marques Mendes e Henrique Gouveia e Melo, António Filipe disse que sim, frisando que “são candidatos que pertencem às famílias políticas que têm dominado, nas últimas décadas”, o funcionamento da democracia portuguesa.
“E eu acho que as pessoas exigem algo de diferente. Exige-se hoje, perante a situação de insatisfação que existe no país, um sobressalto cívico, de que isto não é uma inevitabilidade e que a situação das pessoas pode e deve melhorar”, referiu.
Governo com Chega seria mau para o país e procuraria evitá-lo
O candidato presidencial António Filipe afirma que procuraria evitar dar posse a um Governo liderado ou com a participação do Chega, mas, se não tivesse outra solução, ficaria vigilante para garantir que não viola a Constituição.
“Obviamente que eu considero indesejável que haja um Governo liderado ou com a participação da extrema-direita em Portugal. Acho que isso seria mau para o país, sobretudo para as camadas mais desfavorecidas”, afirmou António Filipe em entrevista à agência Lusa.
O candidato presidencial, apoiado pelo PCP, considerou que o Chega é um “defensor dos donos disto tudo” e o seu apelo “às camadas sociais mais desfavorecidas é um ato puramente demagógico” e observou que a Constituição da República não estipula que “o líder do partido mais votado tem necessariamente de ser o primeiro-ministro”.
“Portanto, eu creio que exploraria as soluções possíveis, no quadro constitucional, para evitar que a extrema-direita participasse ou liderasse o Governo”, afirmou António Filipe.
No entanto, o candidato presidencial admitiu que poderia haver cenários em que teria de dar posse a um executivo liderado ou com a participação do Chega, por não haver outra solução governativa, mas avisou que ficaria vigilante para garantir que cumpria a Constituição e respeitava o funcionamento dos órgãos de soberania.
Se não o fizesse, António Filipe salientou que a Constituição da República “prevê a possibilidade de dissolução do parlamento e de demissão do Governo se o Governo puser em causa as instituições democráticas”.
“Portanto, eu estaria obviamente vigilante relativamente ao cumprimento da Constituição em todos os seus domínios e, em caso de necessidade, teria de utilizar os poderes que a Constituição me confere para salvaguardar a democracia”, referiu.
António Filipe salientou que a sua candidatura não só se revê e defende os valores consagrados na Constituição da República, como tenciona ser uma “voz ativa” para que os poderes públicos a cumpram.
Questionado se, enquanto chefe de Estado, também se comprometeria a cumprir uma Constituição da República que tivesse sido revista pelos partidos de direita – que têm os dois terços de deputado necessários para o fazer –, António Filipe disse esperar que essa revisão constitucional não se concretize.
“Acho que seria negativo para o país que a Constituição fosse revista”, disse, observando, contudo, que a revisão constitucional não recai no âmbito dos poderes presidenciais e, portanto, só se pode limitar a dar a sua opinião sobre o tema e “esperar, de facto, que a Constituição seja cumprida e não revista”.
Sobre se, no atual quadro parlamentar, com uma direita com dois terços dos deputados, considera que o papel do Presidente da República deveria ser de atuar como contrapoder, António Filipe salientou que o chefe de Estado deve “cumprir os seus poderes e não mais do que os seus poderes”.
“Mas os poderes que tem, deve exercer. E se discordar da maioria parlamentar numa medida concreta, tem a Constituição a dar-lhe poderes para o fazer”, disse, referindo que “não hesitaria” em pedir a fiscalização preventiva de diplomas que julgar inconstitucionais ou em aqueles em que tivesse “uma discordância política profunda”, ainda que depois pudessem ser novamente confirmados pela Assembleia da República.
Interrogado qual seria o seu cunho enquanto Presidente da República, António Filipe disse que seria a “proximidade aos cidadãos” e não apenas “proximidade física”, numa alusão a Marcelo Rebelo de Sousa.
“É a proximidade relativamente a usar todas as possibilidades de intervenção no sentido de resolver aqueles que são os problemas das pessoas. Não é uma proximidade apenas de afetos – sem subestimar a importância que isso tem – mas é uma proximidade à resolução dos problemas”, disse.