A CNN Portugal falou com um economista para perceber se o país se deve preparar para uma recessão e juntou vários conselhos de poupança que podem ajudar a atenuar os efeitos de uma possível crise económica prolongada
Com a guerra na Ucrânia sem previsões para terminar, os próximos tempos não se avizinham fáceis. A inflação continua a subir e de arrasto vão os combustíveis, a habitação e as matérias-primas. Torna-se cada vez mais importante, ainda que mais difícil também, poupar.
Aproxima-se uma recessão? Para Ricardo Ferraz, professor de Economia na Universidade Lusófona e investigador no ISEG, ainda é cedo para se apontar para esse cenário. "Sabemos que as projeções mais recentes das instituições internacionais apontam para um abrandamento do ritmo de crescimento da economia portuguesa ao longo dos próximos trimestres. Mas, pelo menos para já, não prevê a entrada do país em recessão".
"Existe, no entanto, uma enorme imprevisibilidade no mundo, pelo que qualquer cenário macroeconómico possui elevada incerteza. Não sabemos quanto tempo a guerra irá durar, se haverá uma escalada do conflito, se as sanções de parte a parte se agravarão, se se verificarão interrupções no fornecimento de energia, se os preços continuarão a subir e se as taxas de juro aumentarão mais do que aquilo que já foi anunciado provocando um choque significativo no consumo e no investimento", acrescentou.
Na ótica do economista, "uma recessão económica prolongada seria certamente sinónimo de uma profunda destruição de riqueza. Se o consumo das famílias e o investimento das empresas quebrasse, então haveria falências e despedimentos".
Desde o início do ano que tudo tem ficado mais caro e os rendimentos não têm acompanhado estes aumentos. De acordo com as contas feitas por Ricardo Ferraz, "os produtos alimentares e bebidas aumentaram 7,6%" e, em conjunto, "os preços da habitação, água, eletricidade, gás e outros combustíveis aumentaram 7,7%". Só os combustíveis tiveram um aumento "astronómico de 20%". E tudo isto no espaço de cinco meses.
Para tentar atenuar estes tempos difíceis que se aproximam, a CNN Portugal falou também com Natália Nunes, do gabinete de proteção financeira da Deco. Apesar das dificuldades, ainda existem exercícios que se podem fazer no dia a dia e que ao final do mês podem fazer poupar dezenas de euros.
Da habitação, aos combustíveis e às compras de supermercado, estas são algumas das recomendações da especialista.
Transportes públicos ou carro próprio?
- Se for utilizador de transportes públicos, o principal conselho passa por encontrar o passe que melhor se adequa às suas necessidades, isto se não for utilizador do passe social único. "Por vezes, existem municípios que têm alguns descontos, para maiores de 65 anos ou para os jovens, e as pessoas desconhecem isso", lembra a Deco;
- Se viver relativamente perto do trabalho, pode sempre optar por ir a pé ou de bicicleta;
- Caso tenha mesmo mesmo de usar carro próprio, porque não existem transportes públicos que dêem resposta, opte por partilhar o carro com outras pessoas, seja com colegas de trabalho ou amigos que trabalhem no mesmo sítio ou na mesma zona. Assim poderá dividir as despesas com o combustível ou portagens;
- Antes de abastecer o carro, procure sempre comparar os preços dos vários postos de combustível e deslocar-se até aquele que praticar os valores mais acessíveis. O site da Direção-Geral de Energia e Preços pode ajudá-lo nesse pesquisa;
- Evite usar o automóvel para pequenas distâncias que pode fazer a pé;
- Tente ter uma condução mais amiga da sua carteira: evitando uma condução agressiva, tentando manter uma velocidade constante, e não andando sempre a acelerar e a travar. Mantenha a rotação do motor o mais baixa possível, usando mudanças mais altas que confiram baixa rotação.
Prepare a ida ao supermercado
De acordo com Natália Nunes, é "fundamental" que as famílias saibam "quanto é que gastam em comida mensalmente", de forma a conseguirem estabelecer metas de poupança. Depois desta análise feita, seguem as dicas mais práticas:
- Fazer uma lista antes de ir às compras. E talvez não seja boa ideia fazê-la de cabeça. O melhor é olhar para a sua dispensa e anotar aquilo que realmente lhe faz falta, para evitar comprar artigos que, afinal, ainda tinha por gastar ou consumir;
- Fazer um planeamento das refeições também pode ajudar a ter uma lista de compras ainda mais rigorosa, porque acaba por comprar apenas aquilo que sabe que vai consumir;
- Definir um orçamento. Não vá às compras sem estabelecer um teto máximo do que quer ou pode gastar. Segundo Natália Nunes, "é importante ir às compras com algum tempo" para "poder olhar e comparar todos os preços". Não se esqueça que nem sempre os preços mais em conta estão ao nível dos nossos olhos nas prateleiras, podem estar mais acima ou mais abaixo;
- Não se deixe seduzir pelas promoções. É importante ter a noção do preço original do produto sem a promoção para saber se, de facto, a promoção compensa, mesmo quando são promoções de packs;
- Ainda no campo das promoções, deve estar atento à validade dos produtos. Isto porque pode ser benéfico levar, por exemplo, dois detergentes, mas o mesmo não se aplica aos iogurtes. Se o prazo for muito curto, "corremos o risco de gastar dinheiro";
- Não vá ao supermercado com fome. Isto é um dos fatores que, por norma, leva o consumidor a comprar mais do que aquilo que verdadeiramente precisa.
Tente fazer o maior número possível de refeições em casa, procurando assim evitar o desperdício alimentar.
Está na hora de renegociar o seu crédito à habitação?
Natália Nunes lembra que o mais importante nesta área é "olhar para a nossa taxa de esforço". A prestação do crédito à habitação não deve ultrapassar os 35% do rendimento líquido. "Esta é a regra de ouro", explica.
Se a prestação do crédito à habitação ocupar cerca de 45% do seu rendimento líquido mensal, deve tentar perceber se as condições que tem são as que estão a ser praticadas no mercado. Se não estiverem, deve ligar para a instituição onde tem o crédito à habitação e tentar renegociar.
Deve também verificar se o spread está ajustado aos valores que estão a ser praticados no mercado. Como? Fazendo algumas simulações nos sites dos bancos ou no Portal do Cliente Bancário do Banco de Portugal. Estes simuladores podem ser utilizados por qualquer pessoa e são "uma boa fonte de verificação das condições".
Deve ainda verificar o valor do seguro associado ao seu crédito à habitação. Quando é feito um crédito à habitação é também feito um contrato com uma seguradora e, por norma, as pessoas esquecem-se de verificar se esses valores ainda estão ajustados. A regra é a mesma do spread, fazer simulações ou contactar mediadores de seguros.
Que custos está a pagar à banca?
Se tiver uma única conta bancária, que tem sempre custos associados, nomeadamente as despesas de manutenção, pondere pedir a transformação dessa conta numa conta de serviços mínimos bancários. Segundo a Deco, é uma forma de "reduzir custos";
Talvez já se tenha questionado se ainda faz sentido ter uma conta poupança. Natália Nunes considera que só faz se "não tiver um custo muito elevado". Para isso, "é preciso procurar e negociar". Ainda assim, uma conta poupança continua a ser a forma mais eficaz de guardar algum dinheiro de parte.
Não tendo uma conta poupança, há duas coisas que não deve fazer: guardar dinheiro poupado na sua conta a ordem, ou seja, na conta que usa todos os dias; ou ainda guardar dinheiro num envelope em casa.