"Repreensão descomunal", "puxão de orelhas", "alerta grave": o que se diz lá fora sobre o discurso de Marcelo

5 mai 2023, 12:33
Marcelo Rebelo de Sousa. Lusa

O Presidente da República fez uma declaração ao país, esta quinta-feira, cheia de recados e avisos ao Governo. Uma intervenção que não passa despercebida na imprensa internacional

 
"Rebelo de Sousa repreende com dureza o primeiro-ministro, mas não convoca eleições". É este o título do jornal El País para o artigo que atualiza os últimos desenvolvimentos sobre a crise política em Portugal. O jornal espanhol escreve que para o Presidente da República português pesou mais o desejo de "garantir a paz institucional" ao de impor medidas mais drásticas, naquele que considera ser o "choque mais frontal e visível" entre Marcelo e António Costa.
 
O El País destaca que Marcelo "foi direto" na declaração que fez ao país, esta quinta-feira, ao assinalar uma "divergência de fundo" com o primeiro-ministro sobre a atuação de João Galamba e sobre as condições do ministro para continuar a liderar a pasta das Infraestruturas. O jornal vai mais longe, considerando que Portugal assistiu a uma "repreensão descomunal" em direto, "no horário de maior audiência, às 20:00".
 
O artigo sublinha que o Presidente português optou, ainda assim, por não convocar eleições porque "uma nova campanha eleitoral, quando apenas passou um ano e três meses desde a anterior, seria um fator de instabilidade a juntar à situação de incerteza económica, que foi impulsionada pela guerra na Ucrânia e pelos seus efeitos colaterais". Por outro lado, escreve a jornalista Tereixa Constenla, o Presidente português "teme que a única possibilidade de haver uma mudança no Governo com um primeiro-ministro do Partido Social-Democrata implique o apoio da extrema-direita, do partido Chega" e isso é algo que Marcelo "não deseja facilitar".
 
O jornal sublinha que o chefe de Estado deu um grande "puxão de orelhas a António Costa", o que representa uma mudança importante no relacionamento entre os dois. O jornal recorda que, até aqui, o relacionamento institucional entre o Presidente e o primeiro-ministro era tão bom que até levou o Partido Socialista a não apoiar Ana Gomes na candidatura à Presidência. "O facto de um ser socialista (Costa) e outro conservador (Marcelo) não tinha, até agora, causado graves contratempos e a boa relação entre os dois até levou o Partido Socialista a não apoiar oficialmente a sua própria candidata à Presidência da República, Ana Gomes, nas últimas eleições e a defender a continuidade de Rebelo se Sousa", recorda o jornal.

No Brasil, também há ecos do discurso de Marcelo Rebelo de Sousa. O G1 destaca em título "Presidente de Portugal não dissolve Parlamento, mas diz que será mais assertivo com governo". O artigo começa por referir que os últimos dias foram de grande "tensão" entre o Presidente da República e o primeiro-ministro e que se colocava a hipótese de Marcelo dissolver o Parlamento, o que não aconteceu.

O G1 destaca que a declaração do chefe de Estado português, transmitida pela televisão, foi cheia de "avisos" ao Governo, com Marcelo a afirmar que o Executivo tem de "preservar a sua credibilidade". O texto sublinha ainda que Marcelo prometeu ser "mais assertivo" no seu relacionamento com o Governo, mas que preferiu que o país não fosse para eleições antecipadas por considerar que, neste momento, "o mais importante é a estabilidade política para ajudar os portugueses a lidar com a inflação". "Apesar de não ter dissolvido o Parlamento, Marcelo Rebelo de Sousa disse que o poderia fazer se o Governo perder credibilidade", acrescenta o G1.

O artigo vinca depois que António Costa "é um dos líderes de governo mais fortes e consolidados da Europa", estando "no poder desde 2015", mas que "vive um terceiro mandato complicado". "Mais de dez ministros e secretários de Estado deixaram os seus cargos no ano passado, dois deles ligados a um escândalo na companhia aérea TAP, desencadeado por uma indemnização irregular a um membro do conselho", lê-se no texto.

Por outro lado, Marcelo Rebelo de Sousa é descrito como "uma figura carismática, frequentemente vista no supermercado" ou "a comer gelado nas ruas de Lisboa", lembrando o G1 que o Presidente "foi eleito pela primeira vez em 2016 e reeleito em 2021 por uma vitória esmagadora". "A crise política entre os dois líderes complicou a situação de Portugal, que já vive um cenário de inflação e de altas taxas de juros", nota-se no texto.

Também a agência de notícias Reuters, cujo serviço é utilizado por vários órgãos de comunicação em todo o mundo, dá conta de que o Presidente "advertiu o primeiro-ministro", mas decidiu "manter o Parlamento". O texto, assinado por Sergio Goncalves e Andrei Khalip, refere que o Presidente de Portugal dirigiu um "alerta grave" ao primeiro-ministro, depois da rutura no relacionamento entre os dois ter colocado o país "à beira de uma crise política total".

A Reuters cita os analistas para dizer que "a possibilidade de eleições antecipadas resultarem num parlamento fragmentado e num governo instável provavelmente impediu o Presidente de usar medidas mais drásticas". O artigo destaca que Marcelo avisou o governo de maioria socialista que "tem trabalho a fazer para preservar sua credibilidade" e prometer "ser mais assertivo em seu relacionamento com o Governo".

O Presidente da República fez uma declaração ao país, esta quinta-feira, cheia de recados e avisos ao Governo. Marcelo assumiu que existe uma "divergência de fundo" com o primeiro-ministro, na sequência do caso que envolve o ministro João Galamba, mas escolheu a estabilidade, não demitindo o Executivo nem dissolvendo o Parlamento.

Marcelo Rebelo de Sousa recordou que "no passado, com maior ou menor distância temporal, foi sempre possível acertar agulhas" com o primeiro-ministro em diversas matérias", mas "desta vez não". O chefe de Estado disse ainda que "o que sucedeu terá outros efeitos no futuro": "Terei de estar ainda mais atento à questão da responsabilidade política e administrativa dos que mandam."

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