Uma equipa de investigadores do William James Center for Research do Ispa-Instituto Universitário estudou o potencial do casal enquanto unidade num processo de perda de pesa de um dos elementos
Um estudo elaborado por uma equipa que inclui investigadores portugueses sugere que o seu parceiro ou a sua parceira pode ser o melhor aliado num processo de perda de peso, mas também o pior inimigo.
Trata-se do primeiro estudo que analisa o potencial do casal enquanto unidade num processo de perda de peso de um dos dois. Para tal, os investigadores fizeram entrevistas a 115 casais nos quais pelo menos um dos elementos tem obesidade (apenas em 23 casais ambos eram obesos). Os casais tinham, em média, 45 anos e coabitavam há, pelo menos, 17 anos.
Entre outros aspetos, os investigadores conseguiram perceber que o parceiro da pessoa que deseja perder peso tanto pode ser um fator de motivação como de desmotivação na mudança de comportamentos para atingir esse objetivo.
À CNN Portugal, a investigadora e professora Filipa Pimenta, que orientou o estudo, explica que há casos em que o parceiro ou a parceira fica com “ciúmes” e "desconfiança" perante a possibilidade de mudança de comportamentos do companheiro, o que desmotiva o processo de perda de peso. Frases como “Vais perder peso porquê? Para quem? Eu sempre te conheci assim e gosto de ti assim”, refletem isso mesmo, aponta.
Por outro lado, também há casos em que o parceiro ou a parceira desincentiva a perda de peso com a oferta de “refeições calóricas” que o elemento que quer perder peso não consegue rejeitar. “Algumas pessoas dizem ‘eu sei que precisava de perder peso, mas ele ou ela por norma faz-me o jantar e é sempre tudo tão bom, como é que eu vou dizer não a isso?’”, exemplifica a investigadora.
“Ou seja, não só temos aqui o fator de desconfiança ou de resistência à mudança por parte do parceiro ou parceira, como também temos a oferta de refeições muito investidas e muito calóricas”, resume.
Para a professora, estes dados refletem a importância de “intervir num processo de perda de peso, considerando o casal e não apenas o indivíduo”. “Para intervirmos na perda de peso e na gestão do peso, temos aqui um excelente potencial que ainda não está a ser tão bem aproveitado como poderia, que é esta unidade do casal. Ainda para mais, esta unidade concorda em relação a uma série de estratégias que podem ser o início de uma história de sucesso.”
Os resultados do estudo mostram precisamente que os dois elementos do casal inquiridos concordam em várias estratégias para a perda de peso, nomeadamente estabelecer objetivos na alimentação, procurar ajuda profissional para gerir o peso, utilizar equipamentos para fazer atividade física ou pagar a mensalidade de um ginásio, entre outros.
Por isso, os investigadores acreditam que, num casal, os dois elementos devem trabalhar em conjunto quando um dos membros procura perder peso. “A obesidade pode ser reforçada por fenómenos partilhados e construídos no casal, tal como a mudança pode ser facilitada se for implementada em conjunto com o parceiro. Por isso, uma nova linha de abordagem à mudança de comportamento, que conduza a uma saudável gestão do peso, pode e deve passar por esta unidade: o casal”, explica a investigadora.
"Se nós juntarmos o parceiro à intervenção [para a perda de peso], imaginem o potencial que isto tem do ponto de vista da mudança", sugere Filipa Pimenta.
Isto não significa que o parceiro ou a parceira tenha de ter um envolvimento ativo, como fazer exercício físico em conjunto, ressalva a investigadora. Mas sim um "outro tipo de apoio que pode ser igualmente importante". Por exemplo, acrescenta, se um quer fazer uma caminhada, o outro elemento do casal manifesta disponibilidade para ficar em casa com os filhos, fazer o jantar, entre outros.
Quase metade dos casais admite que a obesidade tem impacto negativo na vida a dois
O estudo, elaborado pelos investigadores Inês Queiroz Garcia, Filipa Pimenta, João Marôco e Amy Gorin, concluiu que 47% dos casais considera que a obesidade tem um impacto negativo na relação a dois, nomeadamente ao nível da saúde (85%), na atividade física (71%), alimentação (62%) e no funcionamento sexual (42%).
Embora 63% dos casais inquiridos considerem que a obesidade de pelo menos um dos elementos é um problema de ambos, este não é um tema abordado pelo casal (54% dos casais diz mesmo "nunca" falar sobre o assunto). Talvez por essa razão, apenas 48% dos casais assume predisposição para trabalhar em conjunto na gestão do peso.
"Temos muitos casais que, apesar de perceberem o impacto da obesidade na vida sexual, na relação de casal, na saúde - não estão a falar sobre este problema. E isso é determinante para a ação", argumenta Filipa Pimenta.
Os resultados do estudo COuples’ OBesity Initiative foram divulgados no passado dia 4 de março a propósito do Dia Mundial da Obesidade e, segundo os investigadores, mostram que "ainda predomina a ideia de que a obesidade é algo que decorre apenas de aspetos individuais".
"Ainda não se valoriza suficientemente o potencial que o casal tem para auxiliar na mudança de comportamentos que possam implicar uma diminuição do peso e uma melhoria no estado de saúde”, salienta a professora Filipa Pimenta. E é precisamente essa a ideia que este estudo pretende refutar.