Jogou nos grandes, foi ao Mundial e aposta em marketing de rede

11 jun 2020, 09:32

Paulo Santos defendeu as balizas de Sporting, Benfica, FC Porto e Sp. Braga, jogando com nomes como Figo, Rui Costa, Deco e Cristiano Ronaldo. Agora, é empresário.

«Depois do Adeus» é uma rubrica dedicada à vida de ex-jogadores após o final das carreiras. O que acontece quando penduram as chuteiras? Como sobrevivem os que não ficam ligados ao futebol? Críticas e sugestões para o email vhalvarenga@mediacapital.pt.

Paulo Santos teve uma carreira ao mais alto nível em Portugal. Foi campeão da Europa de sub-16 em 1989, representou a seleção nacional no Mundial de 2006 e defendeu a baliza dos principais clubes: primeiro Sporting, depois Benfica, FC Porto e Sp. Braga.

O antigo guarda-redes iniciou a carreira no Sporting, a par de Luís Figo, encontrou Rui Costa quando rumou aos juniores do Benfica, sagrou-se campeão nacional pelos encarnados na temporada 1993/94, jogou num FC Porto com José Mourinho, Vítor Baía e Deco e chegou finalmente à seleção principal quando representava o Sp. Braga.

Após o fim da carreira, em 2012, Paulo Santos tirou o curso de treinador mas acabaria por seguir um caminho totalmente diferente. Em 2016, apostou em marketing de rede, uma forma de negócio assente em autoconsumo de suplementos naturais da 4Life e recomendação dessa forma de negócio, para além do consumo, a outras pessoas.

Paulo Santos diz que foi uma das melhores decisões da sua vida. Esta é a sua história.

Maisfutebol – Paulo, o que aconteceu desde 2012, ano em que terminou a carreira, quando estava no Rio Ave?
Paulo Santos - Tinha possibilidades de continuar mas já não me sentia motivado. Montei um negócio tradicional, um instituto de beleza, que é gerido pela minha mulher. Quanto a mim, tirei o curso de treinador, tenho o III Nível e só me falta um para chegar ao grau de elite. Ou seja, posso desempenhar o meu papel em qualquer equipa do Mundo. Mas os convites que me chegaram não me interessaram.

O que aconteceu depois?
Surgiu a oportunidade de desenvolver o meu próprio negócio, tomei essa decisão há quatro anos e foi uma das melhores decisões que tomei na minha vida. O Mundo passa uma dificuldade muito grande, em que muita gente perdeu os seus ordenados, em que muita gente saiu do confinamento e encontrou as portas dos seus empregos fechadas e ainda este mês e sobretudo no próximo será pior. Eu, por outro lado, neste mês e meio continuei a minha atividade, fui ganhando dia a dia cada vez mais dinheiro.

Em que é que consiste esse negócio?
Não sou vendedor, desenvolvo a minha rede de autoconsumo empresarial. Através do meu autoconsumo, cuido da minha saúde, partilho isso com os outros e por cada pessoa que eu conecte à empresa (4Life), a empresa paga-me uma percentagem por isso. Sou empresário e faço parte de um grupo de empresários internacionais chamado SEN, Social Economic Networkers.

É um intermediário, então?
A UBER, por exemplo, não tem carros. Faz a conexão entre o motorista e a pessoa que quer ser transportada e ganha uma percentagem com isso. É isso que eu faço, dentro da suplementação natural. De todo o volume que eu faço, 36 por cento vai para a empresa, 64 por cento para mim. Para além disso, há o rendimento residual. Tudo o que construir aqui vai dar para a minha vida toda, porque a minha equipa continuará a crescer. Tive de fechar o instituto de beleza por causa da pandemia e o único meio de subsistência foi este. Abrimos agora de novo porque tenho este negócio que pode suportar o negócio tradicional.

Isso não é um esquema em pirâmide?
Não. Uma pirâmide não tem produto nem serviço. Uma pirâmide é ilegal em qualquer parte do Mundo, eu nunca estaria ligado a algo assim. Isto é marketing multinível puro, a empresa está certificada. Adoro fazer isto e já criei uma página onde me podem contactar, a Perfect Social Business.

Já tem jogadores ou ex-jogadores a trabalhar consigo?
Tenho alguns e uma das nossas missões é levar isto aos jogadores de futebol. O jogador tem de perceber que a passagem pelo futebol é curta, tem de parar de pensar que tudo é facilitismo. Os jogadores vivem num mundo à parte e tudo parece fácil. Que todos os jogadores de futebol comecem a abrir a sua mente porque cada vez mais é difícil encontrar empregos tradicionais depois de acabar. Posso garantir aos jogadores que isto permite um rendimento considerável, mais do que ganham atualmente.

E por falar em futebol, que balanço faz da sua carreira?
Sinto muito orgulho daquilo que eu construí, que foi sempre a pulso. Comecei no Sporting, fui para o Benfica, tive de começar do zero, comecei a carreira sénior no Mirense, fui por aí. Sei perfeitamente o que é estar numa equipa pequenina, numa média e numa grande.

O que recorda do Euro de sub-16 e o Mundial de sub-17 em 1989?
Fizemos um Europeu fantástico, éramos claramente a melhor equipa e éramos os favoritos a ganhar o Mundial. Foi aqui que as coisas não começaram bem por parte da FIFA, tenho de dizer isto. Estávamos num grupo, puseram-nos noutro, para tornar as coisas mais difíceis. Passámos o grupo mas foi nesse grupo que tudo aconteceu. Aquilo que me aconteceu, ser suspenso pela FIFA por um ano, com 16 anos, foi deveras pesado e não tenho dúvidas de que pesou na minha carreira.

Portugal estava a defrontar a Guiné-Conacri e, a certa altura, diz-se que o Paulo Santos baixou os calções para os adeptos escoceses. Foi isso?
Aquilo não foi baixar os calções, foi só um segundo em que as coisas aconteceram, não há imagens, não há fotografias, mas eles entenderam assim, porque éramos candidatos a ganhar o Mundial, eu fui reconhecido como melhor guarda-redes do Europeu e se calhar aproveitaram aquele momento para mandar para fora um jogador importante de Portugal. Não se justifica o que fiz, mas era novo e nessa altura já tinham acontecido coisas muito piores a nível sénior.

Entretanto o Paulo saiu do Sporting, vai para o Benfica, é emprestado mas volta. Fez parte do plantel principal na época 1993/94, e foi utilizado na última jornada, frente ao Boavista. Como foi esse ano?
Foi um ano espetacular. Nem os jornais davam nada por nós, todos diziam que o campeonato ia ser disputado entre o Sporting e o FC Porto, mas fomos campeões a um mês do final do campeonato. No dia em que fomos campeões, em Braga, frente ao Gil Vicente, foi brutal. Ainda havia as portagens de Sacavém, foi trânsito desde aí até ao Estádio da Luz, foi incrível. Um mês depois, em que jogámos no Bessa, aconteceu a mesma coisa.

Seguiram-se Penafiel, três anos e meio no Estrela da Amadora e dois anos e meio no Alverca, antes de chegar ao FC Porto. O que encontrou por lá, em 2001?
Nessa época do FC Porto havia cinco guarda-redes: eu, Ovchinnikov, Vítor Baía, Pedro Espinha e Hilário. Saí do Alverca com uma lesão, uma hérnia, começo a época a ser operado, foram todos de estágio para França, eu fiquei no Hospital da Trofa a ser operado. Mas tinha um foco tão grande, queria ser titular do FC Porto e consegui fazê-lo em pouco tempo.

Ainda fez 14 jogos na primeira época, alguns dos quais já com José Mourinho no banco. Foi como ser treinado por ele e também ter lutado pela baliza com o Vítor Baía?
O Vítor Baía é o jogador que mais títulos ganhou no Mundo, um excelente guarda-redes e um grande amigo, temos uma amizade brutal. Quanto ao Mourinho, não me esqueço quando disse: ‘eu vou ser campeão’. Não me lembro de alguém dizer aquilo, até ali. Acho que ele disse aquilo porque sabia onde estava, os jogadores que tinha. Para nós fez todo o sentido dizer aquilo. Porém, na época seguinte, decidi sair em dezembro. Não estava contente com aquilo que se estava a passar comigo e fui para o Varzim.

Varzim, FC Porto B e finalmente o Sp. Braga, onde joga quatro épocas. Foi a sua melhor fase como guarda-redes?
Foi onde tive mais reconhecimento. No FC Porto fiz grandes jogos, não só no campeonato como na Liga dos Campeões, mas quando não se ganha nada, é normal que não fique na memória. É no Braga que as coisas se tornam diferentes, conseguimos feitos muito grandes, chegamos a ser a equipa menos batida da Europa e eu fui o guarda-redes menos batido do campeonato. O que o Braga é hoje, deve muito a esse grupo. Lembro-me do primeiro jogo em Braga, amigável, contra o Benfica, quando entrei no estádio era só benfiquistas, mesmo do lado dos bracarenses. Mudámos isso. Hoje em dia, o Benfica vai lá, o Sporting, o FC Porto, só têm um espacinho para os seus adeptos, o resto são bracarenses. Conseguimos mudar essa mentalidade do bracarense, que estava dividido entre o Benfica e o Sp. Braga.

O Paulo acaba por ir ao Campeonato do Mundo de 2006 devido à lesão do Bruno Vale. O que sentiu?
Foi de uma maneira ingrata, merecia ter ido de outra maneira e digo mais, merecia ter ido à seleção muitas mais vezes. Fiz grandes épocas, recordo-me que no Estrela da Amadora chegámos a ser a quarta defesa menos batida, num ano em que só havia dois guarda-redes portugueses no campeonato, eu no Estrela e o Tó Luís no Boavista. Fui ao Mundial e penso que é algo que todos os jogadores deviam presenciar, é uma vivência brutal.

Em 2008 saiu do Sp. Braga e foi para o Odivelas. Porquê?
Não saí a bem com o Sp. Braga, meteram-me a treinar à parte, não foram corretos comigo. Tive de tomar a difícil decisão de ir para tribunal com o Braga. Fui treinar com o Odivelas do Paulo Fonseca, depois fui para a equipa do Sindicato de Jogadores, apareceu uma proposta do Estoril, estive lá uma época e surgiu o Rio Ave.

Foi uma boa forma de terminar a carreira como guarda-redes?
Foi bom por muitos motivos. Já tinha 38 anos, estava com guarda-redes jovens, sei que o treinador (Carlos Brito) não foi muito favorável à minha ida para o Rio Ave, no início foi complicado mas acabei por entrar no onze e as coisas começaram a mudar a partir daí. No ano a seguir, comecei a jogar, essa equipa técnica tinha ido buscar um guarda-redes ao Brasil e do nada meteram-no a jogar. Foi quando decidi que estava na hora, já não estava com paciência de aturar esse tipo de coisas. Tive convites para continuar mas cansei-me.

Em jeito de balanço, quais foram os melhores jogadores com quem jogou?
Joguei com o Figo no Sporting, começámos juntos nos iniciados, fizemos uma época apenas com vitórias e até vencemos o campeão de Espanha, o Bétis de Sevilha, é como se fossemos campeões ibéricos. Apanhei o Rui Costa nos juniores e nos seniores do Benfica, depois o Deco no FC Porto, desse nem se fala, e o Cristiano Ronaldo na seleção. Esses quatro são de outro nível, jogavam muito. Mas gostava de falar de outro: o Nem, que foi meu central no Sp. Braga. Chegou aqui todo arrebentado, com peso a mais, mas era um grande craque. Com aquele peso todo, estamos a falar de dez quilos para cima, mas tinha uma inteligência muito grande e era tecnicamente evoluído, mesmo com o peso conseguia jogar muito no futebol de alta competição.

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