opinião
Sócio Administrador da J. Pereira da Cruz, S.A

Patentear o simples

30 mar 2023, 17:28

Hoje em dia, o uso estratégico de mecanismos de proteção da propriedade intelectual paira numa utopia situada entre a positividade da aquisição de vantagens competitivas face à concorrência e na forma pejorativa com que é associada a um entrave à difusão tecnológica. Esta visão de uma moeda de duas faces distintas, faz com que as patentes sejam consideradas por muitos, um mal necessário.

Uma ideia, totalmente errada, a meu ver que padece de uma adesão à realidade. Um argumento falacioso que a história tem vindo a descodificar. Por muito protegida que uma inovação esteja, a necessidade que a mesma veio suprimir (ou em alguns casos, criar) não é passível de proteção. Inovar, por vezes, implica até uma alteração de perceção da realidade que se assume de uma forma tão radical que altera os nossos hábitos e as nossas necessidades. 

Pensemos nas necessidades criadas pelas inovações no campo da comunicação, desde o advento do telemóvel. Não existiu uma única patente que impedisse a evolução constante deste dispositivo, nem o seu impacto, quer na economia, quer nos hábitos sociais, de trabalho ou culturais. Aliás, pelo contrário. As patentes garantiram que o fluxo de inovação prosseguiu dentro das organizações, criando valor, resolvendo problemas, respondendo a necessidades e criando perspetivas e utilizações com impacto real. No mesmo caminho, seguiu também a concorrência que avançando com novas soluções, muitas vezes respondeu de uma forma mais eficaz do que a do “inventor inicial”. 

Neste ponto, a história da inovação tecnológica está repleta de exemplos, nos quais a inovação protegida, mostrou-se insuficiente. Parafraseando, Kalyan C. Kankanala, a questão prende-se com a forma como damos utilidade à patente que temos. Traduzindo as palavras numa linguagem corrente, não proteger a propriedade intelectual, equivale a atravessar uma pista de Fórmula 1, em dia de corrida, de olhos vendados. Isto para dizer que os resultados só por milagre poderão ser neutros e nunca chegarão a ser bons. 
Neste sentido e tendo em conta que entramos num ano que promete ser extremamente desafiante, devido ao contexto que vivemos, é fundamental descodificar que desafios e tendências estarão presentes no ramo das patentes. 

Devido ao seu notório e rápido crescimento, o ato de patentear, na maioria dos países, tem se constituído algo muito atrativo para os inventores. Certo é que para isso, as recentes e importantes mudanças com vista a reforçar os direitos das patentes (como expandir a sua área de cobertura ou a facilidade de aplicação) tiveram um papel significativo. 

Assim, existe um ponto que me parece extremamente interessante de abordar quando falamos em desafios futuros: A necessidade de encorajar tendo em vista o desenvolvimento de mercados de tecnologias. 

Vejamos, a expansão dos mercados tecnológicos é o exemplo perfeito de uma patente que funciona bem, visto que estes mercados asseguram uma melhor circulação da tecnologia. Não menos verdade é o facto de que poder-se-á argumentar que mercados como este são alvo de certos fracassos. Aqui, também os governos poderão ter um papel importante. Uma redefinição da política não só permitirá apoiar o desenvolvimento de mercados para a tecnologia, como também a dissuasão de barreiras que possam dificultar o seu investimento. 

As recentes evoluções na ciência e na tecnologia, bem como na política das patentes e no progresso económico têm constituído uma dualidade de posicionamentos no que à análise de patentes diz respeito. Se por um lado estas podem dificultar a inovação, por outro poderão ser a chave para a sua difusão. A relação entre patentes, inovação e economia é algo bastante complexo, contudo conseguir que estes três conceitos coabitam em harmonia constituir-se-á um instrumento político extremamente eficaz e útil.

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