Morte do polícia Fábio Guerra. 20 anos de prisão para Cláudio Coimbra e 17 para Vadym Hrynko

2 jun 2023, 13:07
Arguido muda versão dos acontecimentos depois de ser confrontado com imagens do ataque a Fábio Guerra

Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko foram considerados culpados da morte do agente da PSP. Olhos nos olhos, a juiz questionou os arguidos: "Como é que os arguidos podem dizer que se estão a defender quando já estão as vítimas no chão? Como?"

Cláudio Coimbra foi condenado a 20 anos de prisão, Vadym Hrynko a 17 anos. Os dois ex-fuzileiros, acusados da morte do agente da PSP Fábio Guerra, 26 anos, após agressões à porta de uma discoteca em Lisboa, em março de 2022, conheceram esta sexta-feira a sentença. 

Em tribunal ficou provado, segundo a juiz presidente Helena Susano, que as lesões provocadas pelas agressões foram a causa da morte de Fábio Guerra.

Cláudio Coimbra é culpado de homicídio na forma consumada (a morte de Fábio Guerra), dois homicídios na forma tentada (às vítimas João Gonçalves e Cláudio Pereira) e ofensas à integridade física. A juiz aludiu ao relatório social sobre este arguido que fala sobre a sua "falta de autocontrole". Tem antecedente criminais.

Vadym Hrynko é considerado culpado de um crime de homicidio (Fábio Guerra) e outro na forma tentada (João Gonçalves). Também é considerado culpado de ofensas à integridade física.

Já depois de conhecida a sentença, o advogado de defesa de Vadym Hrynko confirmou à TVI e à CNN Portugal que o jovem vai recorrer da sentença de 17 anos de prisão. “Se isto não é legítima defesa, peço imenso desculpa, está na hora de estudar novamente Direito”, disse José Teixeira da Mota à saída do tribunal. 

A leitura da sentença foi recebida com lágrimas na sala de audiências - da mãe de Fábio Guerra e também da mãe de Vadym Hrynko. 

O que ficou provado

O tribunal deu como provado que Cláudio Coimbra deu três violentos pontapés na cabeça de Fábio Guerra. Por outro lado, nas imagens não é perceptível se Vadym Hrynko deu pontapés ao agente da PSP. E fica claro que o polícia tentou defender Cláudio Pereira, a primeira pessoa a ser agredida junto ao Mome.

"É irrefutável  que os arguidos tinham consciência da sua superioridade física", lê a juiz, acrescentando que era "como se estivessem num ringue de boxe", mas, afirmou ainda, "no boxe, quando o adversário está no chão não se agride"

Na leitura do acórdão, a juiz presidente Helena Susano apontou maior responsabilidade a Cláudio Coimbra, mas, dirigindo-se aos dois arguidos, assinalou vários testemunhos que corroboram a versão de que os ex-fuzileiros agrediram várias pessoas que se encontravam junto ao Mome, na avenida 24 de julho, na madrugada de 19 de março, quando tudo aconteceu.

Apontou ainda que as versões dos arguidos no interior da discoteca são contraditórias - "apenas tentam expressar a mesma estratégia em tribunal".

Segundo o acórdão, o que origina as agressões no exterior da discoteca começa no seu interior quando Cláudio Pereira, inconformado de ter sido expulso da mesma e depois de ter sido agredido por Cláudio Coimbra, lhe vai pedir explicações já na rua. Segundo a juiz presidente, Cláudio Pereira estava a sangrar quando fez pagamento.

As imagens de uma das câmaras de vigilância no exterior do Mome prova, segundo a juiz presidente, que Cláudio Coimbra deu dois pontapés com muita intensidade já com Cláudio Pereira no
chão. Perdeu os sentidos, foi protegido por um segurança. "Só a atitude do segurança impediu que houvesse mais pontapés certeiros na cabeça", diz. 

Olhos nos olhos, a juiz questionou os arguidos: "Como é que os arguidos podem dizer que se estão a defender quando já estão as vítimas no chão? Como?". Ao longo da leitura do acórdão, Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko, sentados lado a lado, foram trocando impressões.  

Apesar de algumas contradições, a juiz considerou que "há um núcleo homogéneo nas declarações dos agentes que vieram a tribunal". No entanto, não ficou provado que os agentes se identificaram como tal. 

Eram 11.52 quando a juíz presidente Helena Susano começou a leitura do acórdão do julgamento dos dois arguidos, após dois adiamentos. Os pais de Fábio Guerra estiveram presentes em todas as sessões e esta sexta-feira não foi exceção. 

À porta do tribunal, depois de conhecida a sentença, o advogado da família de Fábio Guerra, Ricardo Serrano Vieira, defendeu penas mais altas. “A única coisa que vamos agora refletir diz respeito à pena parcelar do homicídio qualificado no que diz respeito ao agente Fábio Guerra”, afirmou. 

Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko chegaram cedo ao tribunal, entrando pela garagem do Campus de Justiça. Ambos estavam em prisão preventiva. Durante a leitura do acórdão foram trocando impressões entre si. 

Um arguido em silêncio, o outro pediu desculpa

Com a leitura da sentença dos arguidos da morte de Fábio Guerra chega ao fim o julgamente dos ex-fuzileiros Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko, ambos de 23 anos. 

As quatro sessões do julgamento, no Campus de Justiça, em Lisboa, ficaram marcadas pela presença, emocionada, da mãe de Fábio Guerra e pelos testemunhos dos colegas do jovem e de um dos arguidos. 

Se Cláudio Coimbra quis manter o silêncio, Vadym Hrinko, que começou por negar quaisquer agressões, acabaria por admitir os factos perante as imagens de videovigilância que serviram de prova em tribunal e pediu desculpa à família do agente da PSP. “Quero dar-vos os meus sentimentos sinceros. Ninguém merece passar por isto. A única coisa que posso dizer é pedir desculpa”. 

Agessões à porta de discoteca de Lisboa 

O que aconteceu em março de 2022 terá começado ainda dentro da discoteca Mome, na avenida 24 de Julho, em Lisboa, de madrugada. Um jovem envolveu-se numa discussão com Cláudio Coimbra, saiu do estabelecimento norturno, ficou à espera do ex-fuzileiro, envolveram-se numa luta que acabou com este homem no chão e a tentativa de apaziguamento dos agentes da PSP que também estavam na discoteca. Entre eles, Fábio Guerra, que tinha 26 anos e morreu no hospital dois dias depois. 

Em tribunal, várias testemunhas descrevem um cenário de grande violência à porta do Mome. Uma delas contou ter visto que um dos arguidos "tinha treino em artes marciais ou em boxe pela maneira como ele se mexia”, explicou, identificando Cláudio Coimbra. “Não me lembro do que tinha vestido e notava-se que treinava, era composto.” Explicou ainda: “Esse arguido [Cláudio Coimbra] era o centro da pancadaria. A cada murro que ele mandava havia uma pessoa que caía ao chão”.

O Ministério Público (MP) pediu condenação dos ex-fuzileiros Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko pelo homicídio qualificado do agente da PSP Fábio Guerra, reforçando que o primeiro seja punido com pelo menos 20 anos de prisão.

Clóvis Abreu continua desaparecido

Uma peça continua a faltar neste puzzle. Clóvis Abreu, também arguido neste processo, está desaparecido, mais de um ano depois. O seu representante, Aníbal Pinto, garante que está pronto para se entregar à justiça, mas que não teria sido notificado, declarações desvalorizadas pelo diretor nacional da PJ. 

Em declarações aos jornalistas à saída do Juízo Central Criminal de Lisboa, onde prestou depoimento como testemunha no julgamento dos ex-fuzileiros Cláudio Coimbra e Vadym Hrynko, Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária, desvalorizou as declarações do representante de Clóvis Abreu. 

“Nós não vamos desistir e temos uma coisa que nem todos têm, que é tempo. Temos todo o tempo do mundo, temos o nosso esforço, o nosso querer, a nossa motivação e que vai naturalmente continuar”, afirmou Luís Neves.

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