Medicamentos populares para perda de peso e diabetes associados a risco acrescido de uma forma rara de cegueira

CNN , Deidre McPhillips
21 jul 2024, 09:00
O risco de uma doença rara que provoca cegueira pode ser elevado em pessoas com diabetes ou obesidade que tomam Ozempic ou Wegovy, sugere um estudo. Mario Tama/Getty Images

Esta condição é relativamente rara - até 10 em cada 100.000 pessoas na população em geral podem sofrer dela - mas os médicos observaram três casos numa semana, e todos esses pacientes estavam a tomar medicação com semaglutida

As pessoas que tomam Ozempic ou Wegovy podem ter um risco acrescido de desenvolver uma forma rara de cegueira, sugere um novo estudo. No entanto, os médicos afirmam que este facto não deve dissuadir os doentes de utilizar estes medicamentos para tratar a diabetes ou a obesidade.

No verão passado, médicos do Mass Eye and Ear, hospital especializado em oftalmologia localizado em Boston, Massachusetts, nos EUA, observaram um número invulgarmente elevado de doentes com neuropatia ótica isquémica anterior ou NOIA, um tipo de derrame ocular que provoca uma perda de visão súbita e indolor num dos olhos.

Esta condição é relativamente rara - até 10 em cada 100.000 pessoas na população em geral podem sofrer dela - mas os médicos observaram três casos numa semana, e todos esses pacientes estavam a tomar medicação com semaglutida.

Uma análise retrospetiva de seis anos de registos médicos mostrou que as pessoas com diabetes tinham quatro vezes mais probabilidades de serem diagnosticadas com NOIA se tomassem semaglutida, e as pessoas com excesso de peso ou obesas tinham sete vezes mais probabilidades de sofrer da doença se tomassem a medicação. Verificou-se que o risco era mais elevado no primeiro ano após a prescrição de semaglutida.

O estudo, publicado na revista médica JAMA Ophthalmology, não pode provar que os medicamentos à base de semaglutida causam NOIA. E o pequeno número de pacientes - uma média de cerca de 100 casos por ano - de um centro médico especializado, pode não ser aplicável a uma população mais alargada.

A Novo Nordisk, fabricante dos únicos medicamentos à base de semaglutida nos EUA, sublinhou que os dados do novo estudo não são suficientes para estabelecer uma associação causal entre a utilização de medicamentos à base de semaglutida e a NOIA.

"A segurança dos doentes é uma prioridade máxima para a Novo Nordisk e levamos muito a sério todos os relatórios sobre efeitos adversos resultantes da utilização dos nossos medicamentos", escreveu um porta-voz da empresa num email enviado à CNN.

As prescrições de semaglutida dispararam nos EUA, o que pode aumentar o número de pessoas em risco de um potencial efeito secundário. E o NOIA é a segunda principal causa de cegueira do nervo ótico, a seguir ao glaucoma.

Mas mesmo com um risco acrescido, a doença continua a ser relativamente pouco frequente.

"A utilização destes medicamentos disparou nos países industrializados e proporcionou benefícios muito significativos em muitos aspetos, mas as discussões futuras entre um paciente e o seu médico devem incluir o NOIA como um risco potencial", defendeu o investigador principal, Joseph Rizzo, diretor de neuro-oftalmologia no Mass Eye and Ear e professor na Harvard Medical School. "Os nossos resultados devem ser considerados significativos, mas provisórios, uma vez que são necessários mais estudos para analisar estas questões, numa população muito maior e mais diversificada."

Os especialistas concordam que o risco potencial de NOIA não deve impedir a utilização de medicamentos com semaglutida para tratar a diabetes ou a obesidade.

"No cenário em constante mudança das terapias sistémicas, estar atento a potenciais novas associações de doenças é um dever que todos partilhamos em nome dos doentes", escreveu Susan Mollan, oftalmologista do University Hospitals Birmingham, Reino Unido, num comentário relacionado. Mas o elevado número de pessoas que tomam semaglutida deve aumentar a confiança de que o risco absoluto de desenvolver NOIA, como resultado, é raro.

A forma como as semaglutidas interagem com os olhos ainda não é totalmente conhecida. E a causa exata da NOIA também não é conhecida. A doença causa danos no nervo ótico, mas muitas vezes não há qualquer aviso antes da perda de visão.

As alterações nos níveis de açúcar no sangue podem afetar a lente do olho e a visão, segundo Disha Narang, endocrinologista e diretora de medicina da obesidade na Endeavor Health em Chicago, EUA, que não esteve envolvida no novo estudo.

E o uso de semaglutidas, que induzem o organismo a produzir mais insulina para reduzir o açúcar no sangue, foi anteriormente associado a alterações temporárias da visão - novos casos ou agravamento da retinopatia diabética ou danos nos vasos sanguíneos na parte de trás do olho - provavelmente relacionadas com a rápida melhoria dos níveis de açúcar no sangue.

Os rótulos do Ozempic e do Wegovy aprovados pelo regulador norte-americano, a Food and Drug Administration (FDA), incluem alterações da visão entre os potenciais efeitos secundários, e a Novo Nordisk está a estudar a ligação entre a utilização da semaglutida e a retinopatia diabética num ensaio que espera concluir em 2027.

"A segurança do paciente é primordial para a FDA e revemos continuamente as fontes de dados disponíveis e as novas informações sobre os riscos potenciais dos medicamentos, incluindo os agonistas do recetor do GLP-1, e atualizamos a rotulagem para comunicar novas informações sobre potenciais riscos aos prestadores de cuidados de saúde e aos pacientes o mais rapidamente possível", garantiu Chanapa Tantibanchachai, assessora de imprensa da FDA, à CNN por email.

Embora exista um "mecanismo biologicamente plausível" para uma potencial interação, "'associação não é causalidade' e a diabetes é um fator de risco conhecido para NOIA", disse à CNN Andrew Lee, porta-voz clínico da Academia Americana de Oftalmologia e neuro-oftalmologista do Houston Methodist Hospital, que não participou no novo estudo.

Por enquanto, os doentes que estão a tomar semaglutida, ou a considerar o tratamento, devem discutir os riscos e benefícios com os seus médicos, especialmente aqueles que têm outros problemas conhecidos do nervo ótico, como glaucoma ou perda visual pré-existente, dizem os especialistas.

"É importante consultar um oftalmologista se os pacientes apresentarem alterações visuais", aconselhou Narang. "É importante garantir que os doentes consultam médicos que se sintam confortáveis a prescrever semaglutida e a falar sobre o que pode ser clinicamente relevante e irrelevante, e a discutir os benefícios e os riscos da terapêutica a longo prazo."

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