Uma encomenda ameaçadora

13 nov 2024, 14:52
Caneca do Krasnodar (Bruno Andrade)

«DRIBLE DA VACA» - Opinião de Bruno Andrade

Estamos no período de eleições municipais em Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo, no Brasil. O atual prefeito caminha sereno e despreocupado para garantir o segundo mandato consecutivo. A vitória é inevitável. Seria preciso um verdadeiro milagre para uma reviravolta épica.

Poucos dias antes de a população ir às urnas, um pacote bastante suspeito é entregue pelos Correios na sede da Prefeitura. A escrita à mão e o selo colado no canto superior são confusos. O remetente é quase irreconhecível. O destinatário, entretanto, é de fácil percepção.

A pequena e surrada caixa de papelão marrom tem como "alvo" o Secretário de Planejamento do prefeito. Num primeiro momento, ninguém arrisca sacudir o objeto para perceber o que pode ter lá dentro. O mistério toma conta de todo o ambiente. O medo é latente.

Silvio Tavares, o receptor, também não ousa abrir de imediato a encomenda. Acredita por alguns instantes estar em posse de algo ameaçador, talvez uma bomba, possivelmente enviada pelo opositor que busca assumir o controle da cidade litorânea.

Vira, mexe e mede o mais cuidadosamente possível o pacote. Aproxima o ouvido para, quem sabe, reconhecer a engrenagem de um relógio, potencialmente um timer. De longe, os funcionários estão apreensivos e temem mesmo por um atentado.

Após uma avaliação mais minuciosa, Silvio reconhece a origem de tamanho amedrontamento: Rússia. Naturalmente, fica ainda mais espantado e baralhado. Idealiza em poucos segundos mil e uma teorias conspiratórias.

Decide avançar na investigação da peça e, enfim, toma conhecimento do expedidor: Alexandre Luiz Reame. Mas o Secretário de Planejamento não conhece qualquer cidadão com esse nome e sobrenome. O enigma insiste em continuar.

Faz uma rápida pesquisa na internet e, por meio do site Zerozero, descobre que Alexandre é, na verdade, mais conhecido como Xandão. É um jogador brasileiro de futebol, com passagens por Guarani, São Paulo, Sporting, Sporting Gijón e... Krasnodar.

Sim, Krasnodar. Do futebol russo. O perigo então diminui, mas a curiosidade aumenta. Começa a juntar os pontos. Bingo! Assume ter resolvido o quebra-cabeça maligno que, por questões de minutos, não envolveu as autoridades locais.

Não pensa duas vezes, pega o telefone e faz uma chamada urgente para o filho, que, na altura, estava em Portugal há cerca de cinco anos e trabalhava com jornalismo esportivo.

«Bruno, você conhece algum Alexandre Reame? Um tal de Xandão?», pergunta Silvio.

«Sim, pai. É um jogador com quem tenho bom contato e que... olha, esqueci de dizer que passei o endereço da Prefeitura de Caraguatatuba para ele enviar em seu nome uma caneca oficial do Krasnodar, onde ele jogou», responde Bruno.

Um suspira profundamente e faz um desabafo aliviado. O outro compreende o contexto e desanda a rir. A coleção de Bruno Andrade passa assim, diante de tanta inquietação, a ter mais uma caneca. Um acervo que hoje já está perto de atingir 150 exemplares.

*Bruno Andrade escreve a sua opinião em português do Brasil

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