Operação Marquês: ex-gestora de conta confirma transferências de amigo para a esfera de Sócrates

Agência Lusa , SM
28 out, 18:59
O ex-primeiro-ministro José Sócrates, principal arguido no caso de corrupção Operação Marques, chega ao Tribunal Penal Central de Lisboa, em Lisboa, Portugal, a 10 de setembro de 2025. EPA/FILIPE AMORIM. LUSA

Ana Vaz, ex-gerente de conta de Carlos Santos Silva no BES, testemunhou que, a certa altura, estranhou uma transferência de "centenas de milhares de euros" para um beneficiário que não conhecia

A ex-gestora bancária do empresário Carlos Santos Silva confirmou em tribunal que este ordenou transferências para a esfera de José Sócrates, tendo chegado a reportar a compra de uma casa à mãe do antigo primeiro-ministro.

Na sessão desta terça-feira do julgamento do processo Operação Marquês, a ex-gerente de conta de Carlos Santos Silva no Banco Espírito Santo (BES) testemunhou que, a certa altura, estranhou uma transferência de "centenas de milhares de euros" para um beneficiário que não conhecia, com "um descritivo/justificativo muito extenso", que assinalava tratar-se do "sinal de compra e venda de um imóvel".

"Eu não conhecia o beneficiário da transferência e fui ao Google, inseri o nome [Maria Adelaide Monteiro] e vi que era a mãe do engenheiro José Sócrates. E aí eu fui participar", contou Ana Vaz, acrescentando que também a deixou alerta o facto de o empresário não ter comunicado previamente que o movimento financeiro iria ter lugar.

Na acusação do processo Operação Marquês, o Ministério Público defende que em causa está dinheiro que pertenceria na realidade a José Sócrates e que o negócio da casa, localizada em Lisboa, foi uma das formas encontradas para o chefe de Governo entre 2005 e 2011 ter acesso aos fundos, alegadamente com origem em corrupção.

No testemunho desta terça-feira, Ana Vaz relatou também que Carlos Santos Silva disse que tinha uma amiga que queria comprar um monte no Alentejo, tendo o empresário garantido o financiamento de 850 mil euros "com o penhor financeiro de um depósito a prazo de igual montante", com autorização para débito em caso de a compradora não ter capacidade para pagar o empréstimo.

"Na altura, [o nome da beneficiária] não me dizia nada, mas, mais uma vez, fui ao Google e soube que Sofia Fava tinha sido casada com o engenheiro José Sócrates", afirmou.

Ana Vaz confirmou ainda a remessa de cerca de dois mil euros mensais para Sandra Santos, uma mulher residente na Suíça que seria próxima do antigo primeiro-ministro.

Num depoimento durante o qual o advogado de José Sócrates, Pedro Delille, ameaçou abandonar a sala por ter sido chamado à atenção pelo tribunal por uma pergunta que fez, a bancária adiantou ainda que reportou também à sua direção o facto de Carlos Santos Silva pedir para que fosse um funcionário do banco a levantar cheques.

A este propósito, Ana Vaz salientou que, "a partir de determinada altura", apercebeu-se da existência de "levantamentos da ordem dos 10 mil euros de uma maneira muito recorrente", tendo questionado o empresário sobre a justificação para tal acontecer e obtido "uma resposta vaga, que [os montantes] eram para despesas".

Na acusação, o Ministério Público considera que estes levantamentos em numerário destinar-se-iam igualmente a pessoas da esfera de José Sócrates.

Os atos sob suspeita ocorreram entre 2012 e 2014.

O antigo primeiro-ministro e Carlos Santos Silva, ambos de 68 anos, são dois dos 21 arguidos na Operação Marquês, aos quais o Ministério Público imputa, no total, 117 crimes económico-financeiros.

Os arguidos têm todos, em geral, negado a prática de qualquer ilegalidade.

O julgamento decorre desde 03 de julho no Tribunal Central Criminal de Lisboa e tem sessões agendadas pelo menos até 18 de dezembro de 2025.

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