29/06/2025: no dia mais quente de sempre em junho houve granizo - Portugal em risco de "tempestades"

CNN Portugal , DCT
30 jun, 09:06

Fim de semana foi quente-quentíssimo - mas nem mesmo os mais de 30ºC (ou 40ºC) evitaram a queda de granizo em alguns pontos do país, um fenómeno que pode deixar Portugal em risco de sofrer uma tempestade idêntica à de França

Muito calor, temperatura recorde para o mês de junho e chuva e granizo. A combinação parece improvável, mas foi a realidade em Portugal Continental este domingo: o país esteve sob alerta devido às temperaturas elevadas, Mora registou 46,6ºC - o valor mais alto de sempre registado em junho - e Bragança, Castelo Branco, Guarda, Viseu e Coimbra foram surpreendidos com queda de granizo apesar do calor.

Esta repentina e intensa onda de calor - que entretanto vai abrandar - tem uma justificação. Os especialistas chamam-lhe “crista anticiclónica”, que é como quem diz uma área alongada de alta pressão atmosférica, associada a um anticiclone. “É como se fosse uma língua de altas pressões”, exemplifica o climatologista Carlos Câmara, referindo-se ao prolongamento estreito de uma área de alta pressão que avança entre zonas de pressão mais baixa, mais concretamente “sobre a Europa, passa a norte de Portugal e depois entra por França e estende-se pela Alemanha”.

Os termos soam de forma estranha, mas esta subida acentuada das temperaturas “não é completamente inédita”, tem vindo a repetir-se nas últimas três décadas e é consequência direta das alterações climáticas, assegura o especialista, que esteve recentemente no CNN Primetime a explicar o fenómeno.

A culpa do calor excessivo é de um já velho conhecido: anticiclone dos Açores, que, segundo o Instituto Português do Mar e Atmosfera (IPMA), “se irá estender em crista para o Golfo da Biscaia, e um vale depressionário que se estende desde o norte de África até à Península Ibérica”, dando origem “ao transporte de uma massa de ar proveniente do norte de África, favorável a uma situação meteorológica de tempo quente e seco”, como se lê no site do organismo.

“Quando temos um anticiclone, se há baixas pressões, os ventos convergem e depois sobem. Se houver altas pressões, [o que acontece] é exatamente o contrário: afastam-se e descem, e, como descem, a pressão vai aumentando; à medida que descem são comprimidos e aquecem”, explica Carlos Câmara. É uma bela aula de meteorologia: “Se eu tiver altas pressões sempre no mesmo sítio durante dias e dias, aquilo a que se costuma chamar 'cúpula de calor', o que vai acontecer é que esse mecanismo de estar continuamente a comprimir o ar vai torná-lo cada vez mais quente e mais seco. Esta é uma situação que não é inédita”.

França foi recentemente alvo de uma onda de calor extremo seguida de tempestades, que causaram dois mortos e 17 feridos. Portugal não sofreu com este fenómeno meteorológico que parece saído de um filme de ficção científica, mas não se livrou de chuvas e queda de granizo apesar do calor. E há mais para vir: em cima da mesa deste estranho cenário meteorológico está ainda a possibilidade de “haver trovoadas secas [em Portugal]”, diz Carlos Câmara, que não hesita em apontar o dedo às alterações climáticas.

“O que tem acontecido é que nos últimos 30 anos têm começado a aumentar o número destas ondas de calor e isso tem que ver com alterações climáticas. Não há dúvida absolutamente nenhuma porque, por um lado, a teoria assim o demonstra; por outro lado, modelos físico-matemáticos são capazes de reproduzir o que estou a dizer; e, finalmente, as observações estão aí para o comprovar”, adianta o especialista.

Mas como se explica a chegada de tempestades de chuva depois de dias secos e quentes? Com teorias que parecem contraditórias mas que não são. “Quando eu tenho ar quente, mas se depois tiver alguma humidade, o que vai acontecer - e agora vai parecer que estou a contradizer-me - [é que] podem formar-se tempestades locais, em que o ar sobe e, como tem humidade, essa humidade condensa; ao condensar liberta muito calor e vai provocar tempestades - como se viram em França”, explica Carlos Câmara. Podemos ainda ter “trovoadas com chuva ou até secas que podem produzir incêndios” - a consequência mais indesejada, aquilo a que chama “surpresas “muito desagradáveis” depois do calor. E Castelo Branco já foi alvo de chamas este domingo, estando agora 90 concelhos sob risco máximo de incêndio.

O especialista alerta que “é preciso não esquecer que tivemos uma primavera muito chuvosa” e que a vegetação está “altíssima”, qual rastilho ignitor para as chamas. “Havendo uma vaga de calor ou temperaturas altas, que infelizmente é aquilo que se prevê que venha a acontecer este verão - em termos estatísticos os modelos assim o indicam -, havendo [também] muita abundância de biomassa e vegetação - que, ficando seca e havendo condições meteorológicas, como ondas de calor, poderemos ter surpresas muito desagradáveis este verão.” Refere-se aos incêndios.

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