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Country Manager da Ayming Portugal

A racionalização dos benefícios fiscais no contexto do Orçamento do Estado para 2026

13 out, 15:41

A proposta de Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) reafirma o compromisso do Governo com uma gestão orçamental responsável, centrada na redução da despesa pública, na racionalização dos benefícios fiscais e na criação de condições para o crescimento económico sustentável. Entre as prioridades estratégicas destacam-se o estímulo à produtividade, o reforço do investimento e a promoção da inovação empresarial, pilares considerados essenciais para consolidar a trajetória de crescimento e de estabilidade das contas públicas.

É neste contexto que surge o recente estudo da U-Tax, que recomenda a eliminação de 20 benefícios fiscais, com uma poupança potencial entre 1,4 e 1,7 mil milhões de euros. À primeira vista, a proposta parece alinhar-se com o esforço de consolidação orçamental previsto no OE2026, oferecendo um alívio imediato às contas públicas. No entanto, a medida levanta dúvidas quanto ao seu impacto estrutural na economia, especialmente em áreas como o investimento em inovação e o financiamento empresarial.

Entre as propostas da U-Tax, destaca-se a eliminação do SIFIDE Indireto, um instrumento que, só em 2024, representou 875,5 milhões de euros. O relatório, contudo, não pondera integralmente as sinergias que este mecanismo tem proporcionado, nomeadamente a capitalização das empresas através dos fundos de investimento e o reforço do investimento em I&D por parte das empresas participadas. Num país que procura reforçar a competitividade e atrair investimento direto estrangeiro, como sublinha o OE2026, a supressão de um instrumento que tem ajudado a alavancar empresas nacionais para o mercado internacional pode representar um retrocesso estratégico. Exemplos como Nutrium, Bhout, Feedzai, ILoF, Sensei ou Paynest demonstram o papel decisivo destes fundos no fortalecimento do ecossistema de inovação português.

Acresce uma contradição relevante: o próprio relatório da U-Tax reconhece que cada euro adicional em crédito fiscal gera até 1,72 euros em investimento em I&D, dos quais 1,49 euros correspondem a investimento direto das empresas. Se assim é, torna-se difícil compreender a recomendação de extinguir fundos obrigados a investir 90% do capital angariado, especialmente quando o OE2026 aposta precisamente em políticas de estímulo à produtividade e à inovação tecnológica.

Naturalmente, o SIFIDE não é isento de críticas e carece de ajustes. Do lado do benefício fiscal, faria sentido eliminar a taxa incremental, agilizar os processos de validação da ANI e até adotar mecanismos de “cashback” para startups, à semelhança do que já acontece em Espanha, França ou Reino Unido. Do lado do investimento, é fundamental corrigir as distorções introduzidas em revisões recentes, como a obrigatoriedade de manter unidades de participação por 10 anos, quando o período de investimento foi reduzido de 5 para 3.

Mais do que uma redução cega de incentivos, o que o país necessita é de uma reforma inteligente, capaz de preservar os instrumentos que demonstraram eficácia e corrigir ineficiências regulatórias. O Orçamento do Estado para 2026 define como meta a criação de um ambiente económico propício ao investimento, à inovação e à competitividade, objetivos que dificilmente se alcançarão enfraquecendo um dos poucos mecanismos que têm comprovadamente contribuído para esse propósito.

Portugal precisa de uma política fiscal coerente com a sua estratégia económica, que combine prudência orçamental com visão de longo prazo. Cortar instrumentos de estímulo à inovação pode aliviar as contas no imediato, mas compromete a capacidade do país de gerar valor, criar emprego qualificado e sustentar um crescimento verdadeiramente competitivo.

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