Vegetais crus ou cozinhados: qual a forma mais saudável de os comer?

2 abr 2023, 11:00
Vegetais (Pexels)

O tomate pode ter ação anti-cancerígena se consumido de forma adequada e a cenoura nunca deve ser cortada quando vai para o tacho. Dicas para conseguir tirar todos os benefícios dos legumes mais comuns

Comecemos pelo facto: os vegetais devem estar presentes nas principais refeições todos os dias, sem exceção. Além de coloridos e versáteis, são uma fonte de vitaminas e minerais. Mas a dúvida é comum: deve comê-los crus ou cozinhados?

A resposta varia, de acordo com várias especialistas em nutrição, com o tipo de alimento que está em causa. 

É certo, começa por explicar Bárbara Oliveira autora do livro 10 Passos para Comer Bem (editado pela Influência) que quando se cozinham os alimentos estes podem perder algumas substâncias importantes. “Há várias perdas de nutrientes desde o início do preparo” do alimento, nomeadamente logo após o corte, por exemplo, diz a nutricionista. Mas é na cozedura, alerta, que as vitaminas C e do complexo B mais facilmente “acabam por se perder”, uma vez que são hidrossolúveis. 

Nestes casos, acrescenta a nutricionista Lillian Valente, o ideal é aproveitar a água da cozedura. “Quando cozinhamos uma sopa, mesmo que os nutrientes passem para a água, essa mesma água será ingerida, uma vez que os legumes serão triturados juntamente com ela. Pelo contrário, se cozermos da forma tradicional os vegetais e descartarmos a água já podemos estar a perder uma parte destes nutrientes, especialmente das vitaminas hidrossolúveis”. 

Laura Brown, professora de Nutrição, Alimentos e Ciências da Saúde na Teesside University, nos Estados Unidos, escreveu para o site The Conversation sobre o assunto. E a conclusão é simples, mas complexa: “nem todos os alimentos são mais nutritivos quando ingeridos crus”. E a complexidade da questão vem da ciência dos próprios alimentos.

Nos vegetais, nutrientes importantes às vezes ficam presos dentro de paredes celulares. Quando os legumes são cozidos, as paredes quebram-se, liberando os nutrientes que podem ser absorvidos mais facilmente pelo corpo”, diz a especialista.

 

Os segredos para tirar partido do tomate e da beterraba

E como esta questão é tudo menos linear, equilibrar entre o cru e cozinhado pode ser o ideal em algumas situações, como é o caso do tomate: quando cozido tem mais licopeno (pigmento carotenóide com propriedades antioxidantes e associado à prevenção do cancro), mas menos vitamina C.

Bárbara Oliveira adianta ainda que não é apenas a confeção que importa. A adição de uma boa gordura é também uma mais-valia. “O tomate tem mais interesse nutricional se for cozinhado e se for adicionado azeite”.

Já a beterraba é um exemplo de que o consumo em cru pode ser melhor do que o cozinhado, uma vez que a fervura deste alimento reduz os níveis de vitamina C, ácido fólico, flavonoides e betalaínas, diz o The New York Times.

Num artigo dedicado ao tema neste jornal, Emily Ho, professora de nutrição e diretora do Instituto Linus Pauling, na Universidade do Estado de Oregon, EUA, dá ainda o exemplo da couve kale, defendendo que se trata de um vegetal que é mais benéfico quando consumido no seu estado natural, uma vez que os níveis de vitamina C e antioxidantes ficam preservados. Além disso, uma investigação publicada há cinco anos diz que cozinhar este vegetal reduz os níveis de potássio, magnésio, cálcio, ferro, zinco e cobre.

Assim como o alho, a cebola fornece compostos mais benéficos (os chamados tiossulfinatos) quando consumida crua, explica ao mesmo jornal Alexander Michels, investigador naquele mesmo instituto.

Um estudo publicado na revista British Journal of Nutrition concluiu que as pessoas que seguem uma dieta crua (em que os alimentos são consumidos no seu estado natural ou mais próximo disso) apresentam níveis normais de vitamina A e níveis relativamente altos de beta-caroteno, mas baixos níveis do antioxidante licopeno.

“A perda [de nutrientes] não é linear, não temos de parar de confecionar os alimentos”, avisa, por isso, Bárbara Oliveira, explicando que “também há benefícios” quando são cozinhados, uma vez que isso “acabar por melhorar a digestão” desses mesmos alimentos e “promover uma melhor absorção dos nutrientes pelo nosso organismo”.

Como potenciar os cogumelos, espargos e espinafres  

Há, assim legumes, que são mais benéficos quando consumidos cozinhados. É o caso dos espargos. As vitaminas A, B9, C e E contidas neste legume ficam mais disponíveis para serem absorvidas quando são cozinhados, segundo Laura Brown. O mesmo indica a professora de Nutrição acontece com os cogumelos.

Estes quando são cozinhados tornam-se melhores. A razão é simples: estes fungos comestíveis possuem um aminoácido chamado ergotioneína que é  libertado durante a cozedura. Um estudo publicado em 2020 concluiu que cozinhar cogumelos secos (desidratados) pode reduzir os níveis de oligoelementos tóxicos como o arsénico.

Também os espinafres dão mais ao organismo quando cozinhados, em vez de serem consumidos crus.  De acordo com Laula Brown, estes legumes, tão protagonistas dos ‘green smoothies’, devem ser cozinhados, uma vez que a absorção de ferro, magnésio, cálcio e zinco fica mais eficaz - e isto porque o calor da cozedura bloqueia a ação do ácido oxálico, composto presente neste vegetal de folha verde que bloqueia a absorção, por parte do corpo, de ferro e cálcio. Porém, quando cozinhados apresentam menores níveis de vitamina C e B. 

Um truque para aumentar o benefício da cenoura

A cenoura é mais um caso em que a cozedura beneficia a absorção dos nutrientes que o vegetal oferece. Mas Laura Brown dá um conselho: cozinhe em água a cenoura inteira. Ao cortá-la, alguns desses nutrientes podem perder-se na água. E não a frite, diz no artigo que assina no site The Conversation.  E no The New York Times é citado “um estudo de 2021 que descobriu que cozinhar cenouras no vapor e no micro-ondas por 10 minutos concentrava o teor de potássio e sódio" nestes legumes.

Para o brócolo, a couve-flor e a couve-de-Bruxela também há indicações que podem ajudar a beneficiar de cozedura: devem ser cozinhados inteiros ou cortados cerca de 40 minutos antes de ir ao tacho. Este segredo (leia-se, química) deve-se à ativação da enzima mirosinase (anti cancerígena), que é conseguida quando o alimento ‘repousa’ antes de ser cozinhado, revelou um estudo publicado na European Food Research and Technology. Os níveis de vitamina C também aumentam quando estes ‘verdes’ são cozinhados. 

Um alerta sobre a beringela   

A nível de digestão, o The New York Times destaca que as vagens cozinhadas são melhores digeridas do que quando consumidas cruas. Em causa está a capacidade de o calor aniquilar a ação da lectina, um antinutriente que pode causar desconforto intestinal.

“Existem também alimentos que devem mesmo ser cozinhados, já que em cru apresentam alguma toxicidade, por exemplo, a beringela. A sua casca contém elevado teor de solanina, que quando em cru, é bastante tóxica”, adianta Lillian Barros.

Quanto ao tipo de confeção, é sabido que cozer e aproveitar a água é vantajoso para não desperdiçar os nutrientes, mas “se cozermos a vapor ou no micro-ondas, vamos preservá-los mais”, continua a nutricionista.

Lembrando que o importa é que os vegetais façam parte da alimentação diária, as nutricionistas sublinham que o importante é variar.

“O que interessa é mesmo a variedade. Num dia podemos comer a cenoura crua, no outro dia assada no forno, num dia podemos comer os brócolos cozidos e no outro juntá-los à sopa. Na sopa existe sempre o total aproveitamento dos nutrientes, mas é mesmo importante esta variedade”, explica Bárbara Oliveira.

Lillian Barros também defende a variedade. “Aconselho a não terem medo de experimentar diferentes variedades de vegetais. Muitas vezes focamo-nos nos clássicos alface e brócolos e esquecemo-nos de todo o mundo de vegetais que existe para além destes, nomeadamente: beringela, beterraba, espargos, pepino, rabanete, nabo, abóbora, pimentos, curgete, aipo, couve-roxa”, esclarece, aconselhando ainda a experimentar diferentes formas de confeção e até de corte e a não ter receio de recorrer aos congelados. “São uma forma prática de os termos sempre prontos a cozinhar. E, sim, eles conservam os seus nutrientes”, garante.

A nutricionista defende que "é importante dar nova oportunidade aos vegetais que outrora não gostávamos, experimentando diferentes formas de confeção, como assado, salteado, ao vapor, no micro-ondas, estufados, ou diferentes formas de lhes conferir sabor, por exemplo, adicionando ervas aromáticas ou especiarias, sumo de limão, molho soja, molho pesto, vinagre".

Lillian Barros dá mais dicas: “Podemos utilizar formas criativas de os introduzir nos pratos: ralados (beterraba, cenoura…), espiralizados (curgete, abóbora, cenoura…), em forma de arroz (couve-flor, por exemplo), lascados, em forma de placas de lasanha (curgete e beringela), em chips (couve kale e beterraba), em rodelas, como se fossem uma base de pizza (curgete e beringela), em rolos/wraps (couve, alface ou endívia), em palitos (pepino, cenoura e aipo)acompanhados de diferentes dips, ou podemos mesmo rechear de diversas maneiras os vegetais (pimento, abóbora, curgete e beringela)”.

E há estratégias para incluir estes alimentos na alimentação sem que tal pareça aborrecido, diz a Universidade de Harvard, que garante que “variedade e cor são a chave para uma dieta saudável”. Num trabalho da universidade, os especialistas aconselham a consumir “pelo menos uma porção de cada uma das seguintes categorias: vegetais folhosos verde-escuros; frutas e vegetais amarelos ou alaranjados; frutas e legumes vermelhos; leguminosas e ervilhas; e frutas cítricas”.

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