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A Sonda Parker passou pelo sol na véspera de Natal durante um sobrevoo recorde, tendo feito aquela que passa a ser a maior aproximação da Humanidade a uma estrela.
A equipa de operações da missão, localizada no Laboratório de Física Aplicada Johns Hopkins em Laurel, Maryland, EUA, pôde confirmar o sucesso do sobrevoo depois de ter recebido um sinal da nave espacial.
A equipa da missão sabia que não iria receber qualquer comunicação da nave espacial durante a sua passagem mais próxima do Sol. Agora, os membros da equipa aguardam dados mais detalhados da Parker sobre o estado da nave.
A nave espacial sem tripulação voou a 692.000 quilómetros por hora, o que é suficientemente rápido para chegar a Tóquio a partir de Washington, DC em menos de um minuto, segundo a NASA. O rápido sobrevoo faria da sonda o objeto de fabrico humano mais rápido da história, partilhou a agência a 16 de dezembro durante uma apresentação da NASA Science Live no YouTube.
A missão tinha estado a preparar-se para este marco histórico desde o seu lançamento, a 12 de agosto de 2018 - um evento que contou com a presença do homónimo da sonda, Eugene Parker, um astrofísico que foi pioneiro no campo de investigação solar da heliofísica.
Eugene Parker foi a primeira pessoa viva a ter uma nave espacial com o seu nome. O astrofísico, cuja investigação revolucionou a compreensão da Humanidade sobre o Sol e o espaço interplanetário, morreu aos 94 anos em março de 2022. Mas ainda foi capaz de testemunhar como a sonda podia ajudar a resolver mistérios sobre o Sol.
A sonda tornou-se a primeira nave espacial a “tocar no Sol” ao voar com sucesso através da coroa solar, ou atmosfera superior, para recolher amostras de partículas e dos campos magnéticos da estrela em dezembro de 2021. O recorde de aproximação foi agora batido em 2024.
Ao longo dos últimos seis anos da missão de sete anos da nave espacial, a Parker recolheu dados que esclareceram os cientistas sobre alguns dos maiores mistérios do Sol.
Os heliofísicos há muito que se interrogam sobre a forma como é gerado o vento solar, um fluxo constante de partículas libertadas pelo Sol, bem como sobre a razão pela qual a coroa solar é muito mais quente do que a sua superfície.
Uma animação mostra o vento solar a afastar-se do Sol, a atravessar o sistema solar e a encontrar a Terra foto Centro de Voo Espacial Goddard da NASA
Os cientistas também querem compreender como se estruturam as ejeções de massa coronal, ou grandes nuvens de gás ionizado, chamadas plasma, e os campos magnéticos que irrompem da atmosfera exterior do Sol.
Quando estas ejeções se dirigem para a Terra, podem causar tempestades geomagnéticas, ou grandes perturbações do campo magnético do planeta, que podem afetar os satélites, bem como as infraestruturas de energia e comunicação na Terra.
Chegou agora a altura das passagens mais próximas e finais da Parker, que podem completar as respostas a estas questões persistentes e desvendar novos mistérios através da exploração de território solar desconhecido.
“A Parker está a mudar o campo da heliofísica”, afirma em comunicado Helene Winters, gestora do projeto da Parker no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, EUA. “Depois de anos a enfrentar o calor e a poeira do sistema solar interior, recebendo rajadas de energia solar e radiação que nenhuma nave espacial alguma vez viu, a Parkercontinua a prosperar”.
Um voo muito próximo de uma estrela ardente
O sobrevoo da Parker na véspera de Natal foi planeado como a primeira das três últimas aproximações da sonda, estando as outras duas previstas para 22 de março e 19 de junho.
A sonda aproximou-se tanto do Sol que, se a distância entre a Terra e a se o comprimento de um campo de futebol americano, a sonda estaria a cerca de 0,90 metros da zona final, segundo a NASA.
A esta proximidade, a sonda seria capaz de voar através de plumas de plasma, bem como dentro de uma erupção solar, se esta se libertar do Sol.
A sonda espacial encontrou uma ejeção de massa coronal a 5 de setembro de 2022 foto NASA/Johns Hopkins APL
A nave espacial foi construída para suportar os extremos do Sol e já passou por ejeções de massa coronal no passado sem qualquer impacto para o veículo, diz Nour Rawafi, cientista do projeto Parker.
A nave espacial está equipada com um escudo de espuma de carbono com 11,4 centímetros de espessura e 2,4 metros de largura. Na Terra, antes do lançamento, o escudo foi testado e capaz de suportar temperaturas próximas dos 1.400 graus Celsius. Na véspera de Natal, o escudo enfrentou provavelmente temperaturas até 980 graus Celsius.
Entretanto, o interior da nave espacial está a uma temperatura ambiente confortável para que os sistemas eletrónicos e os instrumentos científicos possam funcionar como esperado. Um sistema de arrefecimento único concebido pelo Laboratório de Física Aplicada bombeia água através dos painéis solares da nave para os manter a uma temperatura constante de 160 graus Celsius, mesmo durante as aproximações ao Sol.
Uma animação mostra a passagem da Parker perto do calor intenso do Sol foto NASA/Johns Hopkins APL
A sonda realizou o seu sobrevoo de forma autónoma porque o controlo da missão estava fora de contacto com a sonda devido à proximidade do Sol.
O imenso conjunto de dados e imagens recolhidos durante o sobrevoo só vai estar disponível para o controlo da missão quando a Parker se afastar do Sol na sua órbita, o que vai ocorrer cerca de três semanas mais tarde, em meados de janeiro, explica Rawafi.
Momento perfeito para ver um Sol ativo
Pouco mais de um ano após o lançamento da Parker, o Sol entrou num novo ciclo solar. Agora, o Sol está a viver o máximo solar, o que significa que a missão teve a oportunidade de testemunhar a maior parte de um ciclo solar e as transições entre os seus altos e baixos, diz C. Alex Young, diretor associado para a ciência na Divisão Científica de Heliofísica no Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, EUA.
O Sol é muito mais ativo durante o máximo solar, como se pode ver nesta comparação das fases solares foto Centro de Voo Espacial Goddard da NASA
Cientistas da NASA, da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica e do Painel Internacional de Previsão do Ciclo Solar anunciaram em outubro que o Sol atingiu o máximo solar, ou seja, o pico de atividade do seu ciclo de 11 anos.
No pico do ciclo solar, os polos magnéticos do Sol invertem-se, fazendo com que o Sol passe de calmo a ativo. Os especialistas acompanham o aumento da atividade solar contando o número de manchas solares que aparecem na superfície do Sol. E espera-se que o Sol se mantenha ativo durante o próximo ano.
O aumento da atividade solar tornou-se óbvio este ano durante duas grandes exibições de auroras na Terra, em maio e outubro, quando as ejeções de massa coronal libertadas pelo sol foram dirigidas para o nosso planeta. As tempestades solares são também responsáveis pela geração de auroras que dançam à volta dos polos da Terra, conhecidas como aurora boreal e aurora austral. Quando as partículas energizadas das ejeções de massa coronal atingem o campo magnético da Terra, interagem com os gases da atmosfera e criam luzes de cores diferentes no céu.
Uma série de cores pode ser vista durante um espetáculo auroral visível a partir da Estação Espacial Internacional foto NASA
“Ambas as tempestades fizeram com que as auroras fossem visíveis até ao fundo dos Estados Unidos”, diz Young. “Mas a tempestade de maio foi uma tempestade especialmente forte. De facto, pensamos que pode ser um evento de 100 a 500 anos, e que provocou auroras muito perto do equador, o que é extremamente inédito. Foi um acontecimento mundial que milhões de pessoas puderam ver e que pode não voltar a acontecer.”
Os dados recolhidos pela Parker podem permitir aos cientistas compreender melhor as tempestades solares e até mesmo prevê-las, explica Young.
“O Sol é a única estrela que podemos ver em pormenor, mas podemos ir até ele e medi-lo diretamente”, refere Young. “É um laboratório no nosso sistema solar que nos permite aprender sobre todas as outras estrelas do universo e sobre a forma como todas essas estrelas interagem com os milhares de milhões de planetas que podem ou não ser como os nossos próprios planetas no nosso sistema solar.”
A Parker Solar Probe vai continuar a orbitar perto do Sol durante os próximos seis meses foto NASA/Johns Hopkins APL
Com isso em mente, Rawafi afirma que espera que o Sol dê um espetáculo durante as aproximações da sonda, permitindo aos cientistas obter informações sobre a atividade solar.
“Sol, por favor, faz o teu melhor”, diz Rawafi. “Dá-nos o evento mais forte que conseguires - a Parker aguenta contigo.”