Junta militar de Myanmar executa principais ativistas pró-democracia

CNN , Helen Regan e Rhea Mogul
26 jul 2022, 09:31

A Amnistia Internacional registou um aumento "alarmante" do número de sentenças de morte neste país

A junta militar de Myanmar  executou dois destacados ativistas  pró-democracia , além de mais dois homens acusados de terrorismo, de acordo com os média estatais, na sequência de um julgamento repudiado pela ONU e pelos grupos de direitos humanos.

O veterano ativista pró-democracia, Kyaw Min Yu, mais conhecido como Ko Jimmy, e o antigo deputado da Liga Nacional para a Democracia (LND), Phyo Zayar Thaw, foram executados, juntamente com Hla Myo Aung e Aung Thura Zaw, de acordo com a notícia do “Global New Light of Myanmar”, que não indica a data.

Estas mortes são as primeiras execuções judiciais do país em décadas e os grupos de defesa dos direitos humanos receiam que haja outras depois destas. Segundo a Human Rights Watch, 114 pessoas foram condenadas à morte em Myanmar desde que os militares tomaram o poder num golpe de Estado, em fevereiro de 2021.

Ko Jimmy e Phyo Zayar Thaw foram acusados pelos militares de estarem "envolvidos em atos terroristas, tais como atentados à bomba, e morte de civis enquanto informadores", disse à CNN o porta-voz da junta militar, Zaw Min Tun. Foram condenados à morte em janeiro de 2022 e, no mês passado, Zaw Min Tun confirmou que os seus recursos tinham sido negados.

Os casos civis têm sido julgados em tribunais militares, à porta fechada, desde que os militares tomaram o poder no ano passado, expulsando o governo eleito e revertendo quase uma década de reformas democráticas provisórias.

Segundo os grupos de direitos humanos, estes tribunais militares secretos negam a oportunidade de um julgamento justo e foram criados para conseguir condenações rápidas – e quase certas – independentemente das provas.

O relator especial das Nações Unidas sobre a situação dos direitos humanos em Myanmar, Tom Andrews, disse num comunicado que estava "indignado e desolado" com as execuções.

"Envio as minhas condolências às famílias e amigos e a todo o povo de Myanmar, que é vítima das crescentes atrocidades da junta militar", disse ele. "Estas pessoas foram julgadas, condenadas e sentenciadas por um tribunal militar, sem direito a recurso e alegadamente sem aconselhamento jurídico, numa violação do direito internacional dos direitos humanos."

A diretora interina da Human Rights Watch para a Ásia, Elaine Pearson, disse que as execuções foram um "ato de crueldade extrema, na sequência de julgamentos militares grosseiramente injustos e politicamente motivados."

"Esta notícia terrível foi agravada pelo facto de a junta militar não ter informado as famílias destes homens, que souberam das execuções através dos comunicados de imprensa da junta", disse Pearson em comunicado.

Um porta-voz do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que a ONU estava "profundamente preocupada"com a decisão da execução destes homens, apelidando-a de "violação flagrante do direito à vida, liberdade e segurança", referindo-se a um artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

A Amnistia Internacional registou um aumento "alarmante" do número de sentenças de morte neste país, desde a tomada do poder, cujo objetivo seria "semear o medo".

Phyo Zayar Thaw, membro da Câmara Baixa pela Liga Nacional para a Democracia, em Naypyidaw, a 24 de agosto de 2015

"A pena de morte tornou-se uma das muitas maneiras terríveis com que os militares de Myanmar tentam semear o medo entre quem se opõe ao seu governo, e viria a ser mais uma das graves violações de direitos humanos, incluindo violência letal contra manifestantes pacíficos e outros civis", disse a organização no Twitter em junho.

Um relatório de 2021 da Amnistia Internacional dizia que a última execução judicial conhecida em Myanmar datava de 1988. Houve várias penas de morte no país, desde então, mas normalmente eram "comutadas com indultos".

A CNN não conseguiu uma verificação independente sobre a data da última execução estatal em Myanmar.

Ativistas proeminentes

Phyo Zayar Thaw, de 41 anos, era um antigo deputado na Câmara Baixa do Parlamento de Myanmar pela Liga Nacional para a Democracia, na altura no poder, o partido da líder deposta, Aung San Suu Kyi.

Antes de ser político, Phyo Zayar Thaw era um popular cantor de hip hop e membro fundador da organização juvenil pró-democracia, Generation Wave. Foi preso em 2008 pelo regime militar anterior, pelo seu ativismo.

Em novembro de 2021, Phyo Zayar Thaw foi detido durante uma rusga a um complexo de apartamentos na maior cidade de Myanmar, Rangum. Foi acusado de planear ataques a alvos da junta militar e condenado no âmbito da Lei Antiterrorismo e da Lei de Proteção à Propriedade Pública, de acordo com os média locais.

Ko Jimmy tornou-se um destacado estudante ativista em Myanmar, durante a revolta popular contra o regime militar da altura, em 1988. Esteve preso durante cerca de 15 anos pelo seu ativismo e pelo envolvimento na "Revolta 8888" e na Revolução Açafrão, em 2007.

O preso político Kyaw Min Yu, ao centro, e a mulher, Ni Lar Thein, à esquerda, na chegada do Aeroporto Internacional de Rangum, após a sua libertação, a 13 de janeiro de 2012

De acordo com os média locais, Ko Jimmy foi detido em outubro de 2021, acusado de organizar ataques de guerrilha a alvos da junta e condenado por traição e terrorismo. Também era procurado pelo regime por alegada incitação a tumultos, através de publicações nas redes sociais a criticar o golpe de Estado.

Desde que tomou o poder, a junta militar chefiada por Min Aung Hlaing, embarcou numa repressão sangrenta contra qualquer oposição ao seu governo. Quase 15 mil pessoas foram presas e mais de duas mil foram mortas por forças militares, de acordo com a Associação de Assistência aos Presos Políticos.

Os militares foram acusados de  crimes contra a Humanidade  e de crimes de guerra pelos Estados Unidos, Nações Unidas e outros órgãos internacionais, numa  tentativa de exercer controlo  sobre o povo, que continua a fazer uma campanha  de resistência em massa.

"A barbaridade e desprezo da junta militar pela vida humana tem como objetivo refrear o movimento de protesto anti-golpe de Estado", disse Elaine Pearson, da Human Rights Watch.

"Os Estados-membros da União Europeia, os Estados Unidos e outros governos deviam mostrar à junta militar que terá de responsabilizar-se pelos seus crimes."

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