Um Mundial por dia: 2010, um novo continente e um novo campeão

8 dez 2022, 00:05
Casillas beija a taça de campeão após vencer o Mundial 2010

Viagem à história do Campeonato do Mundo em histórias, imagens, figuras, números, frases e curiosidades

Enquanto se escreve nova história no Qatar, o Maisfutebol olha para o que está para trás. De 1930 a 2018, um Mundial por dia em pequenas histórias, figuras, números, frases, curiosidades ou o percurso de Portugal. Pistas para recordar do que falamos quando falamos do Campeonato do Mundo.

África do Sul 2010

11 junho a 11 julho 2010

Campeão: Espanha

2ª lugar: Países Baixos

3º lugar: Alemanha

4º lugar: Uruguai

Jogos: 64

Golos: 147 (2,3 por jogo)

Melhores marcadores: Thomas Müller (Alemanha), Wesley Sneijder (Holanda), David Villa (Espanha) e Diego Forlán (Uruguai), 5 golos

Portugal

Terminada a era Scolari, Carlos Queiroz voltou a assumir a seleção, para uma campanha atribulada. A derrota em Alvalade nos últimos minutos com a Dinamarca, mais um nulo caseiro com a Albânia, complicaram a qualificação e forçaram Portugal a jogar o play-off. Superada a Bósnia, a seleção carimbava o passaporte para a África do Sul, onde chegava com vários problemas – da lesão de última hora de Nani aos problemas físicos de Pepe, bem como a uma atípica seca de golos de Cristiano Ronaldo. Portugal começou com um empate a zeros frente à Costa do Marfim e seguiu com uma alegre goleada à Coreia do Norte, um 7-0 que até deu para Ronaldo quebrar o jejum. Ele tinha dito que isto era como o ketchup, quando viessem os golos iam jorrar, mas não foi assim. Portugal, assente na solidez ofensiva, apurou-se com novo nulo, frente ao Brasil, para marcar encontro nos oitavos com a Espanha. Aí, um golo de David Villa mandou a seleção para casa, com um único golo sofrido em todo o torneio. E com sinais evidentes de desgaste em relação às opções do selecionador. «Falem com o Carlos Queiroz», disse Ronaldo quando lhe pediram para explicar a eliminação.

O Mundial

O primeiro Campeonato do Mundo no continente africano, o único até hoje, foi singular em muitos aspetos. Até no campeão. A Espanha, que nunca tinha passado dos quartos de final, avançou até à vitória final, assente numa geração de ouro que sublimou o estilo de jogo que seria referência por muitos anos e dominou o planeta durante mais de meia década: campeã da Europa em 2008 e 2012, pelo meio o inédito título mundial.

As muitas dúvidas em torno da capacidade de organização e das condições de segurança na África do Sul deram lugar a um Mundial que deixou um legado de muitos momentos intensos e dramáticos em campo. Também surpresas com fartura, desde logo a eliminação da campeã Itália e da França na primeira fase. Nunca antes o campeão e o vice tinham ficado tão cedo pelo caminho.

Aos quartos de final chegaram apenas três seleções europeias, mas todas atingiram as meias-finais. No entanto, este também não foi em campo o Mundial africano. A África do Sul foi a primeira seleção anfitriã afastada na primeira fase e o Gana a única seleção do continente apurada. Nos quartos de final ficou a Argentina, comandada por Diego Maradona e cilindrada pela Alemanha (4-0). E ficou também o Brasil, que caiu aos pés de uma grande seleção dos Países Baixos, numa campanha entusiasmante embalada por Sneijder e Robben, que só terminaria com a derrota na meia-final frente à Alemanha.

A Espanha entrou mal, a perder o primeiro jogo frente à Suíça, mas embalou a partir daí, numa seleção que aproveitou em campo o jogo de posse e circulação a que chamaram «tiki taka», transplantado do Barcelona de Pep Guardiola. Para se tornar o oitavo campeão do mundo da história e o primeiro europeu a festejar fora do continente a Roja foi dona da bola e só precisou de marcar oito golos em toda a competição, até hoje o campeão com menos golos marcados.

A Final

Países Baixos-Espanha, 0-1 ap

Estádio Soccer City, em Joanesburgo

Espanha: Casillas, Sergio Ramos, Piqué, Puyol, Capdevila, Busquets, Xabi Alonso (Fábregas, 87m), Pedro Rodríguez (Jesús Navas, 60m), Xavi, Iniesta, David Villa (Torres, 106m). Treinador: Vicente del Bosque

Países Baixos: Stekelenburg, Van der Wiel, Heitinga, Mathijsen, Van Bronckhorst (Braafheid, 105m), Van Bommel, De Jong (Van der Vaart, 99m), Robben, Sneijder, Kuyt (Elia, 71m), Van Persie. Treinador: Bert van Marjwik

Marcador: 1-0, Andrés Iniesta (116m)

A final ao minuto no Maisfutebol

 

Figura

Andrés Iniesta

Foi um guião de filme aquele que colocou no pé de Iniesta a decisão do Mundial 2010. O médio de futebol inteligente e requintado que definiu ao lado de Xavi, no Barcelona e na seleção, a perfeição no centro de um campo de futebol ficará para sempre eternizado naquele golo. E, claro, no gesto que se seguiu. No calor da festa, Iniesta tirou a camisola, para mostrar uma outra, onde se lia «Dani Jarque siempre com nosotros.» Era uma homenagem ao capitão do Espanhol, que tinha falecido menos de um ano antes, aos 26 anos, vítima de um ataque cardíaco. A Espanha teve em David Villa o goleador daquele Mundial e também teve Puyol a fazer de herói improvável com o golo à Alemanha que garantiu a presença na final, mas Iniesta e aquele pontapé, depois de um grande passe de Fabregas, são a síntese perfeita da Espanha que juntou o requinte à proverbial fúria, para ser finalmente feliz no Mundial. 

Frase

«Sinto-me como um rapaz de 15 anos»

A frase é de Nelson Mandela, a reagir ao anúncio da vitória da candidatura da África do Sul à organização do Mundial 2010. Madiba tinha 85 anos e passara pouco mais de uma década desde o fim do Apartheid, o regime que combateu toda a vida e o condenou a 30 anos de prisão. Naquelas palavras de uma das maiores personalidades do século XX está muito do que representou para o país e para o continente receber finalmente o Campeonato do Mundo, mesmo que o legado dessa organização histórica não tenha tido continuidade. Quando chegou o Mundial, Mandela já estava fisicamente muito debilitado, mas ainda fez uma aparição simbólica na cerimónia de encerramento.

Número

Quantos centímetros mesmo?

Uma bronca cheia de ironia. Em 1966 a Inglaterra foi campeã do mundo com um golo-fantasma na final com a Alemanha. E em 2010 foi para casa a lamentar um golo que (quase) toda a gente viu que entrou mas não valeu, frente à Alemanha. A bola rematada por Lampard caiu dentro da baliza, depois de bater na trave. Toda a gente que assistia pela televisão percebeu, mas o árbitro e o assistente não viram. Seria o 2-2, num jogo em que a Alemanha era claramente melhor e acabou a vencer por 4-1. «A bola não estava dois centímetros para lá da linha. Estava claramente dentro», admitiu depois Jerome Valcke, o então secretário-geral da FIFA, que a partir dali abriria finalmente a caixa de Pandora da introdução de tecnologia no futebol. Aquele golo-fantasma, aliado a vários casos associados ao Mundial 2010 – da mão de Henry na qualificação a um golo de Tevez claramente em fora de jogo frente ao México também nos oitavos – acabaram com a resistência da FIFA e do International Board. Da tecnologia da linha de golo ao VAR, a forma com se tomam as decisões de arbitragem começou a mudar depois daquele Mundial.

Histórias

O motim dos Bleus

Uma mão de Henry no play-off com a Irlanda levou a França ao Mundial 2010 e enquanto o mundo discutia a batota adensavam-se na opinião pública gaulesa as críticas em torno das debilidades dos Bleus e das escolhas do selecionador Raymond Domenech, já com guia de marcha marcada para depois do Mundial. Mas ninguém imaginou que tudo acabaria num motim. Uma espécie de Saltillo à francesa. Depois de um nulo com o Uruguai a abrir, a França perdeu por 2-0 com o México. Anelka não voltou do intervalo, depois de uma discussão violenta com Domenech no balneário que foi parar a uma famosa manchete do L’Équipe, a reproduzir o que o avançado teria dito ao selecionador. «Va te faire enculer, sale fils de pute.» Dispensemos a tradução. Anelka foi mandado para casa e em protesto os jogadores recusaram treinar no dia seguinte. No meio disto, o capitão Patrice Evra discutiu com o preparador físico e os jogadores forçaram Domenech a ler um comunicado em nome da equipa. Dois dias mais tarde, a derrota com a África do Sul selou o adeus da França. O motim de Knysna levaria à demissão do presidente da Federação e a castigos para vários jogadores.

A mão de Suarez e o falhanço de Gyan

O Mundial das vuvuzelas, as enormes cornetas de plástico que atormentaram milhões de ouvidos ao longo daquele mês, terminou em drama para o último representante africano. Uruguai e Gana trouxeram ao Mundial uma decisão dos quartos de final memorável, com um final louco. No último minuto do prolongamento, Luis Suárez fez de guarda-redes e defendeu com a mão aquele que seria o golo da vitória do Uruguai. O árbitro português Olegário Benquerença expulsou o avançado, o Gana ganhou um penálti e festejou por antecipação, antes de gelar quando Asamoah Gyan atirou à trave. A bola saiu por cima e o jogo decidiu-se nos penáltis, da forma mais adequada para aquele jogo dramático. Coube a Sebastian Abreu bater o penálti decisivo e El Loco teve o desplante de a bater em jeito, um Panenka a levar o Uruguai à meia-final.

Todos os Mundiais:

1930, a aventura da primeira vez

1934, Itália na Coppa do regime

1938, de novo a Itália entre os ventos da Guerra

1950, quando o Uruguai gelou o Maracanã

1954, quando a Alemanha travou a magia

1958, com o menino Pelé o Brasil enfim deu certo

1962, o génio de Garrincha à solta no bicampeonato do Brasil

1966, Eusébio para a lenda na festa inglesa

1970, a perfeição no tri do Brasil e de Pelé

1974, quando a Alemanha ganhou mas a revolução foi o Futebol Total

1978, a primeira vez da Argentina e muito para lá de futebol

1982, da fiesta aos choques e de Sarriá ao tri da Itália

1986, o recreio de Maradona

1990, e no fim ganhou a Alemanha

1994, o tetra do Brasil na festa made in USA

1998, um Fenómeno perdido na primeira vez da França

2002, o Fenómeno renascido no penta do Brasil

2006, a epopeia de Portugal, a cabeça de Zidane e o tetra da Itália

Leia aqui mais informação sobre os Mundiais, os resultados e as histórias contadas no livro «O Essencial dos Mundiais Para Ler em 90 Minutos», do Maisfutebol

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