Um Mundial por dia: 1982, da fiesta aos choques e de Sarriá ao tri da Itália

1 dez 2022, 00:05
1982: Brasil-Itália

Viagem à história do Campeonato do Mundo em histórias, imagens, figuras, números, frases e curiosidades

Enquanto se escreve nova história no Qatar, o Maisfutebol olha para o que está para trás. De 1930 a 2018, um Mundial por dia em pequenas histórias, figuras, números, frases, curiosidades ou o percurso de Portugal. Pistas para recordar do que falamos quando falamos do Campeonato do Mundo.

Espanha 1982

13 junho a 11 julho 1982

Campeão: Itália

2º lugar: Alemanha (RFA)

3º lugar: Polónia. 4º lugar: França

Jogos: 52

Golos: 146 (2,81 por jogo)

Melhor marcador: Paolo Rossi (Itália), 6 golos

Portugal

O Mundial cresceu e passou a apurar os dois primeiros de cada grupo na qualificação europeia, mas não foi suficiente para Portugal quebrar o enguiço. Em tempos de divisão no futebol português e também na seleção, a campanha começou com um nulo na Escócia garantido na exibição de uma vida de Bento na baliza e seguiu com vitórias sobre Irlanda do Norte e Israel. Mas a seleção voltou a fracassar na reta final. Uma derrota em Belfast e mais duas frente à Suécia acabaram com as hipóteses de qualificação, mas faltava ainda a humilhação da goleada sofrida em Israel, nada menos que 4-1.

O Mundial

A Itália começou em crise e saiu campeã daquele que foi até então o maior Mundial de sempre, alargado a 24 equipas e distribuído por um número recorde de 17 estádios em 14 cidades. Da «fiesta» que Espanha ofereceu ao mundo fica a memória de um Brasil de encanto que caiu demasiado cedo.

O alargamento garantiu presenças inéditas de seleções como o Kuwait, Nova Zelândia, Camarões, Argélia e Honduras, num Mundial em que o formato voltou a mudar, com duas fases de grupos antes das meias-finais.

A Itália chegou ao Mundial rodeada de muita desconfiança, tanto que a equipa cerrou fileiras para a imprensa, inaugurando uma prática que se popularizaria muitas vezes daí para a frente em tempos de crise: o Silenzio Stampa, vulgo Blackout. Passou a primeira fase com três empates, zero vitórias e dois golos marcados, mas cresceu a partir daí, até superar o Brasil num dos jogos mais memoráveis da história dos Mundiais.

Esse era o Grupo da Morte e também não lhe sobreviveu a Argentina. Na estreia de Diego Maradona em Mundiais, a albiceleste passou a primeira fase, mas perdeu ambos os jogos na segunda fase de grupos, com Itália e Brasil. Diego acabou expulso por uma entrada sobre Batista frente ao Brasil.

Nas meias-finais, a Itália venceu uma Polónia que acabaria em terceiro lugar e a Alemanha, depois de um percurso muito acidentado, teve o seu o seu momento de afirmação num jogo épico frente à França de Platini. Depois, um Mundial com histórias sem fim acabou por consagrar uma Itália em crescendo até à conquista do terceiro título mundial da sua história, a primeira seleção a chegar ao tri depois do Brasil.

A Final

Itália-Alemanha, 3-1

Estádio Santiago Bernabéu, em Madrid

Itália: Zoff; Gentile, Scirea, Collovati, Bergomi, Cabrini, Oriali, Tardelli, Conti, Graziani (Altobelli, 8m), (Causio, 88m), Rossi. Treinador: Enzo Bearzot

Alemanha: Schumacher, Kaltz, Stieleke, Karl-Heinz Förster, Bernd Förster, Dremmler (Hrubesch, 63m), Breitner, Rummenigge (H. Müller, 70m), Briegel, Littbarski, Fischer. Treinador: Jupp Derwall

Marcadores: 1-0, Rossi (1-0, 57m), Tardelli (2-0, 69m),Altobelli (3-0, 81m), Breitner (3-1, 83m)

Figura

Paolo Rossi

Chegou ao Mundial rodeado de desconfiança. Rossi já tinha brilhado pela Itália no Mundial 78, quando marcou três golos, mas pelo meio caiu em desgraça, envolvido no Totonero, escândalo de resultados combinados que abalou o futebol italiano. Mais se seguiriam, mas adiante. Foi suspenso por dois anos, a pena foi abreviada, voltou a jogar em abril de 1982 e, contra todas as expectativas, Bearzot convocou-o para o Mundial. Em Espanha, um início apagado de Rossi, que ficou em branco nos primeiros quatro jogos, parecia dar razão às críticas. Mas ele renasceu, no momento ideal. No mítico duelo do Sarriá, foi a flecha que deu expressão à vitória da Itália sobre o Brasil, com um «hat-trick» para a eternidade. «O meu primeiro golo nesse jogo, de cabeça, foi o momento fundamental de toda a minha carreira», contou o antigo avançado, numa entrevista ao Maisfutebol em que recordou como foi do inferno ao céu naquele Mundial. Seguiu com um bis na meia-final que derrotou a Polónia e fechou com o golo que abriu caminho à vitória da Itália na final. Foi o melhor marcador e o melhor jogador do Mundial 82, voltou em grande à Juventus e ainda estaria em 1986 no México, sem ter sido utilizado. Rossi morreu em 2020, aos 64 anos.

Frase

«O futebol morreu naquele dia»

A frase é do «Doutor» Sócrates e foi recordada recentemente pela BBC, mas a ideia foi repetida vezes sem conta nos últimos 40 anos. O Itália-Brasil do Sarriá representou o fim do sonho do Brasil mágico que, sob a batuta de Falcão, Toninho Cerezo, Zico e Sócrates, maravilhava adeptos pelo mundo. Muito mais tarde, Zico disse de outra forma o mesmo que Sócrates: «Se tivéssemos ganho aquele jogo, o futebol teria sido diferente.» Aquele jogo a que o Brasil chamou «a tragédia do Sarriá» ficou para a história como o símbolo maior da vitória do pragmatismo sobre o romantismo. As coisas nunca serão assim tão lineares, mas só podemos imaginar como teria evoluído o futebol nos anos seguintes se o jogo bonito tivesse vencido naquele dia. Ganhou a Itália, que avançou até à conquista do Mundial. «Il Brasile siamo noi», titulava eufórico o Corriere dello Sport no dia a seguir à final.

Número

17 anos e 41 dias

Norman Whiteside é até hoje o mais jovem de sempre a jogar num Mundial. Em 1982, bateu o recorde que Pelé tinha fixado em 1958 logo no jogo de estreia da Irlanda do Norte, frente à Jugoslávia. Tinha-se estreado apenas três meses antes, ainda com 16 anos, e bastaram dois jogos pelo Manchester United para lhe garantir lugar no Mundial. Apesar da juventude, o jogador que bateu vários recordes de precocidade no futebol britânico foi opção regular no memorável percurso da Irlanda do Norte, que venceu a anfitrião Espanha e foi primeira no seu grupo, antes de terminar na última posição na segunda fase de grupos. Mas a carreira de Whiteside foi curta. Depois de várias épocas no Manchester United, rumou ao Everton mas, muito limitado por lesões, deixaria de jogar aos 26 anos. No outro extremo, o Mundial 82 consagrou também Dino Zoff, o guarda-redes da Itália, como o mais velho campeão do mundo de sempre, aos 40 anos e 133 dias. 

Histórias

Alemanha: do choque à vergonha de Gijón

Uma sucessão de horrores na caminhada da Alemanha. Na estreia, a então campeã da Europa foi surpreendida pela estreante Argélia. Três anos antes de rumar ao FC Porto, Rabah Madjer abriu caminho a uma das maiores surpresas em Mundiais: vitória da Argélia (2-1), que seria depois traída pela Vergonha de Gijón. Na última jornada do grupo, Áustria e Alemanha defrontavam-se um dia depois de a Argélia ter vencido o Chile (3-2), sabendo que poderiam apurar-se ambos com uma vitória germânica, por um ou dois golos de vantagem. A Alemanha adiantou-se num golo de Hrubesch aos 10 minutos e depois o jogo foi-se arrastando, até terminar assim mesmo, sob assobios nas bancadas. Os protagonistas juraram que não houve um pacto de não agressão, pelo menos deliberado, mas a forma como as duas equipas se acomodaram ao resultado fica nas memórias negras do Mundial até hoje. A Argélia protestou junto da FIFA, mas de nada valeu. Pelo menos, aquele jogo acabaria por precipitar a decisão de no futuro realizar os encontros decisivos em simultâneo. A Alemanha foi avançando e redimiu-se numa meia-final épica frente à França, um 3-3 que seria o primeiro jogo decidido nos penáltis. Esse jogo ficou para a memória dos grandes duelos em Mundiais, mas ficou também marcado por outro momento negro: a entrada de Schumacher que deixou Battiston inconsciente. O francês, que fraturou várias costelas e partiu dois dentes, foi levado em maca para o hospital, perante a impassividade do guarda-redes alemão, que ficaria na baliza para defender dois penáltis no desempate e levar a Alemanha à final.

A derrota com a Argélia

A vergonha de Gijón

O Alemanha-França, Schumacher e Battiston

O caos no pior sorteio da história

A Espanha preparou uma grande festa, no Mundial que teve em Naranjito uma das mascotes mais populares de sempre. E prometia um grande espetáculo para o sorteio da fase final do Mundial 2002, transmitido em direto, com as bolas a sair das tômbolas da tradicional lotaria espanhola, transportadas pelos meninos de Santo Ildefonso que cantam os números do El Gordo. Mas foi caótico. Primeiro, uma confusão com as exceções – era preciso separar as equipas sul-americanas para não coincidirem no mesmo grupo, e havia ainda a questão política entre as seleções britânicas e a Argentina, face ao conflito nas Malvinas – levou um confuso Joseph Blatter, então secretário-geral da FIFA, a mandar repetir parte do sorteio. Depois, as tômbolas encravaram. Houve bolas partidas, assobios da assistência e risos das crianças no meio do embaraço.

Quando o xeque entrou em campo

Um dos episódios mais desconcertantes que o Mundial já viu aconteceu em Valladolid. Frente ao estreante Kuwait, a França ia construindo uma vitória sólida. Aos 80 minutos, Alain Giresse marcou aquele que seria o 4-1. Instantes antes do golo ouviu-se um apito. Veio da bancada, mas os jogadores árabes protestaram, dizendo que pensaram que tinha sido o árbitro a apitar e por isso não acompanharam a jogada. Estava-se nisto quando as imagens televisivas mostraram um irado homem de turbante nas bancadas, a gesticular. Fahid Al-Ahmad Al-Sabah, presidente da Federação e irmão do emir do Kuwait, não ficou por aí e decidiu descer ao relvado. Discutiu com o árbitro, ameaçou tirar a equipa de campo e conseguiu que o golo fosse invalidado. A juntar ironia à farsa, a França venceu mesmo por 4-1, porque Bossis ainda marcou mais um para os Bleus.

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