Nome de código: mLOY. A alteração genética que pode ajudar a perceber porque é que os homens morrem primeiro

24 jul 2022, 13:00
Homem (Unsplash)

Cientistas descobriram que a perda do cromossoma Y à medida que o homem envelhece aumenta o risco de patologia cardíaca e, por consequência, de morte

A esperança média de vida à nascença das mulheres é superior à dos homens e a ciência parece ter encontrado um potencial motivo para tal: o cromossoma Y, mais concretamente, a sua perda durante o processo de envelhecimento.

Há uma década já tinha sido descoberto que os homens ‘herdam’ doenças cardíacas pelo cromossoma Y, mas um grupo de cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, descobriu agora que a perda do cromossoma sexual masculino à medida que os homens envelhecem causa cicatrizes no músculo cardíaco, insuficiência cardíaca e pode levar a uma insuficiência cardíaca fatal. A esta perda do cromossoma dá-se o nome de perda em mosaico do cromossoma Y (mLOY: mosaic loss of Y chromosome, em inglês) - e pode ser acelerada pelo tabagismo.

Publicado na revista Science, o estudo analisou o impacto da perda do cromossoma Y em 38 ratos de laboratório que foram acompanhados durante cerca de dois anos. Os cientistas usaram a ferramenta de edição de genes CRISPR-Cas9 para excluir o cromossoma Y das células da medula óssea de alguns ratos e, depois, inseriram as células alteradas noutros ratos jovens cuja medula óssea tinha sido removida. Este processo não eliminou o cromossoma Y dos recetores, mas separou-o de 49% para 81% dos glóbulos brancos, de modo a obter uma percentagem idêntica à perda verificada em humanos.

Ao avaliarem os ratos, os cientistas concluíram que os animais ficavam mais propensos a desenvolver fibrose cardíaca e uma diminuição da função cardíaca, fatores que aumentam o risco de morte precoce. “Os ratos que perderam o cromossoma Y tiveram corações mais fracos. Após cerca de 15 meses, a força de contração do coração diminuiu cerca de 20%”, escreve a Science

Mas os cientistas da Universidade da Virgínia não se ficaram apenas pela avaliação do impacto da perda do cromossoma Y em ratos, analisaram também dados já recolhidos de humanos, mais concretamente, os dados do UK Biobank. Ao passarem a pente fino os dados biomédicos de 15 mil homens em três análises, notaram que a perda deste cromossoma estava associada a doenças cardíacas, a insuficiência cardíaca e a um maior risco de morte. Na prática, os homens que perderam o cromossoma Y em pelo menos 40% dos seus glóbulos brancos tinham 31% mais probabilidade de morrer de doenças do sistema circulatório do que aqueles em que o cromossoma era mais abundante.

Particularmente após os 60 anos, os homens morrem mais rapidamente do que as mulheres. É como se eles envelhecessem biologicamente mais rápido. (...) Os anos de vida perdidos devido à desvantagem de sobrevivência da masculinidade são impressionantes. Esta nova pesquisa fornece pistas sobre porque é que os homens têm uma esperança média de vida mais curta do que as mulheres”, diz Kenneth Walsh, um dos cientistas envolvidos no estudo.

Perda do cromossoma Y - uma desvantagem já estudada

O cromossoma Y carrega apenas 71 genes, menos de um décimo do cromossoma X, como sublinha a Science, mas a sua perda está há vários anos associada a problemas de saúde, alguns deles degenerativos, outros fatais.

Também este mês, uma outra equipa de cientistas, do Departamento de Medicina Cardiovascular da Escola de Medicina da Universidade Metropolitana de Osaka, no Japão, analisou igualmente os dados de participantes do Biobank do Reino Unido e concluiu que um aumento de 1% na taxa de mLOY é suficiente para aumentar em 1,0054 vezes o risco de morte por doença cardiovascular, escreve o site Eureka Alert.

A perda de cromossoma dá-se, sobretudo, no sangue, mais concretamente nas células que sofrem renovação rápida, como as células sanguíneas, explica o Science Daily, que adianta ainda que estudos anteriores já tinham levantado o véu sobre o impacto da perda do cromossoma Y na probabilidade de morrer em idade mais jovem e de estar à mercê de mais doenças, como Alzheimer, fatores que podem ajudar a perceber porque é que os homens tendem a morrer mais cedo do que as mulheres. O risco de cancro é também maior, como conclui uma revisão científica publicada em 2020 na revista Cell & Bioscience, assim como a probabilidade de sofrer de aterosclerose, afeção degenerativa das artérias, como indica outra revisão publicada na Nature em 2017.

A perda em mosaico do cromossoma Y é detetável em 40% dos homens com 70 anos e 57% dos homens com mais de 90 anos.

De acordo com os dados mais recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), a esperança média de vida das mulheres era, em 2019, de 74,2 anos e dos homens de 69,8 anos.

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