"As maternidades públicas estão a funcionar", garante o ministro da Saúde. "Não há nenhuma razão para introduzir medo às pessoas"

CNN Portugal , MJC
8 mar 2023, 11:52
Manuel Pizarro (Lusa/Tiago Petinga)

Ouvido esta quarta-feira na Comissão de Saúde da Assembleia da República, Manuel Pizarro admitiu que "temos em Portugal um problema crónica de acesso aos serviços de urgências", mas defendeu a reorganização das urgências de obstetrícia que está prestes a ser finalizada

"Temos em Portugal um problema crónica de acesso aos serviços de urgências", admitiu Manuel Pizarro, ministro da Saúde. Em Portugal, a média é de 600 pessoas em cada mil habitantes a recorrerem aos serviços de urgência, quando a média europeia é de 450. "Há alguma coisa no sistema que está a falhar", concluiu o governante, na audição desta quarta-feira na Comissão de Saúde da Assembleia da República, garantindo que este será o grande desafio do seu ministério em 2023.

O ministro esteve na Comissão de Saúde, a requerimento do Bloco de Esquerda (BE) e do Partido Comunista (PCP), para falar sobre o “encerramento de maternidades, os graves problemas de funcionamento das urgências gerais”, mas também sobre a “reorganização dos serviços de urgência de Ginecologia e Obstetrícia, na região de Lisboa e Vale do Tejo, serviços de urgência de Psiquiatria e serviços de urgência geral”.

Catarina Martins, deputada do BE, afirmou que "há mais de um milhão de pessoas sem médico de família e isso aumenta a pressão sobre a urgências, porque essa é a única porta de entrada no SNS". Mas para o ministro essa é uma explicação demasiado siimplista: "Mesmo nas regiões onde o acesso aos cuidados de saúde primário está assegurado, como no Norte do país, continua a haver afluxo excessivo", disse. "Isso é mau para todos." "Falhamos alguma coisa se temos quase tantas urgências como tínhamos antes do covid", admitiu Pizarro.

Uma das situações mais graves tem a ver com as urgências de obstetrícia. O Ministério da Saúde chama-lhe "reorganização" e não "encerramento", mas para Catarina Martins, se as portas estão fechadas, para os utentes as urgências das maternidades estão mesmo encerradas. "Não começou agora." E o Bloco de Esquerda "acha muito preocupante que se instale o paradigma do encerramento de urgências".

"Nenhuma mulher grávida decide ir a uma urgência porque não tem mais nada para fazer. E o que encontra é uma porta fechada com um cartaz a informar quais são as situações consideradas urgentes e quais os serviços a que pode recorrer na região. Portanto, é isto que temos para uma mulher grávida que vai a uma urgência aflita e numa situação vulnerável", criticou Catarina Martins, sublinhando ainda "a triste coincidência de esta audição estar a decorrer no Dia da Mulher". 

"Uma direita que odeia o Serviço Nacional de Saúde não faria melhor do que o PS está a fazer", concluiu Catarina Martins. 

No entanto, o ministro da Saúde recusou as críticas: "Não tenho dados finais, mas os resultados da avaliação da saúde materno-infantil de 2022 não vão envergonhar ninguém", garantiu Pizarro. Apesar dos "casos individuais que se lamentam e desfuncionalidades que se têm de evitar", "não tentem traçar um panorama negativo sobre o SNS que é profundamente injusto em relação à qualidificação técnica e profissional dos médicos, enfermeiros e outros profissionais, designadamente nas maternidades, que fazem um trabalho excelente. E os resultados globais são mesmo excelentes, quando comparados com os outros países europeus. Não há nenhuma razão para introduzir medo às pessoas. As maternidades públicas estão a funcionar bem, estão a funcionar de forma previsível, com qualidade e com segurança."

Sobre a reogranização dos serviços de urgência neste setor, o governante explicou que, em dezembro, dada a "impossibilidade de ter recursos humanos para que as 39 maternidades funcionassem 24 sobre 24 horas", o ministério tinha a hipótese de encerrar algumas maternidades, mas considerou que essa não seria a resposta adequada: "Não se justificava fechar maternidades, sobretudo no interior, porque colocaria as pessoas longe das maternidades. Nem na região de Lisboa, porque aqui existem serviços que têm capacidade formativa e se nós precisamos de novos médicos temos de fazer essa formação".

Foi assim criado um "modelo de organização que nos assegura aquilo que nos parecia essencial: qualidade dos serviços, segurança (para as pessoas e para os profissionais) e previsibilidade. Foi por isso que essa decisão foi tomada em dezembro." 

O ministro afirma que, no casos da obstetrícia,  as pessoas que vão à urgência vão quase sempre transportadas pelo INEM e já não vão às maternidades que estão fechadas, "às que vão pelo seu próprio pé isso pode acontecer mas temos feito um esforço de informação". Desde que o modelo está a funcionar, nasceram no SNS 849 bebés. "Entre o natal e o ano novo não houve nenhum problema, no primeiro trimestre identificámos um problema" que foi resolvido sem complicações. Até porque, sublinhou o ministro, "mesmo as maternidades que têm as urgências fechadas têm um obstetra lá".

Manuel Pizarro aproveitou para anunciar que o Governo decidiu duplicar o valor inicialmente previsto para o programa de requalificação das maternidades públicas, que passa assim para 20 milhões de euros. Este valor não será suficiente para dar resposta a todas as candidaturas que foram apresentadas (num valor total de 37 milhões de euros) mas permitirá, assegurou, "uma melhoria de infraestruturas nas maternidades".

Ainda questionado por Catarina Martins sobre as dificuldades para aceder à Interrupção Voluntária da Gravidez no SNS, Manuel Pizarro não hesitou: "A IVG tem de ser garantida em todo o Serviço Nacional de Saúde e nós estamos a tomar medidas para que, dentro de semanas, sejam corrigidas todas as circunstâncias em que isso não acontece, porque isso é totalmente inaceitável", disse. 

Sobre a falta de médicos nos serviços de obstetrícia, Manuel Pizarro devolveu a questão a Catarina Martins: "Se a senhora deputada conhecer médicos obstetras que estejam disponíveis para ser contratados, faça o favor de me indicar que serão contratatos sem entraves", desafiou.

O ministro lembrou que em janeiro começaram "a sua formação no SNS 55 médicos" de obstetrícia - "o número mais elevado de sempre". No entanto, o deputado João Dias, do PCP, questionou: "Qual a política que será aplicada para garantir a fixação desses médicos? Pode garantir que, finda a formação, esses médicos vão ficar no SNS?" Isso só acontecerá, disse, se houver um bom plano de carreiras e a respetiva valorização salarial: "Neste momento, um jovem médico não tem motivação para ficar no SNS", garantiu.

Já sobre as urgências pediátricas , Manuel Pizarro garantiu que se está à procura do "melhor modelo possível": sabendo que 75% das crianças que vão às urgências são triadas como casos não urgentes e que a maioria dos atendimentos é feito até às 8 da noite, se calhar, "o melhor modelo não tem que ser ter urgências abertas 24 horas, poderá haver outras soluções".

"Há muitas questões que são mais bem tratadas noutros serviços do que no contexto hospitalar, por exemplo na saúde", afirmou. Um dos exemplos mais citados ao longo da sessão foi o da pedopsiquiatra. Seguno Pizarro, não se justica ter horários noturnos de pedopsiquatria, uma vez que "as situações clínicas não o justificam e porque há escassez de pedopsiquiatras do SNS".

No dia em que, como sublinhou o deputado Pedro Frazão, do Chega, se realiza a primeira greve de médicos após a pandemia de covid-19, convocada pela Federação Nacional dos Médicos, o ministro da Saúde garante que "estão em curso negociações com os sindicatos dos médicos" e que o Governo continua "absolutamente disponível para o diálogo".

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